Quando John Lennon, o mais genial e polêmico “beatle”, compôs em 1971 a canção mais importante, inspirado nos poemas do livro “Grapefruit” (lançado em 1964 por uma ainda desconhecida Yoko Ohno), o sonho de um mundo inclusivo, de uma só aldeia global, de unidade , de inteireza, de compartilhamento e cumplicidade tornou-se mais próximo, quase tangível, nos versos da belíssima “Imagine”...
Finalmente, todas as polêmicas e propostas pulverizadas aqui e acolá, nas músicas, nos versos, nas ações e nos protestos encabeçados pelo casal num idílico e voluntário exílio nos EUA, no apartamento nº 46 do Edifício Dakota, se encaixaram e foram eternizadas no grande sucesso solo de John Lennon... Edifício que já tinha sido imortalizado nas telonas em 1968, quando serviu de locação para o filme “O Bebê de Rosemary”.
Foi lá, na sua porta, que quatro balaços desferidos na noite de 8 de dezembro de 1980, pelo lunático e solitário Mark Chapman (que aparentemente só queria usufruir seus 15’ de fama) atingiram mortalmente o mais famoso de seus moradores... O que ninguém duvida é que Chapman apenas cumpriu ordens dos vários setores conservadores dos EUA , da Cia, FBI , que acusavam o músico de doar 75 mil libras ao grupo extremista IRA, o que Yoko jamais confirmou...
Poucos dias antes da tragédia ocorrer, John havia lançado o LP duplo (Double Fantasy) totalmente autoral com faixas em parceria com Yoko, que exercia sobre ele forte influência... Em “Imagine” podemos identificar um visionário assumido, propondo um novo mundo, uma nova forma de viver, em paz, sem religiões, sem céu ou inferno, propondo poeticamente um novo paradigma, baseado na qualidade de vida, na liberdade de ir e vir, nas aberturas de fronteiras, sem guerras, sem fome, sem violência por meio de um novo comportamento, novas atitudes, nova maneira de viver...profetizando que “ the world will be as one!”
Apesar de sua estúpida morte, o fato é que seu exemplo, sua filosofia, objetivos e rebeldia transcenderam o tempo e de certa forma foi difundida por todo o planeta, culminando com a proliferação de seus ideais, que influenciaram toda uma geração de jovens que até hoje cultivam seu legado musical, político, estético e humanitário. De lá para cá tivemos importantes movimentos em todos os setores mundiais, como, por exemplo, a eleição de um negro presidindo os EUA, a libertação de Mandella e extinção do Apartheid, o fim das seguidas e cruéis ditaduras militares na América Latina, a queda do muro de Berlim, o movimento feminista que havia já imortalizou nos versos de “Woman is the nigger of the wold” (“A mulher é o negro do mundo”).
Se vivo, certamente estaria combatendo em favor das minorias. Faz já quase quatro décadas que Lennon foi assassinado, no auge de sua carreira solo e de ativista político, e continua sendo lembrado pelo legado que deixou... Não é para menos, pois sua figura e sua obra fazem falta como nunca diante dos retrocessos que presenciamos e dos que potencialmente poderão sacudir nossa já frágil trajetória humana. Será mesmo que o sonho acabou?