Lavar roupas era com Senhorinha, mulher bonita, de cabelos loiros e olhos azuis, assentada na classe média, com uma dúzia de filhos. Seu maior orgulho era lavar a roupa da família com o coração de mãe devotada e uma escova em suas hábeis mãos. Para ela, lavadeira é aquela que lava roupas com as mãos, seja no tanque seja na bacia. Raramente foi socorrida pelo tanquinho ou máquina de lavar. Havia na semana um dia específico para esse trabalho, que ela tanto prezava e começava ao raiar do dia. Contava orgulhosa que, ao final da manhã, era com alegria que olhava o varal com duas dezenas de calças jeans, usadas pelos homens da casa. Ao mesmo tempo em que se sentia vitoriosa com esse feito, lamentava a falta de tempo para fazer outras coisas. Em moça, fora belíssima, mas a filharada e sua entrega aos afazeres domésticos encolheram seus dotes físicos. Sua bandeira eram as calças jeans secando ao vento e seu imenso trunfo era ter do que reclamar aos filhos: excesso de roupa suja.
O tanque de lavar roupas é uma trincheira feminina. “Lava roupas todo dia, que agonia” disse Luiz Melodia, e, lavando roupas em rios, casas e hospitais, mulheres sustentaram seus filhos e a si. Vida dura de mártires do serviço pesado numa profissão desvalorizada.
No Brasil, apenas 8% dos homens lavam a roupa da família, mas muitos lavam suas próprias roupas. Na Índia, uma raridade aqui no Norte de Minas, homens lavadeiros são comuns às margens do rio Ganges, tão sagrado quanto poluído. O fotógrafo Manoel Freitas apresentou duas fotos de lavadeiros em beira de rio. Já Sérgio Mourão, também fotógrafo, capturou uma imagem masculina dentro do rio, porém é um marido que conduz a esposa ao trabalho. Desafiado, procurará lavadeiros.
Ficar dentro d’água por muitas horas, até a pele enrugar, lavando roupas, é uma penitência. Os tapetes formados por roupas coloridas estendidas por sobre as pedras para quarar ou secar, com sua paleta de cores, geralmente em tons alegres, longe estão de sugerir o sofrimento dessas mulheres cantantes, que espantam seus males entoando canções. Lavar roupas é, além de reduto feminino, a última fronteira a ser invadida pelos homens. Permanece quase impossível ver homens lavando roupas para fora.