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Terça-Feira,13 de Maio

Psicologia: A síndrome do forasteiro - por Leila Silveira Miranda

Jornal O Norte
Publicado em 03/08/2007 às 11:05.Atualizado em 15/11/2021 às 08:11.

Leila Silveira Miranda *



Leila: - Gostaria que você fizesse uma avaliação sobre meu comportamento.Sou solteira, tenho 21 anos, já faz oito anos que viemos para Montes Claros, meus pais se mudaram daqui faz três anos, formei o ensino médio e atualmente  faço pré-vestibular.



Sinto uma grande falta da minha mãe, isso me afeta muito. Meus amigos comentam sobre meu humor e comportamento, que mudam rapidamente. Ás vezes sente muita vontade de largar tudo, e  ir para onde ela mora, mas depois vem outro pensamento, pra eu ficar fazer uma faculdade e dar orgulho aos meus pais. Moro com minha irmã, que é  muito distante quase não conversar comigo, então por esses motivos fico muito triste e deprimida, estou sempre chorando escondida no canto do quarto, não gosto de sair de casa, em alguns momentos quando estou no cursinho tenho vontade de sair, sumir, fazer alguma coisa diferente do que já fiz até agora. (Uma coisa que me acalma e que gosto muito e de ficar em casa sozinho e ouvir som no último volume) 



Muito obrigada pela sua atenção, para mim suas mensagens de apoio são excelentes.



Antes de propriamente responder a carta da leitora A.K.P., por alguma razão transportei-me , para um clássico do cinema, o western SHANE (os brutos também amam), conforme tradução pouco feliz em português) , que narra a história do pistoleiro Shane, que tenta encontrar a paz e o anonimato,  trabalhando numa estância como vaqueiro para uma família simples. Aos poucos, com seu trabalho dedicado e atitudes generosas vai conquistando a confiança da família e até de seus vizinhos, todos ameaçados de serem despejados por uma  quadrilha de malfeitores que dominava pela força a região.



Num  final apoteótico acaba por ser  vitima de sua própria identidade, pois contra a sua vontade sente-se obrigado  a  assumir novamente o seu antigo papel ,  e enfrentar sozinho e liquidar os inimigos daquela comunidade, retomando seu destino errante, após cumprir sua mais difícil missão...Talvez o melhor titulo para o filme seria:  “Do seu verdadeiro  destino ninguém escapa”....



Fiz todo este preâmbulo para iniciar a analise de aspectos importantes do ponto de vista existencial a serem abordados , no sentido de despertar nossa leitora para os desafios da vida (destino) dos quais ninguém consegue escapar,  a não ser se conseguir se exilar numa bolha , numa ilha deserta, ou numa fantasia mental psicótica.



Claro que não vivemos mais no Velho Oeste,  mas guardadas as devidas proporções o filme citado é mais atual do que nunca, pois neste mundo cada vez mais globalizado e competitivo , é cada vez mais freqüente a figura do forasteiro: seja nas empresas, seja nas cidades , seja nas comunidades, seja nas famílias , seja nas sociedades, nas igrejas, na política, nos bancos escolares, no trabalho, nas festas, nas ruas , nos esportes...



Todo forasteiro tem que enfrentar o desafio,  que é o de conquistar seu espaço. Você precisa maximizar suas habilidades e minimizar suas dificuldades. Você sobre pela ausência de sua mãe, mas toda separação envolve um luto, uma dor, cujo  prolongamento excessivo é danoso e significa apego ao passado.



A própria Bíblia, desde os tempos de Sodoma e Gomorra, já nos ensinou que não devemos  nos prender ao passado , sob  o risco de virar estatuas de sal.



Portanto devemos investir nos novos relacionamentos, acreditar mais em si própria, apostar mais em nossa própria intuição, seguir em frente, esperançosa  e sem olhar para trás...



Na realidade parece que você está com medo do novo, inclusive de estar consigo própria quando afirma que se acalma ouvindo o som no ultimo volume.



Grandes mestres  tiveram antes da celebridade,  que percorrer  um caminho próprio de San Tiago de Compostela ,  onde inevitavelmente  se depararam com  todos seus anjos e demônios interiores.



Você está , de fato ,  iniciando  o seu próprio Caminho , que na realidade tem servido para aflorar suas fragilidades  latentes, até então protegidas pelo aconchego familiar.



É sintomático que isto esteja acontecendo aos 21 anos , que é justamente o parto para a maioridade, que você tem tentado evitar. Daqui para frente querida,  você terá que lidar com situações novas , com o presente e o futuro, fazendo suas própria s escolhas.



Está é a condição básica para nos enturmarmos com  novas pessoas, descobrirmos os novos sabores, perscrutarmos as novas possibilidades, enfrentarmos os novos desafios, descobrirmos novas fronteiras, abandonando velhos hábitos, desertando velhos costumes, arando novas terras, cultivamos novos aromas, experimentando novos amores, criando novas raízes, e escrevendo novos capítulos em nossa empolgante passagem por este magnífico planeta.



O desafio de desbravar uma nova região, a prova de conquistar novas amizades, a missão de encarar uma nova carreira profissional, a mudança (seja ela qual for),  deve ser encarada como uma nova oportunidade que Deus nos concede para nos tornarmos melhores, para aplicarmos nosso conhecimento anterior sem cometer os mesmos erros, e deve ser realizada com a mesma volúpia e energia com que um atleta volta à arena disposto a recuperar o recorde perdido.



Os obstáculos só devem servir para nos desafiar como as  balizas nas corridas atléticas que nos impele a uma maior disciplina, treino, confiança e preparação prévias, que antecedem a alegria da vitória , da conquista.



É claro que em alguns, eu diria muitos casos, (inclusive de celebridades vitoriosas em vários campos), houve num determinado momento, crises de fraqueza, quebra da auto-estima, tristeza, angustia e desilusão, pois afinal de contas estas são características e provas cabais de nossa humanidade, e podem ocorrer com qualquer um....Neste momento, acredito ser o momento certo de você procurar uma ajuda profissional,  avaliar a extensão desta sua  tristeza , as mudanças de humor, e sua própria dificuldade de interagir com sua irmã, a fim de trabalhar sua auto-estima, garantir estabilidade de comportamento, propiciando assim munição para enfrentar com segurança as vicissitudes da vida e promovendo uma qualidade razoável de vida.



Lembre-se que todo belo horizonte é precedido de uma grande  montanha, e que o dia só escurece ate a meia-noite.



Não desista, resignifique  suas crenças e se permita ser feliz. Você merece!



* Psicóloga, professora do Isemoc/ Funorte


leilasilveira@bol.com.br

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