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Sexta-Feira,20 de Setembro

O grande amor de Dom Pedro I

Jornal O Norte
16/11/2009 às 12:06.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:17

Felippe Prates

Há 180 anos, no Brasil, aconteceu na família imperial um caso de amor à primeira vista.  Na manhã do dia l6 de outubro de l829, aportou na Baia de Guanabara uma fragata transportando uma jovem tão linda quanto uma rosa.  Ela se chamava Amélia Augusta Eugênia Napoleona de Beauharnais, princesa de Leuchtenberg e de Eichsteadt, tinha 17 anos e era neta da imperatriz Josefina, casada em segundas núpcias com Napoleão Bonaparte.  Sem se conter, D.Pedro I foi ao encontro de sua tão esperada noiva. Os jornais da época, que haviam alardeado seus dotes pessoais, não exageraram e ao ser apresentado à princesa prometida, D.Pedro I deslumbrou-se com sua beleza e de tanta emoção caiu sentado em uma cadeira e quase perdeu os sentidos.  Viúvo e repelido nas suas pretensões matrimoniais por má reputação e a justa fama de mulherengo, D.Pedro só conseguiu moça tão cheia de qualidades graças aos ingentes esforços de seu embaixador na França, o Visconde de Pedra Branca.

Os quadros revelam que D. Amélia, sempre muito elegante, possuía cintura fina, apertada com espartilhos, usava saias abertas em “evasês”, “tops” em imensas mangas balão ou “jambom”. Era aquele o tempo em que os “spencers”, os sapatos de baile sem saltos e as botinas de sarja fina entraram na moda, quando as bolsas de mão foram substituídas pelos leques.  Pessoalmente, uma mulher de notável beleza, usava seus cabelos louros penteados em cachos ou em coques, emoldurando um rosto perfeito, deslumbrante. Possuía porte altivo, era bastante alta, olhos azuis-céu, pele alva, delicada, macia como um pêssego, andar esvoaçante, e, naquele tempo, pelo pouco que se via mas pelo muito que aparentava, braços, mãos, pernas, pés e quadris esculturais. Ou seja, linda, linda, linda qual a mais linda deusa do Olimpo!

Enquanto isso, nas lojas da capital fitas e tecidos cor de rosa se esgotaram. Era esta a cor preferida da princesa, a “adorada Amélia, minha salvadora, salvadora do Brasil”, nas palavras do apaixonado futuro marido.  O Marques de Barbacena, testemunha ocular de um encontro, assim o relatou:  “Vi os noivos tão ocupados um com o outro, numa conversa sem fim, como se fossem namorados de muitos anos.  Neste momento, considero aqueles dois entes os mais felizes do mundo”.  Entusiasmado, o Marquês de Resende, ministro do Brasil, assim descreveu a noiva: “Um ar de corpo como o que o pintor Corregio deu nos seus quadros à rainha de Sabá e uma afabilidade que aí há de fazer derreter a todos, fez com que eu exclamasse, na volta para casa:  Valham-me as cinco chegas de Nosso Senhor Jesus Cristo, já que pelos meus enormes pecados não sou o imperador do Brasil!” E prosseguia, inconveniente: “Que fará o nosso amo na primeira, na segunda e em mil e uma noites?  Que sofreguidão!”  Não errou.  Anos mais tarde D.Pedro ainda chamava a esposa carinhosamente de “bom bocado do rei...”

Poucos dias após a chegada da princesa, a cidade engalanou-se para as reais bodas.  Salvas de artilharia, iluminações especiais, repiques de sinos e arcos triunfais somaram-se ao longo cortejo de carruagens, desde o Arsenal de Marinha até a Capela Imperial, onde se celebrou um belíssimo casamento religioso. A cerimônia foi encerrada com um Te-Deum cantado pelos professores da Imperial Câmara, com música de autoria do próprio Imperador.  D.Amélia adotou o costume oriundo da época do consulado napoleônico: um vestido de casamento branco, longo, acompanhado de véu de renda, o mesmo que usou Carolina Bonaparte para esposar o general Murat.

Apesar da pouca idade, graças à sua apurada inteligência, refinada educação, forte personalidade e incomum habilidade, D.Amélia veio para mudar a vida não só de D.Pedro, mas também a da sua corte.  Ao chegar ao Paço de São Cristóvão, onde o rei despachava, ficou impressionada com a desordem reinante.  O Imperador recebia a todos de qualquer maneira.  Imediatamente tratou de disciplinar o Palácio, impondo etiqueta e cerimonial, além de protocolo, restabeleceu todas as cerimônias de ostentação, obrigando o rigoroso cumprimento de horários e adotou-se o Francês como língua oficial. Além disso, introduziu o refinamento dos serviços e da indumentária.  Feminina, belíssima e jovem, D.Amélia inspirou a criação da Ordem da Rosa, condecoração criada pelo marido em sua homenagem, com o lema  “Amor e Fidelidade”, consolidando nos trópicos um “savoir vivre” (saber viver) característico das melhores cortes européias.

Num monumental e imperial banho de loja e de “finesse”, a seu pedido D.Pedro renovou todo o mobiliário dos palácios, escolhido peça por peça pela Imperatriz. D.Amélia adquiriu tecidos finos, louças requintadas e objetos de decoração. O casal imperial recebia em monumental baixela em “vermeil”, com peças em prata executadas pelo célebre Odiot, serviço de mesa com a inicial “A” em dourado, ou o de casamento pintado a mão com paisagens, flores e frutos em policromia.  Todos os copos da família imperial eram em cristal Bacarat, roupas de cama em damasco, tendo nos cantos bordada a inicial “A”, sob coroa imperial.

A impecável elegância da Imperatriz com vestidos e roupas requintadas, registrava-se até na correspondência estrangeira.  Como complementos, ela gostava de usar diademas com pingentes e medalhões, brincos, broches e pentes de cabelo em aço cromado, mantos, redingotes e “pelérines” de tafetá com barras, canudilhos, em lâminas de ouro, vestidos bordados no mesmo metal.  Colares de esmeraldas ou ametistas facetadas.

O casamento de D.Pedro com D.Amélia teve, também, um lado político. Representou uma fase de calmaria em meio ao turbilhão de acontecimentos que caracterizou o Primeiro Reinado. Ao revelar o seu lado humano, romanticamente envolvido num idílio amoroso com uma Imperatriz a quem todos respeitavam, admiravam e amavam, valendo-se da estratégia do amor, autêntica e verdadeira, empolgou os jovens súditos e, nessa esteira, seus pais, avós, o povo, enfim.

E graças à inteligência, à “finesse” e ao sentimento sincero de uma iluminada Imperatriz, pelas hábeis mãos de D.Amélia D.Pedro I voltou a ser o monarca amado por toda uma nação.

Insensível às razões do coração, isso a História do Brasil não conta. Coitada...

Fonte: Arquivo pessoal do pai do autor, o jornalista Newton Prates, um monarquista.


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