Dois dedos de prosa

Jornal O Norte
09/12/2009 às 09:07.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:19

José Wilson Santos


zewilsonsantos@hotmail.com

Receio ter sido elevado à condição de formador de opinião. Tive acesso há pouco tempo à ficha completa de dona Dilma Vana Rousseff no temido Dops, organismo que ajudou a ditadura a passar feito rolo compressor sobre a insurreição popular, que chegou a pegar em armas pelo estado de direito, nos anos de chumbo.

Dona Dilma, ao que parece, foi aguerrida militante de esquerda. Foi à luta num tempo em que muita gente preferiu cruzar os braços, esperar para ver cumé que ficava. O que não é novidade nenhuma. Muita gente espera ainda hoje, de braços cruzados e em cima do muro, pra ver como é que fica.

A ficha de dona Dilma no extinto Dops existe há trocentos anos, mas só agora, à véspera de uma eleição presidencial da qual ela parece ser candidata com alguma chance, seu curriculum de ativista nos está sendo mostrado.

Não conheço dona Dilma, senão por fotografias em jornais, e até então só sabia que ela é meio conterrânea (já que sou meio mineiro) e que está metida num quiprocó a respeito de sua formação superior. Portanto, não estarei sob suspeição ao lembrar que seu passado de esquerdista, nos temidos anos de chumbo, não a impediu nem impede de dar importante contribuição ao governo e, por extensão, à nação.

A disponibilização neste exato momento das informações sobre a militância de dona Dilma àquela época, é mais uma amostra de como organismos do sistema partem para o massacre de quem tem idéias e conceitos capazes de gerar mudanças. E tendem a achar que somos mais babacas do que parecemos.

Mas o assunto vem a calhar na defesa da tese de que até a violência física que nos acomete no dia-a-dia, nas maiores e nas menores cidades do país, reflete o interesse deliberado do sistema. A violência, que diante da falta de respostas à altura se propaga feito erva daninha, só atinge, via de regra, o cidadão comum, como demonstram fartamente os números. Talvez por isso esteja longe de provocar mudanças.

Daí esse estado de coisa — em que pesem as dores e os lutos provocados — não vir merecendo maior preocupação do sistema. Ao contrário das idéias, que são capazes de mudar o status quo, a vida de muita gente.

Se a violência que nos amedronta e nos empurra cada vez mais pra traz de muros que parecem fortalezas, fosse de idéias, certamente o sistema já teria dado um jeito nela.

Ele fez isso nos anos de chumbo, quando saiu à caça do pessoal de esquerda, inclusive se embrenhando nas florestas. Localizou, prendeu e neutralizou gente muito mais esperta que Marcola, Beira Mar e tantos outros que comandam o crime organizado das vielas dos morros ou de dentro de presídios de segurança máxima.

Ora, quando lhes interessa as tevês e os jornais localizam, entrevistam e exibem o crime organizado até em suas entranhas. Se jornalistas podem fazer isso, porque o sistema não consegue por a mão e neutralizar esses caras que disseminam a violência?

Lógico, porque isso ainda não interessa ao sistema. Talvez seja necessário tanta bala e bandidos perdidos por aí, matando e infernizando as vidas das pessoas, para que a grana do contribuinte em cuecas e meias pareça coisinha à toa, inofensiva, mero gesto de esperteza por parte de quem está no lugar certo, na hora certa e à sombra do sistema.

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