Márcio Adriano Moraes
Professor de Literatura e Português
A casa cheia, amigos e familiares juntos para celebrar uma passagem de ano. Estranho dizer passagem de ano e mais estranho ainda é dizer ganhar um ano. Na verdade nós não ganhamos ano nenhum, mas perdemos. A cada ano que se passa aproximamos da indesejada da gente. E assim vamos vivendo ansiando algo que evitamos confirmar, mas esta é a verdade; todos caminham para o fim.
Por isso, o importante na vida é celebrar todos os momentos, sejam ímpares ou pares. Não há vida tão longa capaz de abraçar a todos nem tão curta incapaz de estender uma mão. É preciso apreciar cada instante, até os mais doloridos, como etapas de crescimento humano. E não importa quantas caras feias apareçam no caminho, devemos sempre sorrir e mostrar àqueles que nos olham torto que nosso mento é reto.
As fotografias trazem saudade, relembram amizades e ressuscitam entes queridos. Ao som de uma bela melodia, tudo o que se quer pode ser realizado, ainda que no sonho sereno da imaginação humana. As palavras carinhosas ditas por quem se ama são ânimos para continuar a caminhada terrena. Sem as palavras humanas úmidas e verdadeiras que escapam das bocas dos que nos rodeiam, tornamo-nos solos secos e infrutíferos para a vida. Bom é ouvir coisas boas daqueles que nos amam. Bom é ouvir verdades verdadeiras, não fingidas. Cansamos de deixar os nossos ouvidos serem poluídos com dizeres enganosos e interesseiros.
Assim, entre passado e presente, vivencia-se a passagem de anos ou, como querem alguns, os ganhos deles, ainda que sejam perdas. Momento de ser celebrado com a mais genuína manifestação do sentimento humano, a poesia. E como é bom atrelar poesia a música. Como é bom ser o seu poeta e ser o seu cantor. Ouvidos atentos e rostos repletos de lágrimas acolhem no âmago sentimentos amadoristas. Ocultadas teclas ressoam sons que melindram a alma de todos os presentes, menos as almas daqueles que se fecham em seus mundinhos e esquecem a estrada percorrida. Entra em cena a homenagem e se vão seres sem ramagens, que se escondem em si mesmos, irados pela felicidade alheia. Alheio a tudo, o peito aberto ao amor reverbera versos e solos, não com o intuito de enaltecer, mas com o propósito de amores fazer crescer.
Registra-se tudo com os flash’s tecnológicos. Feliz daquele que inventou esse instrumento que faz o tempo parar. Não podemos voltar ao passado, uma vez que tal tempo não existe no mundo real, apenas na lembrança abstrata da mente. Mas pedaços de papel ou imagens virtuais móveis ou não salvam a amnésia. Gestos simples, apertos frágeis que tornam o instante perpétuo.
Destruir recordações humanas talvez seja um dos gestos mais terríveis praticados por seres humanos. O defeito do homem é só enxergar com seus próprios olhos. O dia em que ele conseguir ver com outros olhos que não sejam os seus, verá então que o mal que percebe é o bem que outro almeja. E não há mal em poesia e música, não quando são feitas com os mais benéficos sentimentos humanos. E não há mal em querer registrar e guardar para sempre isso.
E que todos os anos sejam celebrados com depoimentos sinceros, imagens verdadeiras, poesias e músicas genuínas. E que todos possam lacrimejar, pois felizes são os que choram com o bem. E que um dia possamos ver, ainda que dolorosamente, que não temos o direito de podar a felicidade daqueles que amamos nem dos que nos são indiferentes. Todos têm o poder de fazer e serem felizes.