Conheci um rapaz cujo namoro durou oito anos, tempo da construção de uma casa a quatro mãos, e o casamento durou apenas uns pouquíssimos meses. O motivo do equívoco foi o canil. A mulher dele ficava na casa e ele dormia com seus 30 cachorros. Eu não podia entender o amor febril de gente que bate em carroceiro para defender o burro. Ou que recolhe cachorros abandonados e os vai levando para casa até se tornar uma situação insustentável.
Não era possível vislumbrar o motivo de tanta gente se mobilizar para buscar um cão em sofrimento, defendê-lo denunciando quem tinha a posse do animal para lhe conseguir uma vida melhor, ou então a pessoa ser seguida por um cachorro e não ter dúvida de que ficará com ele, a menos que o dono apareça.
Na internet via grupo de voluntários dando comida e água a animais abandonados, como também buscando tratamentos, recolhendo, procurando um lar para cada um, gastando do seu dinheiro do dia a dia para minorar a dor dos bichinhos.
O amor ao animal parecia-me um sentimento complexo, porque a visão de um cão na rua me causava medo. Minha irmã tinha sido mordida por um cachorro quando, menina traquina, entrou no quintal alheio para pegar manga e foi atacada. Minha mãe lavava o ferimento e dava gritos ameaçadores. Foi vacinada. Meu filho também precisou se vacinar quando um cachorro o mordeu, pulando no ombro dele, por trás de uma grade.
Uma vez, numa caminhada e um domingo, dei de cara com um pit bull. Apavorada, subi na carroceria de uma caminhonete parada. Equívoco total. Era o carro da casa do cachorro, e ele pulou em cima de mim. Meu ex-marido, que sempre repetiu o mantra de que detestava cachorros, me defendeu com um pau e eu escapei da mordida.
Neste verão seco de temperaturas elevadas, chegando fácil aos 35º C à sombra, vi um pobre cão vagabundo ao meio-dia. O sol e o asfalto rachavam de quentes, fritando suas quatro patas. O animal andava rápido, como a esgueirar-se do sol, calor, fome e sede. Habituada a ver o abandono de cães apenas pelo viés do receio de um calazar, doença fatal que matou um primo meu, naquela hora vi para além da racionalidade. Enxerguei um ser escorraçado, sofrido, magro e faminto. Achei pungente o sofrimento dele. Eu, que apenas me toco e escrevo sobre o que vejo e sinto, não fiz nada, mas tive vontade de fazê-lo. Quero chegar a esse ponto, mesmo que não tencione virar vegetariana.
O motivo da minha transformação foi Frida, nossa primeira cachorrinha mestiça, metade poodle, metade qualquer coisa, que me fez ver o mundo animal não como algo para comer e usar, não somente com seu lado utilitário, mas um ser para se amar.
O seu nascimento se deu em quatro de março de 2018 e ela veio para a nossa casa no dia 21 de abril. Ficamos assustados quando começou a nos morder e a destruir tudo. Não sabíamos o que fazer. Essa fase durou poucos meses, mas agora é apenas alegria, afagos e lambidas intermináveis. Eu não sabia ser possível sentir tanto afeto por um animal. A presença dela alterou toda a nossa rotina para melhor. Trouxe luz, energia e paz muito grandes, além de uma boa dose de felicidade. É um amor que eu recomendo!