Wendell Lessawendell_lessa@yahoo.com.br

Quando o perdão abre as portas e a humildade constrói pontes

Publicado em 09/07/2025 às 21:28.

Vivemos dias em que a ofensa é fácil e o perdão é raro. Palavras são ditas com pressa, julgamentos são feitos com dureza e relações são rompidas por motivos pequenos que vão se tornando grandes diante do orgulho ferido. Em meio a esse cenário, duas virtudes tão antigas quanto necessárias parecem esquecidas: o perdão e a humildade.

O perdão não é um sentimento natural. Nossa inclinação humana, desde o Éden, é guardar mágoas, alimentar o ressentimento e proteger nosso ego como se ele fosse um bem sagrado. A humildade, por sua vez, não é fraqueza, mas força domada. É a capacidade de olhar para o outro sem superioridade e reconhecer que, assim como ele, também somos falhos.

A Bíblia — esse livro milenar que atravessa culturas e gerações — oferece uma sabedoria que ainda hoje pode transformar vidas e curar relações. Jesus, em uma de suas declarações mais desafiadoras, ensinou: “Se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará; se, porém, não perdoardes aos homens, tampouco vosso Pai perdoará as vossas ofensas” (Mateus 6.14-15).

Não se trata apenas de uma exigência religiosa, mas de um princípio de vida: quem não aprende a perdoar vive acorrentado ao passado, preso às feridas que insiste em remexer. O perdão liberta — tanto quem é perdoado quanto quem perdoa.

Mas por que é tão difícil perdoar? A resposta está no orgulho. É o orgulho que exige reparação total antes de qualquer reconciliação. É o orgulho que diz: “Eu jamais faria o que ele fez”. É ele que nos impede de dar o primeiro passo, mesmo quando o silêncio já virou abismo.

É aí que a humildade entra como remédio. O apóstolo Paulo, escrevendo aos cristãos de Filipos, orienta: “Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo” (Filipenses 2.3). Essa humildade cristã não é autodepreciação, mas disposição de valorizar o outro, mesmo quando falha.

Nos relacionamentos — sejam familiares, conjugais, de amizade ou de trabalho — perdão e humildade são como as duas pernas de quem deseja caminhar rumo à paz. Sem uma delas, tropeçamos.

Quantas famílias vivem hoje separadas não por grandes tragédias, mas por pequenas mágoas nunca resolvidas? Um mal-entendido, uma palavra atravessada, uma decisão impensada… e, de repente, o que era amor se transforma em silêncio hostil.

Em muitos lares, irmãos não se falam há anos. Casais dormem sob o mesmo teto, mas em mundos diferentes. Pais e filhos coexistem, mas não se ouvem nem se tocam. O que falta? Muitas vezes, apenas um gesto de humildade: “Me perdoe, eu errei”.

Perdoar não significa aprovar o erro, nem esquecer a dor. Significa decidir não carregar o peso do rancor. É tirar o outro da cadeia emocional onde o prendemos e, mais ainda, sair da cela que nós mesmos construímos. O perdão é uma escolha, não um sentimento. E, quando praticado, tem o poder de quebrar ciclos de dor que se repetem por gerações.

Jesus contou uma parábola sobre um servo que foi perdoado de uma enorme dívida, mas se recusou a perdoar a pequena dívida de outro servo (Mateus 18.21-35). A lição é clara: quem entende o quanto foi perdoado por Deus tem muito mais facilidade em perdoar o próximo. Afinal, se Deus, que é justo e santo, nos perdoa, quem somos nós para negar perdão a alguém?

A humildade também se manifesta em saber ouvir. Nem todo desentendimento precisa terminar em confronto. Às vezes, o silêncio sábio evita a palavra ferina. Provérbios 15.1 nos lembra: “A resposta branda desvia o furor, mas a palavra dura suscita a ira”.

Como o mundo seria diferente se todos praticássemos o perdão e a humildade no cotidiano! Imagine o impacto disso nas redes sociais, nos relacionamentos políticos, nas relações raciais, nas diferenças ideológicas. O respeito mútuo nasce da humildade; o diálogo construtivo brota do perdão.

Vivemos tempos polarizados, mas talvez a solução para tantas crises não esteja apenas em reformas políticas, protestos ou novas leis. Talvez comece em algo mais simples e profundo: um pedido de perdão genuíno, uma palavra de reconciliação, uma disposição humilde de ouvir e ceder.

Não há relacionamento duradouro sem perdão. Não há paz sem humildade. Perdoar é dar ao outro o que ele não merece — assim como Cristo nos deu o que não merecíamos. E ser humilde é lembrar que, se hoje estamos de pé, é porque alguém nos sustentou com graça.

Para quem lê estas linhas com o coração ferido, o convite é simples e profundo: comece onde está. Ore por quem te feriu. Dê um passo na direção da reconciliação, ainda que pequeno. Se necessário, escreva uma carta, mande uma mensagem, estenda a mão. O perdão não garante que o outro mude — mas garante que você será livre.

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