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Quinta-Feira,19 de Setembro

Charles e Carlos, agora irmãos de acordes, de palco e de vida: show De trem pra Montes Claros consolida união de dois grandes nomes de nossa música

Jornal O Norte
23/09/2005 às 11:38.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:52

Eduardo Brasil

Curtir o show de Charles Boavista e Carlos Maia, De Trem pra Montes Claros, no Tom da terça, no Centro Cultural, com a participação de Batuta, no baixo, e Zuba, na percussão foi, literalmente, uma viagem, das coisas boas - boas não, ótimas -, que me assaltaram nesta semana.

Charles e Carlos resgataram pérolas de um repertório que matava a gente de saudade, remanescente das estações em que os dois ainda não se haviam cruzado pelas estradas da música, combinado a composições recentes que inauguraram uma parceria que se vislumbra duradoura pelos trechos que ainda percorrerão juntos nessa sina de artista, intercalado por clássicos da música popular brasileira e regional.




(Foto: Renato Lopes)

Quanto ao Charles, é muito bom tê-lo de volta como nos velhos tempos do Grupo Raízes. Sim, porque, que o diga Raquel Mendonça, anos atrás o moço andou alheio à estirpe à qual pertence.

Por um tempo Charles fugiu à sua linhagem - e a música que o identificou país afora desde que trocou Montes Claros por São Paulo e Belo Horizonte, nos idos dos anos de chumbo, parecia guardada pelas chaves do passado. Para espanto de Raquel, o artista, de volta ao sertão décadas depois, então travestido de barnabé, chegou até a montar uma banda - Diamante negro - para reviver embalos da jovem guarda debaixo da lona de um circo de periferia da prefeitura municipal.

Nada contra Roberto, Erasmo, Os Vips, Jerry, Martinha, Ternurinha, Vanusa, circo, periferia, sou amarradão nos picadeiros, nesses arrabaldes e nessa moçada jurássica - e acredito que Raquel também, mas bom mesmo foi ver o Charles Boavista de volta, que Raquel não viu, numa boa, inteiro, em forma, numa festa de violeiro com a sua cantoria de fogueira, sua sereia Iara que levou Zeca de Creusa para o fundo do açude encantado numa noite de São João, com o sonoro do seu desentoado que nos confere a identidade de fruta do norte, de boi de corte no curral, de água de enxurrada, de pau preto no pé da serra.

Foi bom ter de volta o Charles das assombrações penadas e da poeira que se assenta com o galope da montada que cruza porteiras pelo chão de Brejo das Almas, levando no dorso suado pelo sol do meio dia gente feliz pra feira no largo do mercado - onde se compra cigarro de papel, vestido pra Das Dores -, do seu pé de jenipapo que guarda a pedra na qual escreve o nome de Ângela e, finalmente, ter o Charles na estrada que nos remete a um misto de dor e alegria, dizendo não se esquecer em outras paragens do seu berço grotão. Da sua terra perdida no meio da chapada. E que, no mês que vem, com fé em Deus, volta de trem pra Montes Claros - pois afinal caminho é por onde se passa.

Bom demais, também, foi ver o Charles ao lado de Carlos Maia. Maravilhoso. Dono de uma experiência que poucos acumulam, Carlos Maia é um menestrel das gerais. Cantador nascido em Bocaiúva, de grande talento, é o parceiro que Charles há muito procurava. E Charles, o parceiro que ele buscava.

Pois é, a irmandade musical que une os dois é uma dádiva. Não seria exagero dizer que musicalmente um nasceu para o outro. No mínimo, Charles e Carlos são irmãos. Irmãos de fé, de acordes, de palcos, de vida.

De uma longa vida...

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