Cinco meses após a rebelião que deixou parte da cadeia pública de Montes Claros destruída, o clima volta a ser tenso no local. Na manhã da última sexta-feira, dois detentos ficaram feridos, um em estado grave, depois de brigas para acerto de contas externas. Mesmo depois da situação controlada, o clima continuou tenso entre os presos, pois, minutos antes do motim um deles alertou a promotora Raquel Batista de que iria começar a ciranda da morte no cadeião.

- Não quer soltar não? Então, não vamos aceitar ninguém aqui. Vamos começar a ciranda da morte aqui. Matar uns dois, já tô com trinta anos de cadeia mesmo – disse o preso.

A promotora respondeu:

- Não fale isso nem de brincadeira.

O alerta foi feito durante a visita, na manhã de sexta-feira, de universitários do curso de Direito das faculdades Pitágoras, que prestarão assistência jurídica gratuita aos detentos.

O PRIMEIRO MOTIM

Minutos após o alerta do preso começou o motim no pátio no cadeião. Durante o banho de sol da ala esquerda, Marcos Vinicius Martins da Cruz, 21 anos, que cumpre pena de seis anos por tentativa de roubo com lesões graves, iniciou uma briga generalizada, quando fez oito perfurações com chuço (arma artesanal no formato de faca) em Marcos Ferreira dos Santos, 21 anos, conhecido como Maguila.

Segundo informações dos agentes penitenciários, cerca de oito homens ajudaram Marcos Vinicius a agredir Maguila.

A polícia militar foi acionada e, ao chegar ao local, tentou controlar o motim com disparos de balas de borracha, mas os presos resistiram e Marcos Vinicius continuou a perfurar o corpo de Maguila.

RISCO DE MORTE

Maguila foi encaminhado ao Hospital Aroldo Tourinho em estado grave, passou por uma cirurgia e já está no quarto se recuperando dos ferimentos. Marcos Ferreira não corre risco de morte.

CONTINUA O BANHO DE SOL

Após a PM ter controlado o primeiro motim, os presos continuaram no pátio do cadeião tomando banho de sol e jogando bola, mas a arma do crime havia sido recolhida. Do lado de fora, a PM esperava autorização da direção da cadeia para entrar no pátio, revistar e recolher os mais de 150 detentos para as respectivas celas.

(fotos: Wilson Medeiros)

E O MOTIM CONTINUA

A entrada da imprensa foi liberada, quando tudo parecia tranqüilo, mas de repente um disparo surgiu do meio dos detentos. Outro motim começou para um acerto de contas externo com o detento Warlei Cardoso Gomes, 20 anos, conhecido como Warlei do Gás. Policiais militares gritavam para Warlei fugir dos detentos:

- Saia daí, você vai morrer. Corre! Sai daí!

A polícia conseguiu controlar o motim com disparos de balas de borracha e Warlei foi encaminhado a hospital com ferimentos no rosto, na boca e no pescoço.

Apesar dos dois motins ocorridos na manhã de sexta-feira em pequenos intervalos, não foram efetuadas revistas no interior das celas dos rebelados.

PROVIDÊNCIAS

O diretor do cadeião, Saulo Nogueira, estava viajando, mas o delegado Leonardo Miranda esteve no local para verificar os fatos e tomar as providências necessários.

Leonardo informou a O NORTE que já estão sendo tomadas medidas para evitar quaisquer problemas no interior do cadeião e que os fatos ocorridos sexta-feira serão apurados, e as devidas providências tomadas, para que os fatos não se repitam.

- Já isolamos a frente da cadeia e, agora, estamos aguardando um detector de metais para evitar a entrada de armas no local. Agora apuraremos todos os fatos ocorridos na manhã de sexta-feira para tomar as devidas providências. Foi efetuado o flagrante dos autores das tentativas de homicídio e eles responderão pelos crimes Também vamos providenciar de imediato uma revista nas celas, para verificar se existem armas em poder dos detentos – informa o delegado Leonardo Miranda.

QUERIA MATÁ-LO

Na delegacia de polícia, Marcos Vinicius Martins da Cruz, que está há dois anos no cadeião, afirmou à reportagem que planejou matar Maguila:

- Ele é muito vacilão. Desde terça-feira, quando ele passou em frente à minha cela, eu planejei matá-lo. Ele deu um tiro de raspão em minha filha de três anos e tem que pagar por isso.

Marcos Vinicius tinha sido beneficiado para cumprir sua pena em regime semi-aberto, mas voltou para o cadeião por problemas com bebidas. Ele diz que jogou pela guarita, do lado de fora da cadeia, o chuço usado no crime.

Apesar de afirmar insistentemente que foi o autor das oito perfurações em Maguila, o delegado Giovani Siervi, da delegacia de repressão aos crimes contra a pessoa, informa que Marcos Vinicius agiu em companhia de Marcondes Silva Fonseca, 20 anos, acusado de furtos qualificados, que também foi autuado em flagrante.

Confirmando a declaração de outro preso sobre a possível ciranda da morte que está programada para acontecer no cadeião, Marcos Vinicius afirmou:

- Aquela cadeia está sinistra; tem muita gente, tem que morrer pelo menos um por dia para ficar bom.

MAGUILA

Marcos Ferreira Santos foi preso na última quarta-feira, 29, após assaltar dois estudantes de 13 anos nas proximidades da escola Augusta Vale, localizada no Bairro Interlagos.

Em companhia de Gil Douglas Rodrigues Costa, o Douglinhas, 18 anos, e Edson Santos, o Egão, 25 anos, Maguila abordou os estudantes e, após agredi-los fisicamente com socos e pontapés, roubou-lhes duas bicicletas. Os três bandidos são do Alto Boa Vista.

Diante das informações dos trajes usados pelos assaltantes, a PM localizou Maguila em sua residência, onde uma das bicicletas estava escondida, e efetuou a prisão em flagrante.

PREVISÕES

Ao chegar à delegacia de furtos e roubos para efetuar o flagrante, Maguila disse a O NORTE que ele não poderia ir para cadeião.

- Eu, Douglinhas e Egão não podemos subir para o cadeião, senão vamos morrer. Eu estou avisando. Eles vão me matar – disse o Marcos Ferreira Santos. 

WARLEI

Warlei Cardoso Gomes foi preso na tarde de segunda-feira, 27, com dez pedras de crack, na Rua Hermenegildo Soares Malaquias, Bairro Esplanada.

Abordado em atitudes suspeitas, Warlei tentou se desfazer da droga, jogando-a no chão, mas foi preso em flagrante. Na residência de Warlei a PM encontrou outra pedra de crack esfarinhada. Warlei do Gás informou que a droga seria vendida para um homem conhecido como Cardeal.

REFORMAS

As obras de reforma do cadeião, iniciadas após a rebelião em 10 de setembro do ano passado, serão concluídas nos próximos quinze dias.

O juiz da Vara de execuções penais, Marcos Antônio Ferreira, diz a cadeia pública recebeu mais de R$ 800 mil em obras e que a segurança estará garantida no local, sem possibilidades de fuga.

Entre as obras executadas estão: construção de passarela em volta de todo o prédio, interligando as guaritas, que também ganharam holofotes para garantir a segurança externa no período noturno; pisos reforçados com 50 centímetros de ferro, concreto e cacos de vidro; teto também reforçado com 10 centímetros do mesmo material; sanitários reformados; novas instalações elétricas e hidráulicas; muro da frente aumentado e cercas instaladas; grades das celas reforçadas e instalado um circuito interno de televisão.