No Brasil, o sonho de ficar milionário tem a força de um furacão e a lógica de um jogo de azar. Imagine só: empresas sem lastro, ou seja, sem aquele tal respaldo financeiro sólido, estão ansiosas para colocar as mãos no dinheiro suado de brasileiros que, viciados na ideia de que a sorte pode mudar suas vidas, jogam, apostam e esperam por um prêmio que, na verdade, nunca chega.
A última moda é essa: mais de 100 empresas pediram ao Ministério da Fazenda autorização para operar no mercado de apostas de quota fixa, as famosas bets. O pessoal da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) vai analisar cada uma dessas solicitações, e só quem tiver todos os documentos em ordem e pagar R$ 30 milhões de outorga vai poder explorar até três marcas de apostas. Parece simples, não? Mas, como dizia o velho ditado, o diabo mora nos detalhes.
Metade dessas empresas surgiu nos 30 dias finais do prazo, o que nos faz pensar se realmente acreditam na sorte ou se contam com a ingenuidade de quem acha que ganhar na loteria é questão de persistência. E olhe que a coisa vai ficar séria: só empresas autorizadas pelo Ministério da Fazenda e pelo Ministério do Esporte poderão usar o domínio “bet.br”. Já imaginou quantos sites vão sumir do mapa em janeiro do próximo ano?
E o mais engraçado é que essas bets se escondem em paraísos fiscais de dar inveja a qualquer novela mexicana. Você acha que está apostando em uma empresa brasileira, mas o dinheiro está indo para uma conta em Curaçao, Malta ou até mesmo nos Emirados Árabes. No final das contas, o governo espera arrecadar bilhões em tributos e outorgas, tudo em nome da “regulamentação” do mercado. E, claro, a promessa de geração de 100 mil empregos está aí para deixar tudo mais bonito no papel.
O Brasil, que até ontem era a terra do jeitinho, agora quer dar uma de regulador sério. Como se isso fosse suficiente para conter a ganância dos que veem nas apostas uma mina de ouro – para eles, claro. Aos apostadores, resta a ilusão de que, com um clique, podem mudar de vida. E quem não quer? Afinal, acreditar na sorte é bem mais fácil do que encarar a realidade. E quem sabe, se todos fecharem os olhos e apostarem juntos, não acontece o milagre de alguém realmente ganhar? Só que, como diria Millôr, enquanto uns sonham em ficar milionários, outros já estão rindo à toa, com os bolsos cheios – e não é de sorte, é de dinheiro fácil, arrancado de quem ainda acredita que a vida é um jogo.
*Jornalista/Radialista/Filósofo