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Sábado,6 de Dezembro
Narrativas da destruição

O botão vermelho como drama humano: Bigelow e o cinema do colapso

Elpídio Rocha*
elpidiorochaneto@gmail.com
Publicado em 31/10/2025 às 19:00.

A cineasta Kathryn Bigelow consolidou seu lugar no cinema estadunidense ao vencer o Oscar, em 2010, com “Guerra ao Terror” e foi a primeira mulher a conquistar a estatueta de direção, inclusive derrotando o ex-marido James Cameron na disputa. Tem uma carreira que transita com sucesso pelos gêneros cinematográficos – como “Quando Chega a Escuridão” (1987, terror), “Caçadores de Emoção” (1991, ação) e “Estranhos Prazeres (1995, ficção científica) – seguindo para o suspense político estruturado nas ações/burocracias institucionais dos Estados Unidos. O que começou em “Guerra ao Terror”, avançou para “A Hora mais Escura” (2012) – registro jornalístico-corporativo da caçada a Osama bin Laden – e chegou, em outubro, na Netflix, ao tenso “Casa de Dinamite”.

O sucesso do streaming acompanha as ações para identificar e reagir ao ataque de um míssil nuclear disparado contra os EUA. O tempo é fundamental: a história mostra os protocolos de reação/contra-ataque e, principalmente, os dramas dos personagens ligados aos órgãos e instituições governamentais. E a trama vai alternando a perspectiva de cada um(a) durante os tensos 18 minutos entre a descoberta do míssil e o impacto no alvo.

Assim, Bigelow se coloca na companhia de cineastas estadunidenses que abordaram o possível fim do mundo num holocausto nuclear. Em “Dr. Fantástico” (1964), Stanley Kubrick monta uma sátira poderosa sobre a paranoia da Guerra Fria quando um general decide bombardear a União Soviética e o esforço para evitar o desastre esbarra nas normas e comandos burocráticos; o humor inteligente da trama se equilibra com a tensão narrativa mantendo o vigor do filme até os dias atuais.

Sidney Lumet, também em 1964, oferece sua perspectiva do tema com “Limite de Segurança”. Aqui, bombardeiros, devido a um erro técnico dos computadores, seguem para destruir Moscou e o governo dos Estados Unidos se mobiliza para evitar a tragédia a qualquer custo. Enquanto as aeronaves avançam, um intelectual pragmático conversa, numa festa de socialites, sobre as vantagens de agir primeiro e conquistar a vitória entre os escombros da terceira guerra mundial. Sóbrio, teatral e filmado em preto e branco, o filme traz uma reviravolta (ou revelação) final que provoca discussões sobre os limites da humanidade em situações extremas.

“O Último Brilho do Crepúsculo” (1977), de Robert Aldrich, investe na conspiração e no ressentimento políticos para contar a história de um general que invade uma instalação de mísseis nucleares e ameaça disparar as ogivas se o governo dos EUA não divulgar documentos secretos sobre os erros e desmandos da Guerra do Vietnã. Aldrich trata da divergência entre militares e civis nas decisões do poder e, mesmo, na manipulação/ocultação da verdade; o inimigo aqui é interno e está infiltrado numa estrutura governamental corrupta e amoral.

Estes filmes são obras de qualidade que servem de ponto de partida para abordar um assunto de reflexão política e social pertinente. Valem ser conhecidos e comentados nas rodas de diálogos fílmicos e culturais.

* Crítico de cinema, jornalista e colaborador do O Norte

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