Logotipo O Norte
Sexta-Feira,10 de Janeiro

Leitura sem censura - Convulsão capital - por Adilson Cardoso

Jornal O Norte
Publicado em 19/02/2008 às 10:39.Atualizado em 15/11/2021 às 07:25.

Bolsas presas aos braços, mãos que apertam contra o corpo em constante alerta. Ao longo de ruas e avenidas a cena se repete. Alguns olhos extravasam o pavor como se a qualquer momento viesse o pior. Veículos acelerando rumo às distantes responsabilidades, que ficam além dos gritos dos vendedores ambulantes, dos táxis-lotação e dos mendigos que defecam a luz do dia no trevo da rodoviária.



Pessoas sujas e maltrapilhas pedindo ajuda para comer, outras querendo comprar remédios com receitas que trazem o nome do medicamento que não condiz com a patologia. Ainda aqueles que querem comprar passagens, talvez querendo fugir do pesadelo em que se transformou o sonho de morar na capital. Esta que, em 1893, começou a ser projetada sob as articuladas teorias do engenheiro Aarão Reis,



E que, como em toda a trilha das evoluções dos povos, para que o progresso possa seguir seus passos é preciso exterminar alguns indícios da história, aconteceu com o Curral Dell Rey, que foi literalmente demolido.



Da janela do quarto andar do aconchegante quarto do Ambassy, passei horas tentando entender aquele formigueiro humano, passando pelas ruas nos sinais que cruzam a Afonso Pena, me senti até meio voyeur, invadindo a privacidade daqueles incontáveis transeuntes, indo e voltando para onde não poderia fazer idéia, trajes brancos que sugeriam hospitais e similares, ternos e gravatas e outras infinidades, praticando a mesma ação de esperar o semáforo enverdecer e correr juntos, como se todos seguissem para o mesmo lugar, outras vezes no retardo de milésimos de segundo, todos invadem a faixa e correm desesperadamente ao outro lado. Não vão para o mesmo lugar, mas o destino é um só, a sobrevivência.



Olhando para cima no prédio em frente, contei quase trinta andares, sentindo um suor brotar na palma das minhas mãos, e uma sensação impotente, imaginando um surto psicótico, me fazer testar meus poderes sobrenaturais que me são dados ao iniciar meus sonhos no sono.



Pensei no Homem Aranha, como é corajoso aquele cara, que se atreve a atirar sua teia e balançar até o outro prédio, que me parece todo azulejado. Recordei os meus tempos de criança, quando possuía o poder da vontade, e pedi a um santo de que não me lembro o nome, para ser picado por uma aranha, como aconteceu com o Peter Parker, nossa! Seria um fiasco um homem aranha com medo de altura. Bem, pelo menos sei que não vou mais sonhar em escalar prédios.



A cidade de Aarão nos dá exemplo nos pontos de ônibus, onde são formadas filas para a entrada nos coletivos, educadamente obedecidas. Não vimos empurra-empurra, como acontece nos nossos. Presenciei um cobrador do ônibus 4103 que pegamos de Mangabeiras ao Centro, descer para ajudar um deficiente físico que, como milhares de outros, não tem o respeito de direito nas adaptações dos meios de locomoção. Pensei nos nossos portadores de deficiência, que ainda não merecem por parte dos cobradores e motoristas daqui a mesma atenção. Perdoem-me se alguns já praticaram esse ação cidadã, mas eu nunca vi.



Assim foi a minha reflexiva estada em Belo Horizonte, terra do Cruzeiro Esporte Clube e do meu ídolo Alberto da Veiga Guignard. Foram dias para revisão na cirurgia do meu pequeno astro Airon Augusto. Uma viagem que começou quando embarcamos na plataforma G, à zero hora. Na rodoviária de Montes Claros, pouco antes da partida, houve um princípio de contenda com a empresa que vendera a mesma poltrona a duas pessoas, a número 03. Uma das passageiras, um pouco mais instruída, expressou termos legais de direitos do usuário. Achei um absurdo a forma como foi resolvido: a primeira que já estava no ônibus cedeu a janela e foi no corredor, dizendo não gostar de bater boca.



Na parada de Maquiné, outra passageira levantou a voz, reclamando que o ar havia sido desligado e não aceitava entrar novamente, se o caso não se resolvesse. Resultado: os quinze minutos previstos na parada foram quase quarenta. Ainda com o direito da porta do motorista que dá acesso ao interior do ônibus ir aberta por um longo trajeto. A empresa dos ônibus azuis deve desculpas.

Compartilhar
E-MAIL:jornalismo@onorte.net
ENDEREÇO:Rua Justino CâmaraCentro - Montes Claros - MGCEP: 39400-010
O Norte© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por