Luís Alberto Caldeira
Jornalista
Em 2007, escrevi que o carnaval é um precedente aberto pelo calendário cristão para se empanturrar legitimamente de prazeres mundanos antes do jejum da quaresma, quando damos adeus à carne, neste caso, humana mesmo. Uma ordem quase autoritária dizendo algo como: "Agora... todo mundo... é hora de pecar! Valendo!", com direito a pedir perdão sete domingos depois na páscoa. Bunda e peito de fora na avenida sem pudor.
Mas o pessoal carregou tanto essa ideia de "ninguém é de ninguém" para o resto do ano que esse feriado meio que perdeu o sentido. Vá, em qualquer época, a um baile funk, festa rave, micareta, ou assista ao BBB, por exemplo, e note que a promiscuidade já se tornou se não aceitável, mas tolerável pela sociedade.
Então, por que parar uma semana inteira e exclusiva para cultuar isso mais ainda? Mera desculpa para inutilizar os dias úteis e adiar o início do ano? Comemorar o quê? Não é Natal, dia santo, dia das mães, gol da seleção e nem coincidência demais para a nação inteira ter nascido em fevereiro para fazer aniversário. Carnaval é a falsa alegria de sair pulando por aí como se tivesse ganhado na Mega Sena.
Mas serve também para exibir o resultado da última dieta, a frequência na academia de ginástica, a lipo submetida, o silicone implantado. Ou para viajar sozinho pela primeira vez com os amigos, experimentar fantasias que em dias comuns são banidas pela moral dos homens, encontrar um amor de carnaval. Aumentar o consumo de álcool e outras drogas, o número de mortes por acidentes nas estradas, de doenças sexualmente transmissíveis, de gravidezes não-programadas. Dar emprego a músicos, artesãos de alegorias, vendedores ambulantes, promotores de eventos, agentes de turismo. Promover cidades do interior, bandas de axé, novas músicas, e dar folga a bandas de rock. Ou simplesmente para descansar, de preferência bem longe dos sons altos dos trios-elétricos e carros tunados tocando "Rebolation".