Montes Claros, uma cidade onde não chove

Mara Narciso - Médica e jornalista
19/03/2019 às 07:08.
Atualizado em 05/09/2021 às 17:51

Não é preciso ser climatologista para constatar que aqui chove pouco. Participante do Polígono das Secas, a cidade de presumidos 405 mil habitantes já reclama da falta de água há algum tempo. No livro “Corografia Mineira, Município de Montes Claros”, do desembargador Antônio Augusto Velloso, um relato em prosa quase fotográfica das características geográficas, fluviais, vegetais, animais, minerais, populacionais, hábitos e costumes (um livro imperdível de 1897), não fala de seca, mas de alagamentos e proliferação de mosquitos e febres. Mas há tempos é rota de fuga de retirantes da seca do Nordeste indo para São Paulo.

Quem é daqui se lembra de uma infância mais molhada do que os dias que correm. Montes Claros faz parte da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), autarquia criada em 1959, e já sobreviveu a vários períodos de seca absoluta ou relativa. Além de gastar horas com reuniões de planejamento, a cidade recebe verba para o combate à seca, além de incentivos fiscais. Essa ajuda foi marcante na década de 1970 e trouxe para Montes Claros indústrias e um quê desenvolvimentista, uma ajuda que durou dez anos. Findo o período estipulado, várias empresas fecharam, deixando desemprego, parque industrial abandonado e sucatas em galpões, que mais tarde viraram faculdades.

Mais recentemente, depois de sete anos, praticamente sem chover, aconteceu no ano atrasado e passado uma primavera e um verão com chuvas animadoras. Neste ano, porém, depois da boa chuva primaveril, tivemos um período de baixo índice pluviométrico em janeiro e fevereiro, volume que não deve estar suprindo o gasto, portanto deverá abaixar o nível do Reservatório de Juramento. O Sistema Verde Grande, que recebe água dos Rios Juramento e Saracura, passou a receber, desde o ano passado, água do Rio Pacuí, que vem numa adutora do município de Coração de Jesus, a 56 km. Essa ajuda fez as autoridades tomarem uma decisão precipitada: sem comportas cheias, acabaram com a restrição hídrica, que fornecia água dia sim e dois não. A população, habituada com a escassez, passou a gastar “normal”, o que é muito, considerando-se a ausência de reserva.

A cidade tem apresentado temporais que enchem logradouros públicos, alagam casas e trazem prejuízo a vários bairros, especialmente em março, quando pode cair chuva grossa. Tradicionalmente, não temos uma boa malha de drenagem pluvial. O sistema de drenagem no centro menor, subdimensionado desde a construção, está obsoleto ou entupido. Para culminar, a falta de planejamento se mantém agora quando foi feito o recapeamento asfáltico, porém sem o devido cuidado para com o escoamento da água de chuva. Isso levou a ruas cheias d’água na última sexta-feira, após alguns minutos de chuva volumosa.

Pessoas deixam de lado o bom-senso e, numa reforma, destelham suas casas antes de terminar o verão, alegando que aqui não chove. Mas a chuva vem, enchendo suas lajes de água, infiltrando a estrutura e estragando seus pertences. Não é possível em lugar nenhum, mas, num lugar seco como o nosso, é contrassenso querer precipitação com hora marcada. E que venha chuva a qualquer momento, em boa quantidade para matar a nossa sede.

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