
Em maio de 2021, a então adolescente Vitória Mesquita, de Brasília–DF, iniciou uma mobilização que mexeu com o país e fez o site de buscas Google alterar a denominação da Síndrome de Down. Graças a ela, que viralizou com a #atualizagoogle, a síndrome, antes conhecida como doença, é classificada agora como “condição genética”.
Causada pela presença de três cromossomos 21 nas células dos indivíduos, em vez de dois, é conhecida como Trissomia do cromossomo 21. A nomenclatura é somente a ponta do iceberg. Com o dia 21 de março reservado no calendário como o “Dia Mundial da Síndrome de Down”, desde 2012, para chamar atenção e conscientizar sobre o tema, o preconceito e o capacitismo aparecem em situações rotineiras.
Um exemplo disso é o que ocorreu com a fisioterapeuta integrativa de Montes Claros, Débora Caldeira Avelino, mãe de Maria Mariana, de três anos, com a condição genética. A criança foi recusada em uma escola e, conforme a mãe, a conduta tentava mascarar o preconceito. “Me enrolaram para fazer a matrícula, testavam a criança exigindo a pronúncia de certas palavras. Foi uma coisa absurda. Pagar uma mensalidade e ter que brigar na justiça por um direito fica uma relação desgastante. Mas não desistimos”, destaca.
Com 24 semanas de gestação, ela soube que o coraçãozinho do bebê estava aberto e que havia ali uma disfunção. “Como sou fisioterapeuta, sabia que poderia ter uma síndrome, mas não quisemos fazer um exame. A preocupação minha e do meu esposo, José Júnior, era a de que ela sobrevivesse. Nossa filha chegou perfeita para nossa vida. Foi muito esperada e é muito amada”, conta.
Debora entende que o casal é privilegiado por ter bastante informação e condição de oferecer à filha as terapias e tecnologias de que ela precisa para um crescimento saudável. “Mas existem famílias que não têm acesso. Precisamos de políticas públicas que olhem para essas realidades. Numa sociedade cada vez mais analítica, racional e capitalista, o T21 tem muito a ensinar sobre emoção e motivação”, declara a mãe, que observa pouco preparo das pessoas para lidar com a situação, na prática. “Falta informação e estímulo às pessoas T21 no aspecto cognitivo, motor e relacional. A sociedade tem que falar ao invés de velar. Os pais muitas vezes estão abertos à discussão, mas a sociedade se mostra omissa, negligente, indiferente ou desinteressada. E as escolas precisam se interessar pelas necessidades de um grupo de minoria, porque essas pessoas têm o direito à dignidade do estudo”, pontua.
PERGUNTAS E RESPOSTAS
O neurocientista Max Alencar explica que a condição ocorre devido a uma falha na separação dos cromossomos durante a divisão celular, um fenômeno chamado não disjunção cromossômica. Esse cromossomo extra afeta o desenvolvimento cerebral e corporal, levando às características típicas da síndrome. “As causas exatas ainda não são totalmente compreendidas, mas fatores como idade materna avançada aumentam o risco”, afirma o neurocientista, que destaca os avanços no campo da neurociência, especialmente no que se refere à compreensão dos mecanismos cerebrais e no desenvolvimento de terapias.
Esses avanços, segundo Max, incluem terapias farmacológicas, com pesquisa sobre medicamentos que podem melhorar a cognição e compostos que atuam no sistema colinérgico; estudos com a técnica CRISPR, que investigam a possibilidade de silenciar a cópia extra do cromossomo 21 em células específicas, e “novas pesquisas mostram que estímulos precoces podem melhorar as funções cognitivas e motoras”, diz.
Outro ponto destacado pelo profissional é que as pessoas com a Síndrome de Down apresentam maior risco de desenvolver outras condições, como doenças cardíacas congênitas, Alzheimer precoce, hipotireoidismo, distúrbios imunológicos e gastrointestinais, como doença celíaca e refluxo, e leucemia. A boa notícia, conforme o Alencar, é que a expectativa de vida pode aumentar dos atuais 50/60 anos para a casa dos 70/77 anos, com bons cuidados médicos e uma vida saudável. “Esse aumento se deve a avanços na medicina, principalmente no tratamento de problemas cardíacos e infecções”, revela.