Meu amigo João Cândido - por Antônio Augusto Souto

Jornal O Norte
Publicado em 16/02/2007 às 12:38.Atualizado em 15/11/2021 às 07:58.

Antônio Augusto Souto *



Acabo de ler, na revisão final, o romance cujo nome é o título desta crônica. Seu autor é José Marques de Souza, meu amigo de muitos anos. Gerente de banco durante  décadas, aposentou-se e virou empresário do ramo de combustíveis e lubrificantes. Agora, surpreende-me como prosador de grandes méritos e consideráveis recursos.



Não é a primeira vez que faço, em nome da amizade, revisão de obras literárias, no início ou no final do processo de edição. Venho fazendo isso com prazer, embora deva confessar que o encargo seja espinhoso e delicado. Afinal, são pouquíssimos os autores que não se ofendem com  adaptações, correções e mexidas, no texto que elaboraram. Mestre Manoel Hygino dos Santos me disse, certa vez, que livro, para o autor, é como se fosse um filho. Assim sendo, que pai aceitaria, passivamente, que um estranho viesse a emendar e corrigir sua cria? Com essa preocupação, quando me procuram para esse fim, exijo que me dêem carta branca. E José Marques de Souza fez isso e me deixou inteiramente à vontade, inclusive para declarar, aqui, que os possíveis senões de linguagem do seu romance foram poucos e devem ser debitados à conta da digitação.



Mesmo correndo o risco da redundância, devo dizer que não faço essas revisões como profissional, que meu tempo de professor de língua portuguesa e literatura já passou. Por falar em professor e com o pensamento nas coisinhas que ando escrevendo, ocorre-me a figura de João Ribeiro. Em uma de suas obras filológicas, ele disse que dificilmente um professor de língua  qualquer uma  vira  bom escritor. Concordo com o filólogo da segunda metade do século XIX e ainda arrisco um exemplo: Júlio Ribeiro, seu irmão professor e autor de “A Carne”, foi romancista apenas mediano.



Retorno a “Meu amigo João Cândido”. Embora nele não se faça referência direta ao tempo cronológico da narrativa, os fatos romanceados se passam entre a segunda metade dos anos quarenta e a primeira, dos anos cinqüenta. O cenário é este sertão mineiro, eriçado pelo prolongamento dos trilhos da Rede



Ferroviária Federal, para interligar Minas e Bahia. Os protagonistas e os coadjuvantes são sertanejos de boa cepa. Mas há, também e entre eles, vilões e aventureiros, corruptos ativos e passivos, espertalhões e ingênuos ou inocentes úteis.



A leitura é agradável, o que minimiza o impacto inicial causado pelas 380 páginas da narrativa.



De certa forma, conheci, quando menino, o cenário, os tipos humanos e o conteúdo de algumas das peripécias.



Quem é possuidor do salutar hábito de leitura vai gostar do livro de José Marques de Souza. Se ele logrará sucesso ou não, isso já seria outra história, pois avalio que os leitores de bom-gosto estão, gradativamente, tornando-se escassos. Se a estimada leitora quiser tirar a prova dos nove de minha avaliação, sugiro-lhe que consulte, em revista noticiosa semanal, a lista dos livros mais vendidos, no Brasil e nos últimos anos: só mediocridades internacionais.



Tenho um exemplo em casa: Sil, a neta de quatorze anos, leu todos os livros do senhor Dan Brown e os adorou. Por insistência minha, iniciou a leitura de “Memorial de Aires”, que entendo ser a obra-prima de Machado de Assis. Não chegou à metade. Felizmente, no entanto, ela não gosta de Paulo Coelho.



* escreve aos sábados no suplemento Opinião

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