Domingos X. Teixeira
e Liliana Arlete Cordeiro *
Os jornais têm publicado, nos últimos dias, uma série de notícias envolvendo corrupção com o dinheiro público repassado para institutos, associações e ONG´s. Um número ainda não mensurado de entidades - mas bastante grande para motivar a abertura de uma CPI -, estaria recebendo recursos de órgãos dos governos Federal, estaduais e municipais e desviando-os por meio de uma infinidade de mecanismos fraudulentos.
A investigação de desvios de recursos públicos é sempre da mais alta relevância, mas é também importante separar “o joio do trigo” para não enfraquecermos todo um setor que ocupa, atualmente, papel destacado em nossa sociedade, seja empregando pessoas, praticando atos de natureza humanitária ou trabalhando em prol da preservação do meio ambiente.
Poucas informações consolidadas se encontram disponíveis sobre essas organizações. Todavia, um levantamento sumário em sites especializados mostra a existência de quase cinco mil entidades mais relevantes.
Essas instituições são conhecidas como ONG´s – Organizações Não Governamentais -, titularidade utilizada para designar as fundações, as associações e as cooperativas sociais sem fins lucrativos criadas pela Lei 9.867/99 e que constituem o chamado Terceiro Setor. Os recursos aplicados nessas instituições e associações vêm dos mais variados setores, através do repasse direto de dinheiro público, da utilização de incentivos fiscais de empresas e de doações feitas por entidades estrangeiras.
O papel exercido em nossa sociedade por essa nova indústria é de tal importância que a Constituição Federal e o Código Civil lhe dedicaram especial atenção. A Constituição vedou à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios o direito de instituir impostos sobre patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos.
A principal razão para a constituição de “associações” decorre do direito das pessoas se organizarem como entidades de fins não econômicos e lícitos. Além de assegurar o direito do associativismo, a Legislação impede que o Governo interfira indevidamente nos atos de sua gestão. Dessa forma, a Constituição deu um tratamento especial às associações ao considerá-las como uma forma de prestação de serviços de natureza social. O Código Civil de 2002 veio complementar as normas constitucionais e definiu “associação” como sendo “(...) união de pessoas que se organizem para fins não econômicos (...)”.
As “fundações” se originam de um patrimônio vinculado a um objetivo de interesse coletivo e sem fins lucrativos. O art. 62 do Código Civil estabelece que “(...) para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la”.
Já as “cooperativas sociais” têm como finalidade inserir as pessoas em desvantagem no mercado econômico por meio do trabalho. Tal inserção fundamenta-se no interesse geral da comunidade em promover a pessoa humana e a integração social dos cidadãos, e incluí-las entre suas atividades.
Existe hoje uma confusão generalizada sobre o significado das mais variadas nomenclaturas que tais entidades recebem (OSCIP, OS, UP, CEAS e CEBAS) e quais são as obrigações legais e os benefícios previstos para cada uma delas. Na realidade, essas siglas nada mais são do que títulos e qualificações que o Governo concede às associações e fundações que se enquadram nas exigências de leis especificas. Ou seja, uma associação ou fundação, desde que suas ações e estatuto preencham os requisitos da lei, podem ser qualificadas ou receber os títulos de Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), de Organização Social (OS), de Utilidade Pública (UP) e o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEAS ou CEBAS).
As organizações sociais recebem inúmeros benefícios de acordo com o título que possuem, com destaque para o Contrato de Gestão e os Termos de Parceria. Aplicar recursos nessas entidades pode permitir ao doador usufruir de certas vantagens, principalmente na área fiscal.
Como estamos vendo, o Terceiro Setor é muito importante. Mas como separar o “joio do trigo”? O caminho nos parece ser o de obrigar as instituições a realizarem revisões trimestrais em seus balanços e os auditarem anualmente através de auditores independentes e registrados na CVM - Comissão de Valores Mobiliários. É relevante também, publicar os balanços na rede mundial de computadores e lá mantê-los durante cinco anos, prestando conta à sociedade sobre os recursos recebidos. Adicionalmente, o Governo Federal deveria criar uma entidade de fiscalização de todas as ONG´s do estilo da CVM, com diretores escolhidos pelo Presidente da República, mas submetidos à aprovação do Senado Federal. Afinal, essas entidades são de interesse público, em virtude de a maioria estar gastando recursos de impostos pagos pelo povo do Brasil.
* Especialistas na área do terceiro setor, membros do Instituto Brasileiro de Direito Tributário e Societário