Adilson Cardoso


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A lua estava cheia, seus tons quentes se misturavam na profundidade do horizonte, no céu a explosão substancial clareava todas as formas surrealistas, da abstração do olhar. Peralta e faceira, a lua mergulhou com seus reflexos dentro da Pampulha. Uma brisa leve sussurrou ao meu ouvido e meu olfato ofereceu um delicioso perfume que eu tanto conhecia. Meu peito inflou-se para segurar um coração que não pôde se conter, pulou tanto que minhas pupilas dilataram. 

Ela chegou com seu toque sutil, feito fada, para não acordar o sonho. Dizer que estava linda talvez fosse redundante, pela sua beleza ampliada no vestido sedutor. Nada pôde ser dito. A fome voraz do desejo uniu nossos lábios loucamente, nossos corpos em combustão se queimavam sob o luar que parecia existir só para nós.

Nossas línguas rodopiavam tocando-se com fervor, com as mãos inconseqüentes tateando na volúpia de cada relevo do fogaréu, em que a carne padecia, a libido quebrou as correntes, libertando o seu grito, um ai asfixiado precipitou-se de sua boca e, como uma vítima do golpe fatal, emudeceu deixando apenas seus lábios nos meus, num ato antropofágico consentido.

“São duas flores unidas,são duas rosas nascidas talvez no mesmo arrebol, vivendo do mesmo galho, da mesma gota de orvalho do mesmo raio de sol, unidas como as penas de duas asas pequenas de um passarinho do céu, como um casal de rolinhas como uma tribo de andorinhas da tarde no frouxo véu”.

O poema de Castro Alves passa pela minha cabeça e me lembro de quando a conheci, aprisionado no seu palato e parceiro nessa dança do acasalamento que nossas línguas ainda praticam. Volto ao meu corpo colado ao dela, que suspira com os olhos cerrados. A lua se escondeu atrás de uma nuvem, deixando o céu negro por alguns instantes. Não foi esse o meu primeiro beijo, mas foi o beijo que nunca consegui esquecer.