Mais uma ("Ai ai...") Copa com Galvão Bueno

Jornal O Norte
Publicado em 09/06/2006 às 10:07.Atualizado em 15/11/2021 às 08:37.

José Paulo Lanyi *



Nesta Copa, quem não tem TV a cabo está condenado às transmissões do locutor mais comentarista de que se tem notícia na face da Terra. Eu sei, eu sei, já se escreveram todos os bytes possíveis, já se queimaram todas as árvores do Canadá, aposentaram-se todos os microfones, tudo já se disse sobre o locutor mais cheerleader de que se tem notícia.



Paciência. Como me mudei há pouco e ainda não instalei o cabo, temo ser mais uma vítima do locutor mais dono-da-verdade de que se tem notícia. Não tem problema, me vingo aqui. Sou o vingador de todos os que não têm dinheiro para a prestação do pacote. Pena que o povo brasileiro não leia o Comunique-se. Gostaria de ser um vingador popular. Mas, como miséria atrai miséria, o povo terá que se contentar com ele, sem ao menos poder rir dele, espicaçá-lo... ou zuá-lo junto com a gente - como prefere o linguajar da massa. O último amistoso da Seleção Brasileira, o jogo contra a Nova Zelândia, foi a antecâmara da tortura que se avizinha. Pior é sentir-se trouxa duas vezes. Primeiro, por ter que agüentar uma sucessão ininterrupta de asneiras; depois, por pensar que, enquanto isso, ele está lá no bem-bom da Alemanha. É pago para fazer turismo. Antes fosse só isso... Às vezes, em minha fantasia, imagino-o a perder-se para sempre entre os caules frígidos da Floresta Negra... Posso ouvir aquele som, “Brrrrrrrrrrrrrrrrrrrasil!”, desfolhar-se metro após metro, como um fundo musical das batidas aceleradas do meu coração a cantar de alegria.“ “Não, não, não... Terei que ouvi-lo dizer que Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrronaldinho, o Gaúcho é gênio. Terei que ouvir essa assertiva científica por absolutamente 6.357 vezes. Está registrado na minha calculadora. Aquilo não é verborragia de pseudoteleanalista esportivo. É lavagem cerebral mesmo. "Quando ele toca na bola, todos esperam uma jogada de gênio". Repito: 6.357 vezes. Na próxima, talvez eu acredite que Ronaldinho é melhor do que Pelé, como alguns jornalistas viajandões têm propalado nestes tempos estranhos. 



Terei que ouvir, por absolutamente 8.345 vezes, a assertiva de que o Cafu é um exemplo de persistência e de profissionalismo; por absolutamente 27.837 vezes a conclusão de que Rrrrrrrrrrrrrrrrrrronaldo, o Fenômeno poderá se destacar no torneio. A exemplo do Kaká. E do Rrrrrrrrrrrrrrrrronaldo, o Gaúcho. E do Rrrrrrrrrrrobinho. 



Terei que...Terei nada! Vou é ligar o rádio e aproveitar a belíssima imagem da Globo. Galvão Bueno deveria ganhar cachê das emissoras de rádio. É garantia de audiência extra.



Não sei por que a Globo contrata comentarista. Pobres deles, deveriam receber adicional de insalubridade. São pagos para confirmar o que o Galvão pensa pensar. Ai deles se discordarem! Correm o risco de ser atirados ao campo pela janela da cabine. A sorte do Galvão é que ele tem o Arnaldo César Coelho como auxiliar. Digo, como comentarista. Não vou ofender o Arnaldo, não vou chamar de auxiliar o ex-árbitro que raramente enxerga o erro dos seus pares. O Arnaldo está mais para advogado do sindicato que para crítico do trabalho dos seus ex-colegas. Aquela bola na mão dentro da área que o mundo inteiro viu (sem precisar do replay), aquela falta que daria pena de morte em qualquer estádio chinês sério, aquele impedimento duvidoso, em que o atacante é lançado doze metros à frente do último defensor, nada disso o ex-Arnaldo consegue enxergar. Chega ao cúmulo de negar o que vemos pela ducentésima vez na repetição. Sem contar que, "in dubio, pau no réu". E o réu, quase sempre, é o jogador. 



Outro dia, no Campeonato Brasileiro, ele ofendeu toda uma categoria. A dos auxiliares, os populares bandeirinhas. Disse que, se o auxiliar fosse bom mesmo, seria árbitro. Como Deus castiga os preconceituosos, poucos minutos depois o árbitro cometeu uma lambança - apesar da indicação acertada do auxiliar. Em compensação, repare na condescendência com os juízes. Arnaldo para presidente do sindicato!



Sorte do Galvão. Com o Arnaldo lá, o torcedor pode escolher o alvo. E o primeiro, vez em quando, passa por discreto.



Mais calmo agora, ao saber, por meio de 29 boletins especiais, que as bolhas do Rrrrrrrrrrrrrrrronaldo, o Fenômeno estão em franca recuperação, - e que os atletas brasileiros foram fazer compras - fico a me perguntar se não estou pegando pesado com o Galvão, o pobre do homem que só quer trabalhar. Mas quando penso que, por dias e dias, terei que suportar aquele tal de "bem, amigos da Rede Globo!", nas transmissões e nos programas de, digamos, análise da rodada, deixo a boa vontade de lado. ““Pior do que isso (de novo), só a eliminação do Brasil.



* escritor, jornalista e dramaturgo

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