Everaldo Ramos
Professor de História e Geopolítica, acadêmico do 9º período do curso de Direito e ex-aluno do Colégio Tiradentes
Houve um tempo, em que o Colégio Tiradentes da PMMG ocupava o noticiário, não devido a escândalos pertinentes a envolvimento de professor com alunas, mas sim pelo trabalho incontestável dos profissionais que ali labutavam com zelo, ética, responsabilidade e sobretudo compromisso com a educação. Dentre eles, lá estava o professor Hugo. Com uma paciência de Jó, de fala mansa, de uma docilidade incomum, ele sabia como ninguém fazer com que viajássemos pela literatura, entendendo as figuras de estilo, desde a hipérbole à metáfora.
Lembro-me como hoje, na sala do primeiro ano do segundo grau, quando ele entrava de jaleco azul clarinho, cabelo lambido, e abria seu livro de literatura de Faraco e Moura. As meninas o chamavam carinhosamente de Tio Huguinho. Ele retribuía com uma candura incomum, peculiar aos verdadeiros mestres, que sabem usar de autoridade sem serem autoritários, dar liberdade sem libertinagem e, antes de tudo, tratar os alunos com o devido respeito que merecem.
No último sábado à tarde, passando pela banca da Praça Doutor Carlos, eis que me surpreendo com a notícia dada pelo meu amigo e ex-colega do colégio Tiradentes Charles Gabiroba (o homem que tudo sabe nesta cidade).
- Você sabia que o professor Hugo faleceu há poucos dias?, me indagou o amigo Charles. Surpreso, meio que imediatamente fui levado a uma viagem aos anos oitenta, anos dourados, quando tive o prazer de ser aluno do professor Hugo.
As lembranças se revelaram tão vivas que era como se fosse ontem. Lembranças da viagem que fiz com o terceiro ano - na ocasião eu era presidente do Grêmio e havia sido convidado pelo diretor Coronel Neto para acompanhar a turma até Bom Despacho, no Sul de Minas. E conosco foram o professor Hugo, a professora Aparecida Albuquerque e outros.
O professor Hugo, com uma mala preta antiga, contando as suas piadas sem graça, nos chamando de “menino” e cuidando de todos nós como se fôssemos realmente crianças. Ficará com certeza na nossa memória, professor Hugo. Especialmente num tempo onde a imagem do nosso tão honrado Colégio Tiradentes foi arranhada por ações inescrupulosas de pessoas que lá estavam para preservá-la. Entrarás, sim, para a história das nossas vidas como verdadeiro mestre que metaforicamente fazia-nos perceber que existem valores na vida que devem ser buscados por todos.
Seu exemplo, professor Hugo, é alento para todos que como eu optaram em seguir tão nobre carreira do magistério. Você soube como ninguém usar a sala de aula para fazer dali um espaço de construção da cidadania e difusão de valores que formam o caráter dos grandes homens.
Sempre quando passar pela Rua São Francisco, no cruzamento com a General Carneiro, virá à baila a sua imagem e, principalmente, a lembrança do grande educador que fora. Desculpe-nos se nas provas de literatura não conseguíamos lembrar dos conceitos da metomínia ou identificar as prosopopeias na interpretação dos textos.
Mas ficou um grande aprendizado, mestre. Que a vida deve ser vivida com leveza que não faz mal nenhum; a paciência e a docilidade. Claro que sentiremos sua falta mas, conforme o dito popular “só sentimos falta daqueles que realmente marcam as nossas vidas”, das pessoas boas, que de uma forma ou outra entram para a galeria dos grandes nomes da nossa história.
O céu se alegrará com sua chegada, as nuvens serão os bancos onde os anjos agora estarão atentos às aulas de literatura. (Viu só, mestre, sem perceber acabei por fazer uma prosopopéia,,,). Agora, mestre, as figuras de linguagem, os estudos do barroco, arcadismo e modernismo serão ensinados nas alturas. E a nós aqui embaixo restará nos apoiar nas lembranças daquele que nos ensinou, com exemplo, a relevância da ética e o verdadeiro significado do que vem a ser um “mestre”.