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Quinta-Feira,16 de Janeiro

Atentado tupiniquim

Jornal O Norte
Publicado em 01/06/2006 às 11:19.Atualizado em 15/11/2021 às 08:36.

Raphael Reys *



Dia desses, lendo o caderno Magazine, do jornal O Tempo, uma reportagem dava conta que o músico José Eimard, após quarenta anos tocando na noite belo-horizontina, estava lançando o seu primeiro CD. Recordei-me então de um incidente da nossa juventude, em 1961. Aguardava com ansiedade a disputa classificatória, que ocorreria em Belo Horizonte, nas piscinas do Minas Tênis, quando seriam escolhidos os melhores nadadores juniores para compor os quadros do clube nos campeonatos.  Procurei um treinador na MCTC, aqui nos montes claros, para monitorar a minha preparação. Todavia, todos já estavam comprometidos com algum aluno, sempre um filho de família importante. Passei  a fazer treinos diários sozinho na piscina até a exaustão, por não ter um orientador. Visava conseguir resultados a nível da disputa .



Uma tarde, após ter terminado o treinamento rotineiro e ainda na água, eis que Zé Eimard, que a tudo assistia, observando a minha exaustão, me aplicou um caldo. Fui   imobilizado pelas pernas do outro, as quais me manteve debaixo d’água,  fazendo-me engolir muito líquido.



Vomitei bastante e demorei a me recuperar do incidente. Perdi a graça em continuar os treinamentos, a indisciplina reinava no ambiente aquático. O Zé Eimard, um tanto envergonhado, chegou mesmo a antecipar sua viagem, sequer amanhecendo na cidade. Fiquei com uma raiva intensa em não ter podido dar o troco no outro, logo que me recuperei.   



Jurei vingança e esperei que ele retornasse. Contei os dias e as horas! 



Em pouco tempo, encomendei uma grande bomba de fabricação artesanal e de efeito vibratório, feita no capricho pelo mestre Marciano Fogueteiro, em Montes Claros. Montei campana. Quando Zé, já em seu primeiro dia após o retorno das férias, almoçava sozinho, penetrei pelo corredor que dava acesso ao seu apartamento e inseri no petardo, para dar o tempo necessário, uma bagana de cigarro como estopim, ao bom estilo da resistência francesa. Sentei-me na porta do MCTC, a alguns passos daquele apartamento, aguardando pelo estrondo consagrador do meu  triunfo.



O pequeno prédio tremeu todo como resultado do pipoco. Era o efeito Suronsong, uma onda intensa percorreu a estrutura até o passeio. Escutei o grito alucinante do Zé Eimard, que, achando que o imóvel estava ruindo, tentava alcançar a rua, através da janela do primeiro andar, deixando o pior para trás. Acabou sendo dominado pela governanta, que o derrubou e o imobilizou, evitando a queda do beiral para baixo. A cena encheu meus olhos de contentamento. Dava gosto.



A rua ficou coalhada de gente. Foi chamada a unidade voluntária que fazia as vezes do corpo de bombeiros na cidade. Zé Eimard acabou num pronto-socorro para observação.



Após os fatos, ele passou muito tempo evitando encontrar-me, no fundo desconfiava da autoria. Ficou prudentemente sem circular pelos lugares conhecidos, evitando também o deboche. Quando o encontrei novamente, e para finalizar a vingança, o fiz saber da autoria da minha ação retaliadora. Acabamos por nos desculpar mutuamente. Passadas as brincadeiras recíprocas de parte a parte, coisa de jovens, para minha satisfação vejo o sucesso do músico traduzido naquele CD.



* Cronista

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