Roberto Mangabeira Unger e o Norte de Minas

Jornal O Norte
27/07/2009 às 10:25.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:05

“Somos razão e desejo” (Roberto M. Unger)

Marcelo Valmor


Colaboração para O NORTE

A recente visita do ex-Ministro Extraordinário de Assuntos Estratégicos do Brasil, Roberto Mangabeira Unger, ao norte de Minas, causou uma repercussão pequena, com exceção dos órgãos de imprensa que o destacaram sob as mais variadas formas: professor ministro, intelectual, político Unger, etc. foram as mais usadas.

Reuniões foram marcadas. O ministro discursou. Citou que o nordeste pode ser a nova China. Evidentemente que chamou a atenção não para os aspectos grandiosos daquele país, mas para a exploração da mão de obra chinesa, que, segundo ele, seria comparada a do nordeste, o que permitiria uma concorrência mais próxima com os produtos daquele país.

Esqueceu o ministro que na China há educação e saúde de qualidade e gratuita; que a assistência pública em outras áreas, cultura, principalmente, se faz sem uma contrapartida financeira do “cidadão”, enquanto que, no nordeste, vigora, sob a forma mais intensa e desleal com aquele povo, o programa federal bolsa família.

Evidentemente que a médio, senão a curtíssimo prazo, o povo nordestino daria uma banana para os seus patrões, caso não recebessem as compensações sociais correspondentes ao modelo chinês. Isso é uma questão óbvia.

Unger tem uma trajetória curiosa. Filho de pai alemão que adotou a cidadania estadunidense e de mãe carioca, formou-se em direito no Rio de Janeiro, e, logo depois, aproveitando da dupla cidadania, foi fazer carreira em uma das melhores universidades do mundo que é a universidade de Harward, e por lá ficou.

Deu aulas para o mundo e Raimundo, além do presidente Barak Obama, é claro, para depois retornar ao Brasil e reclamar um espaço dentro de um país que ele conhece muito pouco. Claro que não negamos aqui o valor do ex-ministro, mas sabemos que, depois de desancar Lula e cia. limitada via Folha de São Paulo, demonstrou arrependimento e foi convidado para integrar o governo do PT. Os seus conhecimentos sobre o Consenso de Washington e seus trabalhos sobre o mundo liberal e globalizado o avalizaram para se aproximar ainda mais do governo.

Renunciou a um salário na universidade de Harward de R44.000,00/mês para ganhar em torno de R8.000,00/mês somente para planejar o Brasil para o ano de 2022? Se fez esse “esforço cívico”, por que não continuou no governo?

Segundo consta, a universidade o teria obrigado a retornar, sob pena de ser dispensado dos seus serviços. Mas se o governo federal fez tanta questão da sua presença, poderia tê-lo mantido como funcionário remunerado do Estado, somente o consultando quando o momento fosse interessante. Acontece algo semelhante com João Batista de Almeida Costa, o Joba, no Rio de Janeiro, que, prestando serviços à fundação Darcy Ribeiro, continua sendo remunerado pelo povo dessa terra.

Mas voltando aquilo que nos interessa. O que veio fazer o ministro Unger no norte de Minas? Falar sobre a possibilidade de termos uma nova China? Plantar a campanha da ministra Dilma Rousself na região? Beber uma havana? Mistérios... Mas que, humildemente, tentarei, se não respondê-los, pelo menos, tentar chegar a verdade através daquilo que meu colega de Unimontes, o professor doutor Laurindo Mékie Pereira chama de contraditório.

Primeiro. Quanto à nova China, não seria mais interessante que tivesse trazido projetos mais claros sobre essa sua fala? Segundo, se fosse para lançar a candidatura da ministra, não seria o caso de tê-lo feito numa capital nordestina de maior visibilidade política como Fortaleza, Natal, etc.? Terceiro, se fosse para beber uma havana, não precisaria ter se deslocado de tão longe. Nosso presidente, apesar de ter parado de beber, tem, em seus estoques, unidades que costuma presentear seus amigos, a não ser que não seja o caso do ex-ministro.

Como não foi possível responder o porque da visita do ministro, restaria passar para a reação da nossa classe política. Enquanto uns pediram a criação de uma Universidade Federal na região, outros teriam solicitado a criação do escritório da SUDENE, entre outros pedidos.

Unger, evidentemente que ouviu as nossas preces, mas como não é Deus, recebeu a cachaça doada, anotou os pedidos, e, num gran finale, como toda visita mau educada, criticou o estado de Minas Gerais, que, segundo ele, estaria com sua economia “fincada em setores fortes”.?

Resumo da ópera. O ministro veio, fez discurso, recebeu reivindicações, ganhou uma havana, foi deselegante e, como se vivêssemos um sonho surreal, voltou para Brasília no dia seguinte, e, ato contínuo, foi exonerado do governo para voltar a trabalhar próximo da inteligência liberal norte americana.

Para nós restou a angústia e a impressão de termos recebido um fantasma. Mas o consolo será o de transformarmos os pedidos feitos ao ministro em preces, e que Deus, generoso, possa nos ajudar. Quanto à cachaça havana, essa, com certeza, não pediremos de volta. Ela ainda é o nosso maior produto de exportação.

E quanto à epígrafe do texto, retirada do seu livro Conhecimento e Política de 1975, só podemos deduzir uma coisa. A racionalidade veio com o ministro, enquanto que o desejo continua com a gente.

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