O que é o Galo, por um não-atleticano

Jornal O Norte
Publicado em 16/04/2008 às 11:04.Atualizado em 15/11/2021 às 07:30.

Joelmir Betting


  


O melhor lance do Atlético não foi num jogo.



Foi fora dele. Foi numa derrota.



Minto, num empate de um time invicto, o supervice-campeão do BR-77.



Não foi o melhor jogo ou jogada.



Mas não teve nada mais atleticano que aquilo: depois da derrota nos pênaltis para o São Paulo, Mineirão e Brasileirão estupefatos pela queda sem derrota de um senhor time de bola, os jogadores baqueados e barreados pela chuva e pela lama se abraçaram no gramado e assim foram ao vestiário.



Foi a primeira vez que vi a cena reverente que virou referência. Ninguém estava fazendo marketing (nem existia a tal palavra).



Nenhum jogador estava jogando pra galera. Era fato.



Time e torcida estavam juntos naquele abraço doído e doido. Como tantas vezes o atleticano esteve junto com o time. Qualquer time.



Nada é mais atleticano que aquilo: um time que se comportou como o torcedor.



Solidário na dor, irmão no gol.



O atleticano é assim: tem a coragem do galo, mas não a crista.



Luta e vibra com raça e amor. Mas não se acha o dono do terreiro.



Sabe que precisa brigar contra quase tudo e contra quase todos. Até contra o vento, na célebre imagem de Roberto Drummond.



Aquela que fala da camisa preta e branca pendurada num varal durante uma tempestade. Para o escritor atleticano, ou, melhor, para o atleticano escritor, o torcedor do Atlético sopraria e torceria contra o vento durante a tormenta.



Não é metáfora. É meta de quem muitas vezes fica de fora da festa. Não porque quer. Mas porque não querem.



Posso falar como jornalista há 17 anos e torcedor não-atleticano há 41: não há grande equipe no país mais prejudicada pela arbitragem.



Os exemplos são tantos e estão guardados nos olhos e no fígado.



Não por acaso, o atleticano acaba perdendo alguns jogos e títulos ganhos porque acumulou nas veias as picadas do apito armado.



Algumas vezes, é fato, faltou time. Ou só sobrou raça. Mas não faltou aquilo que sobra no Mineirão, no Independência, onde o Galo for jogar: torcida.



Pode não ser a maior, pode não ser a melhor, pode até se perder e fazer perder por tamanha paixão, cobrando gols do camisa 9 como se todos fossem Reinaldo, pedindo técnica e armação no meio-campo como se todos fossem Cerezo, exigindo segurança e elegância da zaga como se todos fossem Luisinho.



Mas não se pode cobrar ninguém por amar  incondicionalmente.



O atleticano não exige bola de todo o time. Não cobra inspiração de cada jogador. Quer apenas ver um atleticano transpirando em cada camisa, em cada posição, em cada jogada.



Por isso pede para que o time lute.



É o mínimo para quem dá o máximo na arquibancada.



A maior vitória atleticana é essa. Mais que o primeiro Brasileirão, em 1971, mais que o vice mais campeão da história do Brasil, em 1977.



Os tantos títulos e troféus contam. Mas tamanha paixão, essa não se mede.



Essa é desmedida.



Essa é a essência atleticana.



Essa é centenária.



Essa é eterna.

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