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Quarta-Feira,1 de Janeiro

Somos todos crianças - por Sérgio Murilo Ferreira

Jornal O Norte
Publicado em 28/11/2007 às 11:57.Atualizado em 15/11/2021 às 08:24.

Sérgio Murilo Ferreira *



Recentemente, li na revista Crash uma reportagem sobre pessoas nos Estados Unidos que, provavelmente, movidas por seu gosto por quadrinhos, passaram a vestir uniformes coloridos e a patrulhar a cidade auxiliando a polícia, na ânsia de viverem as suas próprias aventuras. Entre elas, destaca-se o Citizem Prime, que conta com uma armadura e um cinto de utilidades no melhor estilo vigilante.



É interessante observar o sentido dessas atividades. Não sei dizer se, em mais partes do mundo, existem cidadãos fantasiados atuando da mesma maneira, mas duvido que o fenômeno seja, em si mesmo, único ou recente. São pessoas que provavelmente sonharam toda a vida com aventuras, realizações heróicas e, de um momento para o outro, desejaram que esses sonhos fossem realidade.



Percebi tal sensação há poucas semanas atrás, quando tomei conhecimento do vampiro de São Paulo, que aliciava adolescentes, prometendo-lhes vida eterna na forma de vampiros. Não creio que o mentor desse evento em particular tenha sido bem intencionado em suas atitudes, mas imagino como cada jovem daqueles suspirou ao imaginar que suas fantasias pudessem ser reais, quem sabe alguns deles até mesmo soubessem que estavam sendo ludibriados, mas se deixaram enganar, seduzidos pelo sonho.



Mas o fundo desta questão não está nas fantasias vendidas pela mídia, consumidas vorazmente pelas pessoas; as fantasias são em si uma via de escape da realidade, uma maneira de alimentar o anseio humano. Mas o que está de fato no centro da questão é a inconformidade humana com a sua própria condição.



Desde os tempos antigos, o homem sonha em transpassar a sua condição limitada e mortal. cada ritual para a imortalidade, como a pesquisa pelos alquímicos pelo elixir da longa vida, os rituais egípcios de mumificação, as pesquisas da medicina tradicional chinesa já davam mostras desta inconformidade humana.



Como Hanna Arendt cita em seu livro “A condição humana”, talvez o desejo de fugir da condição humana esteja presente no desejo de se prolongar a vida.



Mas esta faceta do caráter humano não se encontra só neste fenômeno como também em outros. Em 1957, foi lançado pela primeira vez um objeto ao espaço, um objeto produzido pelos homens, o qual girou pela Terra seguindo as mesmas leis da órbita dos astros por algum tempo. Junto com ele, veio a esperança de que o homem não iria sempre estar preso à terra. Mesmo a terra de onde o homem retira toda a sua existência e onde vive é reconhecida como uma prisão, uma limitação, barreira a ser vencida.



O ser humano há muito não se encara como parte da natureza. Consciente de sua existência, almeja transpassar seus limites. Ele sonha e anseia alcançar novos horizontes. A fantasia faz parte de quase todos as pessoas, das mais diversas idades. É como se existisse uma criança interior que se recusa a aceitar que é um ser passageiro, limitado e frágil, que quer continuar a sua existência, que não quer estar sujeito a limites como todo mundo. Bem... é a esta criança interna a quem provavelmente a humanidade deve boa parte das suas conquistas, no campo da medicina, da física, biologia, astronomia, cibernética, entre outras. E a mesma criança se manifesta na humanidade, levando adultos a agirem de diversas maneiras, assumindo as suas fantasias socialmente.



* Estudante do curso de Ciências Sociais

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