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Terça-Feira,22 de Outubro
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A filosofia do deboche entre risadas e aplausos

Gregório José*
Publicado em 04/10/2024 às 19:00.

Estou nessa vida só de passagem, mas, convenhamos, se é pra passar, que seja desfilando, não é mesmo? Afinal, o espelho já me disse que a fulana ali do lado se preocupa mais com a minha vida do que eu. E quem sou eu pra contrariar o espelho? Ele é imparcial, só me devolve o que vê. E o que ele vê é alguém que nasceu pra vencer. Já a fulana… bem, ela nasceu pra aplaudir. Todos têm sua função nessa peça tragicômica que chamamos de existência.

Agora, se você não gosta de mim, tudo bem. Não vou perder o sono. Afinal, nem todo mundo tem bom gosto, e a culpa não é minha se sua vida tá mais pra filme de drama do que pra uma boa comédia. A verdade é essa: algumas pessoas só são felizes quando conseguem ver a nossa infelicidade. Mas eu, com minha risada alta — e a gente aumenta o volume quando a pessoa errada tá por perto —, já deixo claro que a felicidade é questão de perspectiva. Ou seja, eu tô rindo de você, sim. Fique à vontade para imaginar que o mundo gira ao seu redor, mas não se esqueça: o centro do universo é um título que a gente confere só a quem realmente importa. Spoiler: você não tá nessa lista.

Aliás, a internet é o lugar perfeito pra essa brincadeira de “finge que é”, né? Cada um escolhe seu papel: alguns fazem o papel de sábio, outros de burro disfarçado. O resultado é o mesmo. Mas eu bato palmas porque, bom, pelo menos a peça terminou. Não porque eu gostei. O problema é que, de tanto fingir, o pessoal vai se sentindo familiarizado com o papel. Então se veste de algo que não é, se embala nessa falsa persona e vai viver a vida numa rede social onde o sol brilha até à meia-noite. Só faltam as estrelinhas que aparecem quando você mira a Lua e erra. Mas vamos combinar: ir direto na direção do Sol é uma dica maravilhosa pra quem já tá acostumado a queimar a língua.

O que eu mais gosto nessa comédia humana é como a gente finge ser discreto. Aquela famosa frase: “Fica entre eu e você”. Aí, dez minutos depois, na esquina, até o jornaleiro já sabe. Mas não fui eu quem contou, pode apostar. E tem quem confunda amizade com abraço de cobra. Aquele afago mortal, sabe? O abraço vai se apertando, apertando, até você não respirar mais. Pra essas pessoas, eu só desejo um “empurrãozinho”. De preferência, uma mãozinha fechada no meio da cara. Filosofia prática, a gente chama.

Me diga quem nunca passou pelo rito de passagem dos brinquedos no chão? Um dia você é jovem, no outro tá gritando: “brinquedo que tiver no chão vai pro lixo!”. A vida passa, mas não deixa barato. Cada risada, cada deboche, cada gracinha que a gente fez um dia volta pra nos dar aquele soco na consciência. Ou na faxina. Seja como for, só desejo que você siga em frente, mas sem esquecer que a lua tá longe, o sol queima, e a felicidade dos outros não é o termômetro da sua vida. Agora, pode continuar aplaudindo. Eu ainda tô desfilando.

*Jornalista/radialista/filósofo

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