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Segunda-Feira,25 de Novembro

Sublimes cenas sublimes

Mara Narciso - Médica e jornalista
15/01/2019 às 06:11.
Atualizado em 05/09/2021 às 16:02

As rajadas da metralhadora sofrem interrupção, vez por outra. Descansam, deixam acontecer coisas boas, o que dá um alento. A vida não é apenas de doenças, dores, lamúrias, há espaço para se fazer o bem, ser amável, respeitar, melhorar. Sigam comigo!

O sol está queimando, pessoas em situação de rua vivem o maior desconforto. Um homem para o carro próximo a um grupo e desce com uma sacola. Dentro dela há garrafas de água gelada. Ele chega cauteloso, para não assustar nem incomodar, e oferece água. O rosto das pessoas se ilumina. Alguém se preocupa com elas. Cada um recebe uma garrafa, abre e logo bebe no gargalo. O gesto solidário emociona.

O trânsito daquela via está lento devido a uma obra no asfalto da rua transversal. Caso fosse no período escolar, seria ainda pior. O calor do meio-dia, no retorno para o almoço faz cada metro de deslocamento ser difícil de vencer. A fila vai longe e cada vez que o sinal abre passam poucos carros e novamente trava. Um rapaz em um carro está há tempos na saída da garagem. Espera o fluir dos veículos na faixa de rolagem para se mover e sair, mas a espera parece inútil. Então, o sinal abre, um carro avança, mas para e o motorista faz sinal para o rapaz. Ele atende agilmente, sorri satisfeito e entra na rua. O tempo de quem cedeu o lugar não vai mudar, mas interrompe a espera do outro.

Numa época em que muitas pessoas estão com grande excesso de peso, é preciso olhar com cuidado para não errar na avaliação e ceder o lugar para uma “grávida” que não esteja esperando neném. Mas aquela imensa barriga não deixa dúvidas. O nono mês de gestação já começou. A mulher chega, e na mesma hora três pessoas civilizadas se levantam para ela se sentar. Foi na sala de espera de um banco.

A festa está animada e acontece há quatro horas. Os convidados beberam e comeram à vontade. A meia- noite se aproxima e a cantoria ecoa ao longe. Antes que a vizinhança reclame o desconforto, alguém alerta sobre a hora, as vozes cantantes cessam, um som mecânico baixo tem vez até a finalização do encontro. Na casa ao lado uma mãe sente-se aliviada, pois o neném tinha acabado de mamar, dormia e poderia voltar a acordar.

Do carro parado no sinal, a motorista vê na Praça Honorato Alves, próxima do lago com escultura em homenagem à Irmã Beata, uma mãe. Ela é jovem, deve ter menos de 30 anos e leva no ombro esquerdo um saco de lixo dos maiores, daqueles pretos e já meio cheio, e um bastão na outra mão. É magra, de pele clara, cabelos loiros naturais, calça sandálias baixas do tipo chinelo, veste um short cor-de-rosa e camiseta branca, num tipo de roupa de gente classe média. Ao seu lado há uma criança de uns dez anos, em tudo parecida e vestida como a mãe. Observa cada movimento dela, que, explicando ao filho, repetidamente, pesca coisas na água, possivelmente lixo plástico e as coloca no saco. É vendo que se aprende, e não ouvindo discursos.

O pouco bem que é feito, sendo de maneira repetida, acaba virando muito, contamina, viraliza e cresce. Tudo simples, mas, quando um vê e repete o mote, passando-o adiante, o dominó do bem se amplia. Poucos ousarão ir contra uma boa corrente. Como dizia a antiga propaganda governamental “Um bom exemplo: essa moda pega!”

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