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Sexta-Feira,10 de Janeiro

O japonês sortudo

Jornal O Norte
Publicado em 21/09/2010 às 10:50.Atualizado em 15/11/2021 às 06:39.

Felippe Prates


Jornalista e escritor



Muito se enganam aqueles que consideram todo venezuelano mau caráter, tal e qual seu presidente, o ridículo e mal amado ditador Hugo Chaves, um perigoso desmiolado. Diz Lula, o único líder mundial respeitado por Chaves e a quem ouve, que pelo menos a cada dois meses viaja à Venezuela para "segurar" o homem, segundo ele, um doido de pedras a arriscar a segurança do nosso continente com sua megalomania e loucura!  Na verdade, emboramente o sofrimento e a vergonha hoje vividos pela pacata população do país amigo, tem muito venezuelano gente boa, sério. Se não, vejamos.



Há 22 anos, numa viagem à Europa, durante a travessia do canal da Mancha, que liga as cidades de Calais, na França, a Dover, na Inglaterra, deu-se um fato realmente, para nós brasileiros, incrível!  Fujiro Aoki, então um novo conhecido, nascido no Japão, morava em São Paulo, onde criou família com sua esposa japonesa Nilsi, rico empresário de tecidos.  Conversávamos com alguns ingleses sobre Fórmula 1, num dos salões da embarcação, quando fomos abordados pelo Aoki que, muito formal e cerimonioso como todo japonês bem educado, depois de vários pedidos de desculpas e algumas reverências, nos disse:



 - Senhor Prates.  O senhor fala bem o inglês e será que poderia me fazer uma gentileza?



 - Pois não, senhor Aoki.  Disponha.



 - Alguns minutos atrás, ali na entrada do salão principal, ao tirar o meu relógio para verificar a hora, esqueci-me que havia 250 dólares no fundo do bolso e, naturalmente, caíram no chão.  Gostaria que o senhor falasse com a moça da recepção, para que solicitasse, pelos alto-falantes, a quem encontrou o dinheiro, me devolvesse.



 Ingenuidade?  Tolice?  Nada disso revelava a expressão tranqüila e esperançosa do Aoki, fiel a uma cultura bastante diferente da nossa que garante às pessoas e delas sempre espera um comportamento ético, correto, numa confiança natural em seu semelhante, mesmo desconhecido, este um sentimento simplesmente encantador.



 E lá fomos nós, atender ao inusitado pedido do Aoki, mais em homenagem à credulidade, aos princípios e à sua fé no ser humano, mesmo considerando a missão fracativa...  Tratava-se de um grande "ferry-boat", em que ônibus, caminhões, carros são embarcados na parte térrea do navio e, num segundo andar, viajavam durante hora e meia aproximadamente, duzentos passageiros, inclusive uma alegre delegação de jovens venezuelanos comemorando a formatura.  Nesse espaço, conhecido como convés, havia um ótimo restaurante, vários salões com confortáveis poltronas e um "free shop", tudo cercado por espessos e transparentes vidros, que além de garantir ótima iluminação, permitiam a visão do mar, palco de incontáveis batalhas navais e aéreas, túmulo de milhares de soldados vitimados pela Segunda Grande Guerra, de tristíssima memória.



Passamos o recado à inglesa da Recepção que, imediatamente, perguntou ao Aoki:



 - Estes 250 dólares, quantas notas são?



Traduzimos para o português e nosso japonês, respondeu:



 - Seis. Duas notas de 100, duas notas de 20 e duas notas de 5 dólares.



 - Aqui está o seu dinheiro, disse a recepcionista, entregando-o ao Aoki.



Tinha sido achado e devolvido à Recepção, por um jovem e duro turista venezuelano.

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