Backstage - 1

Jornal O Norte
07/08/2006 às 12:09.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:41

Damião Alves *

Corria o ano de 69, época em que a ditadura contrapôs o direito e a palavra do cidadão. Ninguém tinha o direito de ir e vir, nem tão pouco opinião própria.

Emissoras de rádio e tvs tinham suas programações proibidas de ir ao ar. Redações de jornais e revistas eram fechadas e os profissionais eram presos juntamente com seus aparelhos de trabalho. Era o militarismo que imperava. Mas, numa cidade do interior, um grupo de 10 pessoas, entre eles alguns jovens, esperava na frente da rodoviária, com grande euforia o ônibus que ira levá-los ate a capital. Faixas, cartazes e uma torcida organizada faziam parte da recepção.

Era o grupo backstage de teatro e dança que fora selecionado com mais três cidades para se apresentar na capital dentro de um projeto de incentivo a cultura. Para todos principalmente o diretor era motivo de muito orgulho e euforia. Todos sabiam que a censura estava a solta e com certeza os policiais estariam lá para ver quais espetáculos seriam encenados. Mas, o grupo fundado há pouco mais de cinco anos é bastante conhecido em sua cidade, expressa em sua dança reflexos da contemporaneidade com temas próprios e divergentes trazendo observações ate então obscuras. Só um fato os pereocupava. No meio deste grupo de dez jovens. Está karol, uma menina de 17 anos, a mais nova revelação do grupo.

Filha de uma domestica e um servente de pedreiro, desde cedo mostrou seu interesse pela arte da dança. Seu pai conta que todas às vezes que ia ouvir o seu radio de pilha na varanda, karol dançava escondida atrás dos móveis.

Estavam todos a postos. O motorista buzinou pela última vez, ate que o ônibus deu inicio a viagem. A mãe de karol chorava acenando com a mão. Ela já estava sentindo falta da filha, mas sabia que a menina estava feliz. Era o sonho dela, um dia fazer sucesso fora da cidade.

O ônibus chegou a capital no dia seguinte já bem tarde. Pessoas da organização já esperavam na rodoviária. De lá foram para o hotel, depois iriam para um ensaio.

Karol estava maravilhada com a cidade grande. Nunca tinha visto tanta gente em meio a prédios tão altos.

A grande noite chegou. O teatro estava lotado. Há muito tempo o povo não assistia há shows de outros estados. O grupo backstage já estava no camarim se arrumando, será o segundo a se apresentar, num total de seis. Karol já estava arrumada e num cantinho lia o livrinho de orações que a sua mãe havia colocado na bolsa sem ela ver. Do lado de fora se ouve inúmeras sirenes. Passos corre em meio a uma gritaria infernal. São os policiais que acabaram de chegar.




* Músico e escritor. Autor do livro de poesia Flor atípica,ainda inédito.


letraludica@yahoo.com.br

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