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Quinta-Feira,26 de Dezembro

As chuvas da minha infância - por Luiz Carlos Amorim

Jornal O Norte
Publicado em 24/10/2007 às 10:27.Atualizado em 15/11/2021 às 08:20.

Luiz Carlos Amorim *



Esta noite acordei com a chuva batendo na minha janela. Não fiquei contrariado de ter acordado com o barulho dos pingos contra o vidro, porque gosto de chuva. Sempre gostei. Gosto de dormir com o tamborilar dos pingos no telhado (morei a maior parte da minha vida em casas, graças a Deus!) ou na janela. Que eu me lembre, só fico chateado quando chove muito nas épocas da florescência do ipê, do jacatirão, do flamboian, da azaléia e do olho de boneca (um tipo de orquídea comum, em nossa região), pois as flores caem mais depressa porque ficam pesadas com o excesso de água e porque apodrecem. E quando a chuva me pega desprevenido no meio da rua, no inverno, pois é resfriado na certa..



Mas, como dizia, choveu esta noite e os pingos na janela fizeram com que me reportasse à minha infância, já um tanto distante. O tamborilar que agora me traz uma sensação de paz e melancolia, naqueles tempos de garoto, idos tempos, fazia com que eu e meus irmãos grudássemos nossos narizes nos vidros das janelas e olhássemos para fora, com uma vontade enorme de sair e brincar, descalços, na água que corria ao lado da casa e junto da calçada. Não era delicioso chapinhar na água da chuva? (Sei que chapinhar não é uma palavra muito usada, mas meu sobrinho de três anos a ouviu e adora usá-la.)



Nossa mãe, no entanto, alerta, nos detinha. Mas em ela se descuidando um segundo, lá estávamos nós, fazendo festa debaixo da chuva, jogando água um no outro, estancando-a em pequenos lagos e soltando barquinhos de papel na corredeira, os cabelos escorridos e a roupa encharcada, com aquele ar de felicidade que só criança tem.



Aqueles dias se foram e eu não corro mais na chuva. Quando apanho chuva, fico aborrecido por que vou chegar molhado em algum lugar. Não consigo mais ser criança como antes. E gostaria de poder. Porque acho que ainda sou um pouquinho criança dentro deste corpo que vai envelhecendo e ficando cansado.



Amanhã, quem sabe, talvez eu saia descalço e de peito nu, a cantar pela chuva. Se você encontrar um maluco molhado cantando e dançando na chuva, não se assuste. Pode ser que seja eu.



* Escritor e editor


lc.amorim@ig.com.br

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