Concluir a leitura do livro de Cid Mourão: “Lá no Pé da Serra”, em dois volumes, onde o autor conta os causos mais engraçados e curiosos deste nosso querido sertão norte-mineiro, que tanto o amamos de montão. Com pouquíssima diferença da escrita do eterno seresteiro, Cândido Canela, pela sua forma catrumano e pela sua leveza e beleza nas paisagens desenhadas pela imaginação de seus leitores, pode-se dizer que a literatura de Cid Mourão tem no coração o sangue do sertanejo euclidiano e na alma o bálsamo como sedativo para matar saudades de um tempo que nunca mais vai voltar. Felizes os que têm a oportunidade de falar com ele sobre o seu “pé de serra onde o redemoinho fáiz rodopio, onde o bão cabrito num berra e o rego d’água vira rio”. Pois é assim que a poesia matuta de Cid Mourão vai velejando vagarosamente pelas curvas vicinais do vento para depois se esconder sorrateiramente por detrás dos vales verdejantes.
Cid Mourão teve uma passagem brilhante pela Rádio Sociedade ZYD-7, como locutor de programa-de-rádio. Mas, infelizmente, o seu trabalho ainda não teve o reconhecimento que deveria ter tido desde então. Acreditamos a isso, por se tratar de uma pessoa simples, educada e, acima de tudo honesta, ele tem sido ignorado dos holofotes literários das academias. É que a sociedade em geral, mergulhada na ignorância dos fatos históricos, preocupa apenas na valorização dos homens abastados de bens materiais e de prestígio político, pois são esses, para a imprensa, os merecedores de reconhecimento e honrarias. Os homens bons nunca serão lembrados. Jamais! Por outro lado, podemos afirmar que a ingratidão de um povo apenas contribui para deslustrar o passado glorioso das pessoas qualificadas. É o preço que pagamos pela nossa incapacidade de conduzir a esperança com a expectativa necessária para tanto.
Assim, os membros do egrégio Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, preocupados com o resgate e a conservação dos fatos históricos de nossa cidade, reunidos em lugar próprio de sua sede, decidiram publicar os saltérios de Cid Mourão. Não se trata a sua influente obra somente de um feixe do gênero cordelista, haja vista a existência dos versos poéticos neste sentido. Não! Na verdade, o leitor inusitado vai perceber que a sua prosa tem momentos especiais que encantam e que fascinam as pessoas. Observa-se, também, que a leitura é agradabilíssima, entretanto, ouvir de viva voz os causos contados aqui pelo autor, com os ritmos dos temas regionais norte-mineiros, não tem preço. Cid Mourão é, como se fosse, o nosso saudoso Rolando Boldrin ou, talvez, um participante despercebido da dupla Chico Pitanga e Mané Juca na lembrança dos mais antigos. Nos microfones da Rádio Sociedade ZYD-7 dizia o ilustre apresentador com extrema delicadeza bem assim...
“Lá no meu pé de serra pode ser um desses povoadozinho escondido detrás do morro, um descampado de mato rasteiro, uma paisagem verdejante ou ressequida, um ranchinho solitário à beira do caminho, um semblante triste a espiar da janela, um galo contando na quietude da tarde, um carro de boi riscando a poeira do chão, um passarinho saltitando no alto da palmeira a dar boas-vindas ao viageiro que passa; Bem-te-vi! Uma cabo0clinha vassourando as folhas caídas a cantarolar: Sabiá fugiu pro terreiro, foi morar no abacateiro, vem cá, sabiá, vem cá...”
A magia do estilo cordelista tem o poder de encantar os leitores, desde os mais simples aos mais eruditos, basta ver que a beleza dos causos contados, em viva voz, supera a angustia da cruel saudade e libera o ânimo da conquista desejada. Parabéns, Cid Mourão, por você ter dedicado com tanto carinho e zelo, o necessário resgate das tradições seculares do nosso povo e de nossa terra. Parabéns e o nosso amplexo!