RUA DA AMARGURA

Jornal O Norte
01/02/2008 às 16:06.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:24

**Nelson Mendes Pereira


**Cidadão Brasilminese


e sócio da ACLECIA

Nascida na minha Brasilinha, passou a maior parte da sua vida rodeada de conforto, de luxo, de fausto até, como convém às damas da sociedade burguesa, criadas no seio de família abastada. Jovem, casou-se com um moço oriundo de Salvador-BA, que exercia a profissão de alfaiate; não um costureiro qualquer, mas um profissional gabaritado e famoso, vindo da terra de Rui para radicar-se na nossa “Contendas”, o que lhe conferiu o cartel de pessoa importante para os padrões da época.

Certa feita a altiva dama dignou-se a visitar-nos, não no sentido social.A importante senhora procurava seu marido na casa em que morávamos e que era bem freqüentada hospedaria. Atendida pela minha bondosa mãe com distinção que a sua posição social lhe conferira por quase toda a vida, retirou-se a garbosa mulher e eu, criança pobre não acostumado a ver tanto luxo, indaguei da dona Lieta quem era tão insigne criatura, afirmando-me minha genitora tratar-se de pessoa muito importante, famosa e rica.

O tempo passou, tornei-me adulto e anos depois, já residindo em Montes Claros, ao procurar um alfaiate para me fazer um terno, eis que em plena Rua Padre Augusto encontro o marido da ex-famosa mulher.Sim, o seu companheiro para sobreviver voltara a exercer o seu mister da tesoura e da agulha; porém determinara o destino que o outrora festejado costureiro morresse pouco depois, deixando a esposa na mais triste penúria, pois a vida que levaram ainda na minha Brasilinha o fora de dissipações, dilapidando todo o seu patrimônio.

Algum tempo depois, estando de férias, eu divagava pela mata adjacente ao hoje suntuoso Jardim Panorama quando, ao passar pela porta de miserável barraco, deparei com a antiga luxuosa dama da minha distante infância, agora esfarrapada, rota e valetudinária figura humana, acendendo fogo com jornais velhos para preparar seu magro desjejum.

Daí à indigência total foi apenas um passo e, com muita tristeza, por várias vezes a encontrei perambulando pelas nossas ruas à cata de papéis velhos e outros objetos menos valiosos.Mas um dia o Criador, na Sua Onipotência inquestionável, colocando fim àquele sofrimento, levou-a para perto de Si quando, debilitada e doente, caíra sem vida em uma das vielas da cidade, tendo sido levada na condição de indigente para o IML e transportada para a sua última moradia como mendiga, pobre e miseravelmente só.


Que tu tenhas o sono dos justos, minha cara senhora.

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