As periódicas rasteiras da Unimontes

Jornal O Norte
28/10/2009 às 11:00.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:15

Yago Cavalcante


Universitário

Basta indagar a meia dúzia de candidatos a vagas de quaisquer cursos na Unimontes, para se notar a real insatisfação, por parte dos pré-vestibulandos, no que tange ao processo de seleção da universidade. Em praticamente todas as temporadas seletivas, a Cotec – responsável pela confecção e aplicação das provas – e a própria universidade evidenciam a inconsistência do sistema que rege suas respectivas funções relativas ao vestibular. À Unimontes conferem-se desordem e abuso de poder; aos candidatos, conformismo e inércia.

Tal como o papa Nicolau I advogou pelo teocentrismo e Erasmo Rotterdam, pelo antropocentrismo, a Universidade Estadual de Montes Claros, megalomaniacamente, sustenta o “Unimoncentrismo”, como se todos os parâmetros educacionais do país fossem por ela estabelecidos. Sobrepujando o poder que o governo naturalmente concede a ela, a reitoria adota, geralmente de supetão, decisões despóticas, inconsequentes e desprovidas de consultas discentes.

No final de setembro, por exemplo, a Cotec emitiu um comunicado oficializando a inserção inédita de oito questões de filosofia e sociologia já na prova do próximo processo seletivo. A menos de três meses do vestibular, a súbita medida, além de simbolizar a relativa desorganização que permeia a instituição, surpreende toda a rede de ensino norte-mineira. Em tempo recorde, as escolas deverão contratar novos professores, reformular conteúdo didático, adaptar cronogramas e tentar, ao menos, abrandar os ânimos dos alunos, que mais uma vez se veem desdenhados pela Unimontes. Vale esclarecer, por outro lado, que não viso a refutar a introdução da filosofia e da sociologia como conteúdo avaliativo. Dado o fato de até mesmo as mais renomadas universidades do país terem formado, até então, indivíduos frutos da mera reprodução de dados e desprovidos de habilidades críticas e criativas; ambas as disciplinas serão relevantes na reversão de tal quadro, bem como na amenização de crises sociais contemporâneas. Portanto houve aprimoramento substancial do processo, mas de modo abrupto e, decursamente, impróprio.

E, como já versava Drummond, também nunca me esquecerei na vida de minhas retinas tão fatigadas de quando, em 2007, a nossa conterrânea universidade simplesmente ludibriou milhares de pré-vestibulandos, lançando mão da velha propaganda enganosa. A saber, até o processo seletivo daquele ano, candidatos treineiros poderiam acumular pontos proporcionais a seu desempenho nas avaliações vestibulares, de modo que tal pontuação pudesse ser adicionada à nota decisiva. A questão é que a expressiva maioria dos treineiros assumiam os custos de inscrição não apenas pela familiaridade com o exame, mas, preponderantemente, pelos bônus obtidos. Mas, como de praxe, a Unimontes voltou a nos surpreender e extinguiu repentinamente o referido mecanismo, abstendo seus usuários tanto da oportunidade planejada, como do ressarcimento financeiro. Excepcionalmente, jovens de diversas instituições de ensino médio se mobilizaram, direcionando o caso às competências judiciais. Mas bastou a primeira instância, que dispensou veredicto a favor da majestosa Universidade Estadual de Montes Claros e em detrimento dos estudantes maltrapilhos.

E os disparates cometidos por nossa vizinha não restringem aos apresentados. Volta e meia coincidem-se, injustificavelmente, datas de processos vestibulares da Unimontes com os de outras universidades. Reitero: as concomitâncias poderiam muito bem ser evitadas por meio do bom-senso nada inerente à reitoria daquela. No último vestibular, a data oficializada pela Cotec para realização das provas se chocou com a da UFOP. Mas como a data foi ditada pela estadual de Montes Claros, a federal de Ouro Preto que faça o favor de se retratar.

Por outro lado, não atribuo a responsabilidade das constantes ratas apenas à Unimontes/Cotec. Como eminente característica do povo brasileiro, inexistem em nossos estudantes criticismo, questionamentos e, sobretudo, iniciativas inteligentes a fim de se aperfeiçoar a política de seleção da universidade que nos pertence. Tais iniciativas envolveriam manifestações meticulosas e organizadas, propostas de alternativas, diálogos aluno-reitoria, enfim, o rompimento do fosso existente entre comunidade e dirigentes e que contrasta com projetos notáveis apoiados pela própria universidade, como o Unimontes Solidária.

Rene Descartes e Emile Durkhein, ditos pais da filosofia e da sociologia respectivamente, tremeram duas vezes neste semestre em suas tumbas. A primeira vez de satisfação, pela introdução de suas ciências nas provas da Unimontes; já a segunda, por decepção, após a mesma universidade crer que alguém pudesse assimilar, em pouco mais de dois meses, aquilo que eles dissecaram em tantos anos. Diante disso, só me resta torcer que o som proveniente das referidas tremedeiras se mescle com o bradar dos estudantes montes-clarenses, de modo que este adquira ainda mais força para sensibilizar os tímpanos e a consciência do nosso magnífico reitor Paulo César Gonçalves. ... filosófico, não?

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