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Quarta-Feira,25 de Dezembro

Ai, me deu crise! - por Ana Luísa Tomé

Jornal O Norte
Publicado em 21/09/2007 às 10:41.Atualizado em 15/11/2021 às 08:17.

Ana Luísa Tomé



Cansei de contar pros garotinhos que as meninas fingem muito mais coisas que apenas orgasmo, e cansei da expressão de espanto deles, como se nunca tivessem presenciado tal cena.



Vou aproveitar que estou longe da TPM e explicar calmamente o que significa viver um fingimento – como diz Pessoa, “finge tão completamente, que chega a fingir dor, a dor que deveras sente”.



Ontem eu e uma amiga ficamos conversando por alguma horas sobre como os homens têm a péssima mania de idealizar uma postura social que eles mesmo não dão conta de levar.



Juntam em pacotes os famosos pré–julgamentoszinhos em que as mulheres devem ser pudicas, contidas e com quase todos os instintos devidamente velados e esquecem que já estamos no século XXI, que a falsidade foi combatida nos movimentos feministas e que está na moda agora o jogo ‘feminino’ exacerbado.



Quanto a fingir…



A gente finge alguma coisa quando precisa, não é mesmo? Você já fingiu que estava doente à toa, só para depois ficar rindo sozinho? Gostaria de acreditar que não. Pois é. Uma vez eu fingi para uma professora minha que não poderia participar da aula de laboratório à tarde porque estava com dor de ouvido. Eu teria uma prova e iria afundar, já que não tinha estudado nada. Preferi tentar a sorte. E fingi tão bem que saí da escola com dor de cabeça. Viu? Eu fingi. Fui uma atriz tão perfeita que fiz a prova no dia seguinte. Estudei com dor de cabeça, mas estudei. E fui razoavelmente bem no teste.



No dia a dia, temos sido obrigadas a fingir um posicionamento definido por outrem e, assim, ‘politicamente correto’. Mas quais são os parâmetros utilizados e que afirmam que não podemos falar o que pensamos, agir como nossos instintos e necessidades mandam? Por que negar um desejo e outro só para não ser chamada de ‘assanhada’? O que eles entendem por ‘assanhada’, então? E por que os mesmo atos, quando vêm dos seres masculinos, não recebem o mesmo valor?



O pior é ver que mesmo com apenas metade das respostas, constatando a verdade que vim trazer aqui hoje,  fugimos completamente   de tudo, porque, assim como no sexo, apesar de não ter prova, a gente sabe que lá no fundinho sempre há uma nota no final para receber.



E queremos a melhor.



Já que falamos em sexo, eu queria dizer que mulher não finge para sacanear o cara. Se é a primeira vez que a gente sai com o mocinho, a gente não traumatiza o cara falando: “Ei, eu não gozei. Espero que eu atinja o orgasmo na próxima, ok?”. Então a gente finge. Para o bem de vocês (e para o nosso, já que num ataque de super auto-estima vocês podem nos acusar de frígidas). Tem mulher mais doidinha que finge para o noivo há cinco anos que goza (essa aí não consegue prever a catástrofe que será a sua vida sexual e, conseqüentemente, a sentimental). Tem mulher que broxa e não quer deixar o cara, literalmente, na mão. Ãhn, o quê? Nããããããããão! Você não sabia que mulher broxava? Sim meu amor, a gente não é máquina de sexo, e como já foi dito por aí e eu achei brilhante, clitóris não é botão de liga-desliga (aproveitando, é clitÓris, e não clítoris). Só que a gente não tem nada pra ficar mole. Sim, somos seres discretos. Quando a gente se excita ou broxa, realmente é difícil perceber, não se culpe. Conseqüentemente, não se culpe por não diferenciar um orgasmo real de um orgasmo falso.



Vocês, homens, deveriam se culpar é por nos deixar sempre na berlinda julgando os atos errados (porque eu até concordo que alguns outros atos sejam julgados) e aprender a diferenciar as coisas certas.



Porque beijar, dormir e fazer o escambau a quatro com alguém não faz de mim uma mulher menos bonita ou menos inteligente – bem como não faz de mim menos interessante. Não me torna uma meretriz - segundo os preceitos de uma sociedade machista.



Ao invés de sairem julgando a torto e a direito, percebam que vocês criam os parâmetros de julgamento, logo criam também todo o fingimento, toda aquela história teatral, uma atitude poser em sala de aula ou no escritório para ser mais respeitada.



Vocês não compreendem perfeitamente e pedem uma lady na rua e uma puta na cama, mas julgam as duas nos dois ambientes.

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