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Sábado,8 de Fevereiro

Confesso que vivi

Jornal O Norte
Publicado em 20/04/2010 às 10:44.Atualizado em 15/11/2021 às 06:26.

Alberto Sena



Itamaury Teles envia mensagem dizendo que as horas-dançantes da “boate” da Praça de Esportes eram realizadas das 11h às 13h de domingo, depois da missa, para garantir a presença das “moças do internato do Colégio Imaculada Conceição”.



Há até uma lógica nisso. Aos domingos, as freiras permitiam a saída das internas a fim de passearem pela cidade, irem às matinês etc. E elas saíam como bichinhos de madames. Quando presos por muito tempo, ao saírem os bichinhos esbanjam vitalidade e inquietação.



Teles viu “saudosismo” da minha parte ao pintar a Praça de Esportes daquele tempo. A ele e a quem mais interessar possa, digo: “cronico” a memória não porque gostaria de voltar a viver o tempo de antanho, e muito menos ainda para estimular o tal sentimento de saudade. Isto nada tem a ver comigo.



Tenho tentado, aqui, pintar, mesmo não tendo o dom, um quadro de Montes Claros onde eu – e muitos outros que comigo viveram aqueles tempos – fui feliz e sabia. Mas não tenho saudades.



Acho, o dramaturgo Nelson Rodrigues tem razão quando diz: “jovens, envelheçam, envelheçam”.



Hoje sou feliz e sei, apesar das agruras vividas e do sofrimento alheio visto ao redor. Não reclamo da vida. E se alguma vez reclamei e se alguma vez reclamar, não será em causa própria, tanto é o sofrimento aqui e alhures.



Confesso: não estou satisfeito com o mundo tal qual é. Se dependesse de mim para mudá-lo, tudo já estaria às mil maravilhas. Mas sou como o beija-flor: levo água no bico e procuro fazer a minha parte para debelar o incêndio na floresta.



O sofrimento padecido por bilhões de almas no mundo é causado pelo próprio homem. O egoísmo é a raiz de todos os males, os sofrimentos, os pecados.



Mas só o fato de estar vivo, podendo comunicar com os outros, já é motivo de felicidade. O fato de se estar em paz, com saúde, isto também é motivo de felicidade. Ser feliz 100% é impossível. Vivo os momentos de felicidade.



Enquanto vivi em Montes Claros tive muitos, mas muitos momentos de felicidade. Como por exemplo: frequentar a Praça de Esportes, as horas-dançantes na “boate”, no Clube Montes Claros, no Automóvel Clube; as idas e vindas ao Pentáurea, ao MaxMin e à Lagoa da Barra; as incursões ao Redondo, ali próximo do aeroporto; aos goles no Vixe e na A Cristal; aos comes e aos bebes nos restaurantes Mangueirinha e Espeto de Ouro; as idas ao Parque de Exposição, ao Parque Municipal e à Lapa Grande; as visitas à sapataria de Tião Boi e à oficina de Bonga; as partidas disputadas pelo juvenil do Casimiro de Abreu; as investidas à porta do Colégio Imaculada Conceição para namorar e espiar as garotas e com elas trocar olhares...



Foram momentos de felicidade que este montesclaros.com fica pequeno para relembranças tantas. Mas sem saudosismo. Sem nostalgia. E muito menos banzo. Como diria Pablo Neruda, no livro “Para nascer nasci”, eu, particularmente, “confesso que vivi”, em Montes Claros.



Vivo muito mais hoje. O passado passou e o futuro virá, certamente. O importante é plantar agora. Porque tudo que se planta, se colhe. Então, semeemos boas sementes, classificadas, livres de pragas. Quem planta arroz, não colhe feijão.



Com sinceridade: não gostaria, por exemplo, de voltar aos meus 20 anos. Estou satisfeito com a idade atual. Sinto-me muito mais lúcido, com mais maturidade para refletir sobre o viver, e, sobretudo, consciente da minha insignificância perante o Criador do Universo e também perante o semelhante.



Nada melhor do que avançar em idade para compreender mais essa coisa maravilhosa chamada vida. E agradecer por ainda estar vivo. Entretanto, em sã consciência, convicto estou: não sou daqui. Estou de passagem. E quando chegar o momento de ir embora irei; sem temor. Tenho fortes suspeitas: vive-se melhor não aqui, mas para onde irei.



E para onde irei? Não sei. O importante, enquanto aqui estou, é semear e estimular a fé. Já se disse: “a esperança é a mãe da fé”. A comunicação com Deus se dá por meio da fé. Depois, quando se vai desta para outra – melhor, espero – não se precisa mais da fé.



Só a caridade permanecerá, porque a caridade e o amor são a mesma coisa.

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