Dirceu Cardoso Gonçalves
Dirigente da ASPOMIL
Prefeitos, vereadores e até juízes de Direito têm se mobilizado contra as abusivas pretensões do Estado de instalar penitenciárias e unidades de internação de menores infratores em seus municípios. Há casos de leis municipais e decisões judiciais proibitivas de primeira instância que o Estado, acaba derrogando nos tribunais, e o rejeitado vizinho é metido goela-abaixo das cidades interioranas, muitas delas menores do que a população carcerária que acabam recebendo. Também há prefeitos que são convencidos pelas autoridades estaduais de que estabelecimento penal representa progresso e empregos para seu pequeno município e, até, fazem campanha para conquistá-los, ignorando os efeitos colaterais da obra.
O argumento básico para a derrubada das proibições junto é de que a massa carcerária é responsabilidade da sociedade e, assim sendo, por ela deve ser absorvida. Os habilidosos defensores da tese, ao apresentarem os recursos do Estado ao tribunal, se esquecem que, para ser justa, é a própria “sociedade” que produziu o delinqüente é quem deve absorvê-lo. Em São Paulo, principalmente depois dos rumorosos episódios do Carandiru, a política tem sido “exportar” detentos da capital para o interior. Uma cômoda postura de reduzir a visibilidade para o problema, que acaba por transferir a insegurança da região metropolitana para todo o território estadual. As penitenciárias interioranas, outrora construídas com a finalidade de atender aos apenados regionais, hoje são ocupadas em mais de 90% por condenados oriundos da capital e seus limítrofes e, nessa difícil equação, os sentenciados de uma própria região acabam levados para outras áreas distantes de onde moram suas famílias.
A tresloucada política de varrer o problema para baixo do tapete criou a necessidade do transporte especial de detentos, que hoje emprega milhares de policiais e viaturas que, pela sua finalidade, deveriam estar policiando as cidades e oferecendo segurança à população. Os próprios apenados e suas famílias são prejudicados porque ficam isolados e distantes até mais de 500 quilômetros uns dos outros, sujeitando-se a viagens e custos para as visitas. Esse quadro de dificuldades faz com que muitas famílias se mudem da localidade de origem para as cercanias de onde seu apenado está recolhido e, ali, não encontre oportunidade de trabalho e nem de serviços básicos de saúde, educação e outros. As que não se mudam tornam-se presas fáceis do crime organizado que lhes facilita as viagens, mas as recruta coercitivamente para suas ações.
O sistema carcerário está falido e carece de urgente mudança. Só restará equilibrado quando o país, titular de uma das maiores cargas tributárias do mundo, acabar com a corrupção e a impunidade e os políticos cuidarem do investimento na área social (desemprego, saúde, transportes, etc). O Estado tem de trocar a repressão pela prevenção e abandonar a falsa idéia de que a simples construção de presídios resolve os problemas. Há, ainda, que atender aos direitos do preso para evitar que ele caia nas garras do crime organizado, que paga advogados e dá assistência aos seus familiares, mas os escraviza.
Sem o urgente ataque às causas de exclusão social e da criminalidade, pouco ou nada adiantará ampliar o número de cadeias e o aparato que as protege. O caos será inevitável.