Basta!

Jornal O Norte
23/02/2010 às 09:09.
Atualizado em 15/11/2021 às 06:21

Marcelo Valmor


Professor universitário e articulista

Ainda durante o Império (1822-1889), era comum D. Pedro II se ausentar da cidade do Rio de Janeiro, então capital do país, para fugir das epidemias tão comuns durante o verão e se refugiar na região de Petrópolis-RJ.

Mais de um século já se passou, mas ao contrário de D. Pedro II, a população de Montes Claros, para fugir da pior epidemia de dengue da sua história, não tem para onde correr. Convivendo com um índice de infestação pelo aedes aegypti em torno de 8%, a sociedade montesclarense assiste, impotente, a inúmeras justificativas para resolver o problema.

Entrando para o segundo ano de mandato do “novo” prefeito, com um secretário testado em vários órgãos públicos (nenhum voltado para a área de saúde), e com pouca ou quase nenhuma experiência em saúde pública, a prefeitura resiste em capitular diante do avanço de uma doença capaz de inutilizar o sujeito em torno de uma semana.

A frase “Dizem que errar é humano. Mas transferir o erro para os outros é mais humano ainda” parece que está sendo utilizada pelos gestores de saúde da cidade para explicar tal problema. Por isso mesmo, culpar a população da cidade pelo caos na saúde é, no mínimo, uma visão elitista e fora da realidade da cidade e do país. Afinal, os indicadores econômicos no que diz respeito à saúde são alarmantes. Basta dar um pulo na Santa Casa ou qualquer hospital da cidade para perceber que eles estão lotados de pacientes, na sua maioria, pobres. Basta também olhar para os indicadores na área de educação para constatarmos que a maior parte da população do país não lê, ou, quando lê, não consegue interpretar corretamente a informação que lhe chega. Basta olhar para o campo cultural e perceberemos que o acesso ao teatro, cinema e outros atrativos estão restritos àquele setor que dispõe de uma melhor condição financeira. Portanto, não mobilizar o Estado, seja ele estadual, federal ou municipal para combater essa epidemia é,


no mínimo, imaginar que vivemos na Bélgica ou em país desenvolvido similar.

Qual seria a solução, portanto? Segundo a secretaria de saúde, estariam disponibilizados para ir a campo e orientar a população, 300 fiscais de saúde. Por que não trabalharam durante todo o ano de 2009? Por outro lado, esse número dá para cobrir uma cidade que tem uma população em torno de 400.000 pessoas?

Que a população tem que fazer sua parte, disso não temos a menor dúvida. Mas o poder público tem que responder com políticas que garantam uma maior eficiência no controle dessa doença. O Jardim São Luiz, bairro de classe média alta, é um dos maiores focos de dengue da cidade. Por que, se os seus moradores dispõe de formação intelectual suficiente para ter consciência do problema? Por outro lado, o bairro Renascença também é um dos maiores focos. Quantos Jardins São Luiz cabem dentro do Renascença? Sem comparação! Por outro lado, onde estaria o maior problema envolvendo essas duas regiões? No São Luiz, a quantidade de casas fechadas para alugar é um indicativo, enquanto que na região do Renascença os lotes vagos são motivos de preocupação.

Antes de a prefeitura sair multando Deus e todo mundo (Lei 4182/2009), deveria exigir dos proprietários de lotes que os limpem e murem. No bairro Morada do Sol, atrás de uma concessionária de veículos, existe uma área a descoberto que mais se assemelha a uma chácara, e o proprietário, - que não sei quem é -, simplesmente não limpa e nem mura. Onde anda o poder público? No Maracanã também existem lotes em aberto e sujos. Também, onde anda o poder público?

A fala do secretário municipal de saúde, em depoimento à revista Tempo, número 48, de que é cômodo culpar o poder público por essa epidemia enquanto a população não faz sua parte é, no mínimo, não assumir suas responsabilidades, sair do seu gabinete e visitar, pessoalmente, as áreas mais atingidas pela doença, numa clara demonstração que de fato está preocupado com o problema.

Caso insista em administrar a saúde de Montes Claros a partir do seu gabinete, seria melhor que pedisse exoneração do cargo e passasse a responsabilidade para quem, de fato, anda preocupado com os rumos dessa cidade.

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