A malhação do Judas foi um movimento folclórico acontecido, a bem da verdade, em todas as práticas judaicas que se desencadearam ao longo da idade média, apoiadas nas diversas etapas da Inquisição: a primeira delas, a que se relaciona sobre a Serração da Velha e outras que eram a nova ordem monástica da religiosidade. Etimologicamente, o nome inquisição deriva do verbo latino “inquirere”, ou seja, inquirir e foi adotado apenas como um processo penal instalado pelo Papa Lúcio III (1181-1185) e adotado pelo Papa Inocêncio III (1198-1216), bem como pelo Papa Sínodo IV, de Latrão, (1215).
A queimação de Judas era um processo inquisitorial que compreendia a visitação ou a inspeção do inquisidor, com denúncia e citação dos suspeitos, em audiência das testemunhas, defesa dos advogados, vexação e tortura nos autos-de-fé e exame de apelo ao Papa. Do cenário real, o espetáculo foi passado e repassado para o teatro de arena e ganhou o mundo no fantástico show da vida.
O costume da Malhação de Judas veio para o Brasil. Aliás, era comum a influência das atividades religiosas em nossa terra, desde os primeiros dias do descobrimento até os dias de hoje. A Igreja Católica determinava o que era diversão e o que não era. Entretanto, no Brasil, a Malhação de Judas ganhou uma nova performance, tanto nas vilas e arraiais e, principalmente, na região Nordeste, transitando do sério para o campo da algazarra.
A Malhação ou a Queima de Judas Iscariotes é uma tradição vigente em diversas comunidades católicas e ortodoxas que foi introduzida na América Latina pelos espanhóis e portugueses. É também realizada em diversos outros países, sempre nos dias de Sábado de Aleluia, simbolizando a morte de Judas Iscariotes. Este ato religioso consiste em surrar um boneco do tamanho de um homem, forrado de serragem, trapos ou jornal, pelas ruas de um bairro e atear fogo a ele, normalmente ao meio-dia.
O Testamento do Judas é a parte mais interessante da brincadeira, pois nele é possível identificar as pessoas mais incomuns de uma comunidade. A simples leitura do Testamento arranca risos e, às vezes, muitos aborrecimentos – que nunca se cicatrizam. Para ilustrar, transcrevo aqui o que ocorreu no ano de 1976, em Rio Pardo de Minas, um testamento que foi coletado por Edson Paulino Cordeiro, onde constavam os nomes de dona Raimunda, da magrela Gessy, Maçola, Zé Alfredo, Tonão do Posto, Miguel, dona Alzira, Gerolino, entre outros.
“Deixou uma garrafa de catuaba/ para os velhos Zeca e Altino/ uma prefeitura velha/ para o Edson Paulino”. (Queimação de Judas – Ático Vilas-Boas da Mota).
Nota-se que, a malhação de Judas é uma brincadeira que tem causado muitos aborrecimentos, pois trata-se de uma vingança dos católicos sobre a traição de Judas a Jesus Cristo. Sabe-se que Judas suicidou-se enforcado em uma árvore, por isso é comum o costume de enforcar o boneco, mas antes é preciso ele levar umas pauladas e ser muito xingado pela plateia. As pessoas responsáveis pelo boneco do Judas põem ele em frente a uma residência e ali mesmo já faz a leitura do seu inventário. É um momento inesquecível. Entretanto, para alguns que não gostam da brincadeira é solicitada a exclusão do nome no Testamento. Quando não acatado o seu pedido, o ofendido costuma trazer um urinol cheio e, sem piedade, sacudir o seu conteúdo sobre as cabeças dos atrevidos.
Eu me lembro, com muita saudade, dos meus tempos de menino levado. Correr atrás do Judas era uma diversão de todas as crianças de minha idade. Em Guanambi, a queima de Judas sempre acontecia à noite e reunia uma multidão de admiradores. Ainda, hoje, me lembro da alegria contagiante do meu pai quando ele colocava fogo no boneco de pano. Ave! Judas Iscariotes!