Por Patrícia Gomes
Quase 2500 quilômetros de uma estrada pouco conhecida que liga Belo Horizonte, Minas Gerais a São Luís, Maranhão. Em três dias, algumas impressões.
Vento quente, sempre quente, às vezes sufocante. Um sem número de pontes sobre o que um dia foram riachos e agora são caminhos secos de terra. Outro tanto de rios desidratados e assoreados, que resistem ao calor e à falta de chuva. Paus de arara abarrotados são transporte quase oficial, o Código Nacional de Trânsito parece até legislação morta.
As motos se reproduzem pelo caminho e motoqueiros carregam no veículo uma montanha de gente. Um desafio às leis da física. Se dá pra empilhar, vamos carregar! Todos sempre sem capacete, artigo de luxo por essas bandas. Também sem proteção alguma, as crianças são espremidas entre os pais, muitas já aprenderam aos dois, três anos de idade a proteger da poeira o rosto com as mãos.
A vegetação é vermelha como a terra esturricada que mais parece areia colorida. Empoeiradas também são as pessoas que caminham no meio da pista sem se incomodar com os escassos veículos que cortam as retas intermináveis. A terra é castigada pela seca. Cavalos não há, o asfalto é caminho de bodes, jumentos e porcos. A boiada interrompe a viagem de quando em quando e tem sempre a preferência - quem há de questionar.
Os homens observam com curiosidade a mulher forasteira que pede informações de dentro do carro. Famílias inteiras se sentam diariamente à porta de casa, como se assistissem a TV, aguardam a passagem de mais um caminhão e para fugir do calor, desfrutam do vento produzido pelo veículo às pressas.
Se a cidade se chama Cocos, não tem plantação de coco, se se chama Manga, manga mesmo não se vê. É onde o Exército realmente serve à Nação. Homens fardados se empenham no asfaltamento da terra fofa para, quem sabe assim, reduzir um pouco a peleja de quem passa diariamente de lá pra cá.
Casas de barro existem, como aí perto de casa, mas são bem mais comuns do que deveriam. As pessoas são simples, muitas não sabem explicar a origem do nome da cidade onde nasceram e onde vivem há 20, 30, 60 anos, mesmo assim, sabem e fazem questão de explicar aos turistas qual é o melhor caminho até o município mais próximo. É onde (como em qualquer lugar da América Latina) o comerciante esconde o cardápio para estipular o preço de acordo com a cara, com o carro do cliente. Mas, o povo é generoso, acolhedor e só falta pular para dentro do carro para ensinar melhor o caminho.
Rodovia federal que ainda tem uns 120 quilômetros de pista de terra, alguns trechos muito piores e mais perigosos do que se pode imaginar. Rodovia federal que, se bem tratada, poderia desafogar o trânsito pesado de outras tantas. Rodovia federal que dá vergonha e às vezes medo.
Aqui é possível sentir um pouco do abandono profundo em que vivem essas comunidades sertanejas que insistem em sobreviver pelo país afora. (...)
