Ré véi (l) longo

Jornal O Norte
07/01/2009 às 10:43.
Atualizado em 15/11/2021 às 06:49

Márcio Adriano Moraes


Professor de Literatura e Português


 


Percurso nada longo, pé na tábua, ou melhor, no pedal e vamos se embora. Na estrada da produção já produzindo piadas, gargalhadas e também burradas. O cara de chapéu esqueceu o mapa que indicava o trajeto da fazenda, mas o bombado era o cara da estrada, muitos anos com a testa no lotação. O violeiro abraçado com o teclado parecia sentir saudades das modinhas de viola, no player só um rol de rock. E passa direto, vem a linha, vem o chão, vem a ponte, o mata-burro, e fazenda errada. O rock errou! Feliz de quem inventou o celular para esses momentos perdidos. Volta completa, o socorro chega. Agora sim, rota certa.

Saudações cordiais e a tequila já preparada. O carvão? esqueceram; o fogareiro? esqueceram; o mel? esqueceram; o copo para o vinho do Porto? esqueceram; só não esqueceram de esquecer. Mas tudo é festa e alegria, som na caixa e manda ver a carne na chapa. Teve um cabeçudo que jogou até acerola para assar. O médico da turma discorreu sobre as potencialidades vitamínicas dessa frutinha. O cabeçudo com seus conhecimentos de culinária resolveu inovar: acerola ao molho inglês. Aí a advertência da dona da casa, o número dois só no bainheiro de fora. Congestionamento.

O cara de chapéu e o violeiro foram em busca do rio perdido. Com espírito de Indiana Jones enfrentaram atilhos e cercaduras. A técnica de pular a cerca do violeiro, sem dúvida, é a melhor. O normal é passar debaixo dos arames, mas o tocador literalmente pula a cerca, recusa até os colchetes. É verdade que ele sempre cai com um arranhãozinho aqui outro ali, mas nada que não suporte. Afinal, foram anos pulando a cerca do vizinho. Finalmente, o rio das lamas perdido, difícil identificar a água. Banho mesmo só o de ducha.

Sono vespertino, babas involuntárias molham o assoalho, mas o bombado não para de comer, queria liquidar com o pomar inteiro. O violeiro ajudou com sua boa pontaria nas mangas ubás. Tragédia, tragédia! A cabeçuda, companheira do cabeçudo, fez o número dois no banheiro de dentro. Nenhum bombeiro por perto, ácido, por favor! Chamem o bombado! Técnica milenar de retirar charutos do sanitário com uma sacolinha de supermercado.

E começa a festa, poucas horas para o novo ano. DJ computer. Um recheado de frango nunca antes visto na história deste país. O casal do ano, mais comentado e mais aclamado: palpito e azeitona! Em segundo lugar, está o casamento saudável da alface e do tomate. Mas alguém esqueceu o tomate em casa, e a alface se contentou com o azeite. A coca-cola é soberana, mas perde para o White e para a Real Campanha.

O rádio ligado, contagem regressiva, estouram-se as sidras e cabelos e roupas molhados de essência de maçãs. Flashes, desejos de felicidades, abraços trocados, ligações recebidas e muita alegria. Hora de deixar as tristezas do ano findado escondidas no peito e escancarar um riso, ainda que tímido. Tentar preservar essa alegria durante todos os dias vindouros. E como eu disse no último texto “Feliz dia novo”, repito aqui no final:

Ainda que todos os desejos bons sejam reverberados nestes tempos de fim de ano que são acalorados com o nascimento do salvador, é preciso abrir os olhos todos os dias e encarar a realidade horrível, temível. É preciso usar o branco todos os dias, uma permissão mais que necessária como nos incentiva Thiago de Melo no artigo X de seu Estatuto do homem: “fica permitido a qualquer pessoa, qualquer hora da vida, o uso do traje branco”.

Bom é acordar todos os dias e encarar de peito aberto as dores e alegrias cotidianas e, no final deste mesmo dia, abrir um champanhe, agradecer ao Pai por tudo e pedir, singelamente, que o próximo dia seja melhor. Que a fartura de todos os Anos Novos se converta em Dias Novos. E que a paz e a prosperidade desejada no final do velho ano sejam o esforço de viver humanamente todos os dias desta tão conturbada e imprevisível vida.

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