Wilson Simonal

Jornal O Norte
Publicado em 02/07/2009 às 10:17.Atualizado em 15/11/2021 às 07:03.

Felippe Prates



Com ele tivemos a satisfação de conviver por muitos anos.  Seus filhos, Simoninha e Patrícia estudaram no Pernalonga/Colégio Isa Prates, em Copacabana, no Rio, escolas por nós fundadas e dirigidas com Mamãe e nossos irmãos, durante 47 anos.  Simonal era um homem de ótimo caráter, personalidade forte, presença marcante, inventor e rei do suingue que, na vida, sofreu grave injustiça e, infelizmente, nos deixou aos 61 anos.



Seu “revival” começou recentemente nos  cinemas, à força de 19 mil ingressos vendidos em duas semanas. O documentário de Micael Langer que conta a história de Wilson Simonal, tem sido prestigiado pelos filhos e netos daqueles que acompanharam o grande cantor e show man carioca, no amor e na dor.



A voz que desafinou na última década de 70, sob a alegação mentirosa de ser o dedo duro da música popular brasileira em plena ditadura, voltou a encantar nos rádios.  Ela está sendo ouvida em festas, danceterias e até nas livrarias que receberam dois livros sobre a trajetória que levou Wilson Simonal da glória à infâmia, num alto preço pago à inveja e à canalhice do meio artístico pelo seu retumbante sucesso como cantor e dono de inigualável manejo do suingue.  Se falasse Inglês e morasse nos Estados Unidos, Simonal teria sido um artista de renome internacional, famoso e rico. Numa afinidade e sintonia mágicas, dominava, totalmente embevecidas, platéias com milhares de pessoas, aficcionadas ou não, que cantavam e dançavam sob sua batuta em delírio, num altíssimo astral jamais igualados.



Certa vez, quando Simonal vivia o auge da fama, numa Feira de Ciências do Colégio Isa Prates, acompanhando os filhos, chamou-nos num canto para uma conversa reservada.  Confidenciou-nos que padecia de fimose, sofrendo constrangimentos e dores terríveis.  Precisava encontrar uma clínica discreta para ser operado, longe da imprensa, que não poderia nem sonhar com tal fato...  Pediu-nos ajuda por conhecermos tanta gente, talvez através de um médico, quem sabe, resolvesse o problema, livrando-o daquele tormento?



Lembramo-nos do nosso querido primo, conterrâneo e amigo, o montes-clarense Fernando Oliveira, então residindo no Rio, pediatra de renome, diretor do SAMCI – Serviço de Assistência Médica e Cirúrgica Infantil, em Ipanema.  Fernandão, tão querido e saudoso, além de grande médico era prestativo, simpático e prontificou-se a tratar do Simonal:



- Felippão! Mande-me o homem lá no SAMCI, para conversarmos e providenciaremos a cirurgia de fimose, para que o seu pinto fique uma beleza, brincou ele.  Diga-lhe que leve um filho junto, para parecer uma consulta pediátrica, lembrou, muito a propósito.



Tudo deu certo e feita a cirurgia numa clínica infantil em pleno bairro de Ipanema, Wilson Simonal ficou livre da incômoda fimose, sem que quase ninguém disso soubesse.  Em agradecimento, presenteou-nos com vários ingressos para seu próximo “show” e uma garrafa de uísque Presidente, um maravilhoso “scotch twelve” bastante raro, envelhecido em tonéis de cerâmica, excelente.



Quando o mundo desabou sobre sua cabeça, Simonal ficou numa pior, sem dinheiro. Muito derrubado, procurou-nos, então:



 - Professor:  Preciso dos papeis da transferência dos meninos para matriculá-los numa escola em São Paulo. Estou lhe devendo quase um ano de mensalidades e trouxe este relógio aqui para lhe propor trocar pela dívida.  É um Rolex de ouro, quase sem uso.  Veja, acho que dá para negociarmos.  Pode ser?



Tratava-se de uma jóia belíssima, um Rolex masculino todo de ouro, inclusive a pulseira, cujo valor, certamente, superava, de muito, o montante da dívida.  Nós o examinamos e o devolvemos, dizendo-lhe:



- Vamos lhe dar a transferência de Simoninha e da Patrícia sem a necessidade de ficar com o seu relógio, Simonal.  Leve-o de volta.  Temos certeza que você vencerá esta dificuldade da sua vida e dará a volta por cima, como convém a um homem de bem, injustiçado. A verdade, como sempre, prevalecerá.  Então, pelo seu notável talento, você voltará a brilhar, retomará a carreira e tudo se normalizará.  Quando puder, venha nos pagar o que deve.  E até lá, não se fala mais nisso!



Simonal nos abraçou, chorou muito agradecido no nosso ombro e mal conseguiu balbuciar um “muito obrigado.”



Correu o tempo, alguns anos se passaram e nossas previsões se realizaram.



Ficou provado e comprovado que Wilson Simonal era inocente de tudo que o acusaram e apenas fora vítima da filhadaputisse humana, descendente direta e dileta do despeito, da irresponsabilidade, de tudo de ruim que existe neste mundo!  Voltou a cantar, a “suingar”, a fazer sucesso, repercutir, consertou o corpo e o bolso, recuperando a maior parte da fama e do prestígio, para ódio de seus detratores.



Um belo dia, surgiu na nossa escola, procurando-nos:



- Professor: Aqui está o cheque para quitar o que lhe devo. Pelo tempo, arredondei um pouco, para cima. Trago-lhe um presente, por coincidência um Rolex, novo, modelo náutico, Submariner, pois sei que você é um homem do mar, pescador, dono de barco.  Por favor, aceite!  Conforme combinamos, a dívida financeira hoje está sendo paga. Agora, tem uma outra dívida, professor, esta impagável, eterna, que se chama gratidão, um sentimento que, prazerosamente, guardo em meu coração.  Um homem jamais esquece o apoio que lhe dão num momento difícil. De uma história tão bonita, de você, da sua generosidade e da sua bondade, sempre me lembrarei, com muito carinho, enquanto vida eu tiver...



Simonal abraçou-nos, nos beijou, chorou de novo – desta vez só de emoção! – e partiu.



Foi desse jeito, querida leitora, que ganhamos o nosso primeiro Rolex.

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