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Terceira Imagem: Questão de ordem

Jornal O Norte
Publicado em 10/05/2006 às 10:10.Atualizado em 15/11/2021 às 08:35.

Anelito de Oliveira



O artigo anterior, publicado no Opinião do último sábado, deveria ter sido precedido por um outro, que certamente facilitaria sua compreensão local, ou seja, em termos de Montes Claros.



A irresponsabilidade mútua, dos poderes públicos constituídos e da população em geral, tema do referido artigo, talvez ficasse mais clara a partir de outras pinceladas sobre o desfecho do projeto de comemoração continuada dos 150 anos de Montes Claros.



Que foi um desfecho frustrante, todos já sabemos, quem levou a efeito essa frustração, também sabemos, mas a razão dessa frustração ainda não está suficientemente explicitada.



Claro que tal explicitação não virá da parte dos ocupantes provisórios do poder público municipal, do Secretário de Cultura João Rodrigues e seu gerente Aroldo Pereira, uma vez que configuraria uma inabilidade para o exercício do poder.



Estão habilitados a exercer o poder – preconiza a má consciência à la Lair Ribeiro, Paulo Coelho e tantos outros espertalhões – aqueles que sabem representar, que conjugam bem o verbo “parecer”: eu pareço, tu pareces e ele (o problema, o problemático, por exemplo, o povo) desaparece.



- Não se trata, sei que não, de uma questão tipicamente montes-clarense, que só se apresenta aqui, mas de uma questão geral



A questão primordial, para os momentâneos poderosos, é não deixar que seus supostos representados, os montes-clarenses, no caso, “sejam”, no sentido forte, isto é, afirmem-se plenamente, passem da humilhante condição de objeto, de sujeitado, à admirável condição de sujeito.



Não se trata, sei que não, de uma questão tipicamente montes-clarense, que só se apresenta aqui, mas de uma questão geral, que se apresenta desde sempre por toda parte, não só no Brasil, mas no mundo, especialmente onde a injustiça é a regra: Américas Latina e Central, África, Orientes.



Seria, portanto, covardia atribuir apenas aos poderosos provisórios locais a responsabilidade por isso que podemos considerar uma política pública de inviabilização do ser social, do processo de constituição daquele que vive na cidade, do cidadão, para chegar mais perto da realidade.



Por outro lado, seria igualmente covardia não pensar que os poderosos locais, em qualquer local, desempenham papel decisivo nessa política, à medida que eles é que colocam em prática o que se define ideologicamente nos gabinetes da capital federal e das capitais estaduais, são os finalizadores da “jogada”, os “ronaldinhos”, para aludir ao futebol, ao que explica tudo, segundo o presidente popular que temos tido.



Pois bem, o projeto de comemoração continuada dos 150 anos de Montes Claros não foi possível, agonizou na Secretaria Municipal de Cultura e culminou na minha saída, por livre e espontânea pressão da sua coordenação, como sempre ocorre nesses casos. Tudo normal, segundo o gerente Aroldo Pereira, que ainda faz questão de ressaltar, até na televisão, que é meu amigo (tema para outro artigo).



Para mim, nada é normal exatamente porque, em quase duas décadas de militância pública como intelectual (jornalista, escritor, crítico, professor, pesquisador junto à FAPESP e FAPEMIG, superintendente de órgão estadual etc) nunca abdiquei da causa coletiva em favor de causa pessoal, para ser mais direto, salarial.



- Tal causa coletiva, a cidadania assim entendida, não é “de” Montes Claros, portanto, mas de todo Norte de Minas...



A causa coletiva em Montes Claros hoje, que está a nos exigir comprometimento, é a cidadania, mas não um mero discurso sobre a cidadania, mas a cidadania mesma, o processo de constituição de indivíduos suficientemente críticos para interagir com a cidade e transformá-la em “sua” cidade, extensão humana.



Tal causa coletiva, a cidadania assim entendida, não é “de” Montes Claros, portanto, mas de todo Norte de Minas, do Estado, do país e das demais territorialidades desumanizadas. A compreensão do fato de essa causa se colocar no centro do projeto dos 150 anos exigiria, da parte do Secretário e Gerente da Cultura municipal, um domínio, no mínimo, de conjuntura sociopolíticocultural contemporânea.



Todavia, isso também não é problema apenas local, apenas deles, mas também da Secretária de Estado da Cultura, produtora cultural Eleonora Santa Rosa, e do Ministro da Cultural, extraordinário cantor e compositor Gilberto Gil. Claro: a cordialidade é meu vício brasileiro.

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