A polêmica do micro e do macro

Jornal O Norte
18/07/2005 às 16:30.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:48

Dener Kruger *

Dentre todas as sensações intensas e perturbadoras que pude experimentar, neste meu mundo atual, a mais intensa ocorreu quando, pelas leituras semanais de Opinião, me deparei com uma que foi no mínimo prosaica, e merece certa observação ou crítica: tive a oportunidade de ler, entender e ficar confuso no meio dessa disputa alienígena travada entre dois ícones da escrita local. Um se posicionando na gênese e outro no apocalipse. Um paradoxo temporal na estrada de vida e dos conhecimentos.

Poderia fazer a comparação assim como, de um lado, Darcy Ribeiro e de outro Chico Xavier, ou ainda Felippe Prates versus Leonardo Campos, ou quantos outros antagônicos queiram comparar.

O que li trata-se de um emaranhado de palavras extraídas de pergaminhos e talvez de manuscritos, quiçá hieróglifos, a tentar explicar a gênese cósmica, coisa para a qual a tecnologia não está nem aí, digo, a tecnologia racional, não a consumista, confronto para meia dúzia de leitores empáticos ou entrópicos remanescentes desse micro ou macrocosmo.

Os dois escritores, de formas divergentes, tentam dar explicações a um mesmo fato, muito curioso e por demais polêmico. Coisa inatingível à percepção de um ser humano literariamente preocupado em entender as coisas do cotidiano.

De uma forma sutil, tentarei - como se fosse uma cunha no meio desses gigantes da caneta, ou do computador - posicionar-me não como crítico, mas como um leitor simples e mortal de Opinião, aquele que entende e se alegra em contemplar a sutileza do cotidiano dos causos e casos pertinentes ao nosso urbanismo e bairrismo do dia a dia, como aqueles escritos por Haroldo Lívio, Peré, Reginauro Silva, Nelson Vianna, Hermes de Paula, Felipe Gabrich, Raphael Reys,  Itamaury de gravata Telles , dentre outros.

A intenção deste texto é tentar contribuir para que confrontos como esse não mais ocorram, ou seja, para que, aturdidos por esse efeito desorientador de aceleração extrema, não nos sintamos dispostos a ceder, desistir e nos conformar com o que der e vier.

Chamemos esse efeito perverso, pelo qual as precipitações das transformações místicas tendem a nos submeter a uma anuência passiva, cega e irrefletida, de síndrome do místico. É claro que não se tenta aqui abolir a base existencial de nosso sistema, ainda que baseada em textos reencarnacionistas, metafísicos.

Mas uma coisa que a escrita não pode fazer é abolir a crítica, pela simples razão de que precisa dela para descortinar novos horizontes.

Existem, sim, tantos belos escritos, areados, muito contemplativos e que absorvem a nossa sensibilidade, como a leveza de uma libélula que pousa por sobre as águas desafiando a lei física chamada hipertensão superficial, e que por certo nos causaria um menor impacto e, conseqüentemente, tornaríamos mais saudáveis e sociáveis dentro deste planeta turbulento.

Passem a observar que as pessoas que riem, batem papo, falam da vida alheia, conhecem cabarés e Durães, sentam na Cristal e café Galo, falam da rua do footing, a Rua Quinze, Beco da Vaca, Zé Amorim, e valorizam causos de Tico Lopes e  Zé Luiz, apreciam a pintura de Godofredo Guedes, a música de Pedro Boi, Jorge Santos, Zé Coco do Riachão, as letras de Braúna, Charles Boa Vista, lembram a bravura  de dona Tiburtina, a arte de Roberto Marques, do fumo de seu Bilu no mercado central (eta fumo grosso!), a favelinha lá no mercado na época do pequi, panã, cagaita, murici e o bando de mosquitos nos botecos, essas pessoas são extrovertidas e dotadas de uma maleabilidade emocional e populista. Por que não dizer curraleiras, como é o nosso caso? 

Ah, se pudesse, ficaria aqui pelo resto da vida falando dessas raízes! Agora imaginem uma árvore fruto dessas raízes, quão frondosa seria... Melhor, estaríamos alimentando o espírito de alegria, aquele do qual somos embriões, e não o outro que tem de ser invocado ancestralmente para ostentar conhecimentos divergentes e opositivos.

Conseguindo o leitor a façanha de chegar até este parágrafo, poderá sim perceber que nos 5º, 9º, 10º e 11º parágrafos, a coisa ficou mais em nível de entendimento e aceitação, não que não tenha conhecimento para os demais, mas que tenha sim predileção a esses citados.

O tempo possui um valor enorme. Para os feiticeiros, em geral, o tempo é fundamental. O desafio que enfrento é que, numa unidade de tempo muito compacta, preciso fazer caber em você tudo o que há para se saber sobre feitiçaria, como uma proposição abstrata, porém, para fazer isso, tenho que construir o espaço necessário em você.

- Que espaço? Do que você está falando, dom Juan?

- A premissa dos feiticeiros é que, para se introduzir algo, precisa-se de espaço para colocá-lo. Se você estiver cheio até a borda com itens da vida cotidiana, não há espaço para nada de novo. Esse espaço precisa ser construído. Percebe o que eu quero dizer?

* Acadêmico de Direito

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