1989/2009 - a volta da democracia

Jornal O Norte
21/10/2009 às 10:55.
Atualizado em 15/11/2021 às 07:14

Felippe Prates

Há 20 anos ocorria no mundo a queda do muro de Berlim, uma vitória da liberdade.

Há 20 anos ocorria no Brasil um marco na democracia e no sistema político do país: a primeira eleição direta para Presidente da República desde 1960, após o período da ditadura militar.  Sem eleger o primeiro mandatário por um período de 29 anos, os eleitores puderam escolher entre 22 nomes que se candidataram ao cargo.  Segundo Marcos Coimbra, estrategista da campanha presidencial de Collor e presidente do Instituto de Pesquisa Vox Populi, “até pelo aspecto dramático com o qual terminou o mandato do primeiro presidente eleito, Fernando Collor de Melo, acelerou-se o processo de amadurecimento do eleitorado brasileiro.  Fez com que a disposição de correr riscos diminuísse e que as pessoas repensassem certas entregas impensadas a candidatos que pareciam atraentes nos seus aspectos simbólicos.  Resultou que elas ficaram mais cautelosas, pois aprenderam com aquela eleição.”  Realmente, o que mais importa é que, desde então, o país voltou aos trilhos da democracia.  E tomára que dure!

A característica marcante da eleição de 1989 foi o grande número de candidatos disputando o cargo de presidente.  “É normal que depois de um grande represamento surjam muitos caminhos.  Acho que, naquele momento, influiu, também, a busca de participação, o anseio pela retomada da democracia que desaguou no pluripartidarismo brasileiro”, comenta o Ministro de Desenvolvimento e Combate à Fome, Patrus Ananias.

O que aconteceu no Brasil nessa época, lembra a primeira eleição democrática na Espanha, após a morte do ditador Francisco Franco, lá com a presença de cerca de 50 partidos, refletindo um longo período sem eleições no país, além de uma certa inexperiência do sistema político e do eleitorado que compareceu ao pleito.

Políticos como Fernando Collor de Melo (PRN), Luís Inácio Lula da Silva (PT), Mário Covas (PSDB), Leonel Brizola (PDT), Paulo Salim Maluf (PDS) e Ulysses Guimarães (PMDB), estavam entre os 22 concorrentes à vaga. Entretanto, nomes menos conhecidos na política tentaram inovar na postulação do voto.  Enéas Ferreira Carneiro, do Prona, surgia na televisão com cara de maluco, proferindo com voz gutural o slogan: “Meu nome é Enéas...” José Alcides Marronzinho (PSP), aparecia amordaçado e ameaçava falar, segundo ele, o que nenhum outro candidato tinha coragem.  Paulo Gontijo (PP), se inspirava em JK ao proferir o slogan “100 anos em 5.”  Armando Corrêa (PFL), dizia que ao votar nele o eleitor estava votando em Silvio Santos.

Além desses, concorreram, também, à presidência: Guilherme Afif Domingos (PL/PDC), Roberto Freire (PCB), Aureliano Chaves (PFL), Ronaldo Caiado (PSD), Affonso Camargo (PTB), Zamir José Teixeira (PCN), Lívia Maria (PN), Eudes Mattar (PLP), Fernando Gabeira (PV), Celso Brant (PMN), Antônio Pedreira (PPB) e Manoel Horta (PDC do B).

“Os candidatos buscavam um espaço político e, por isso, tinham características muito peculiares ao se apresentarem aos eleitores, dizendo de onde vieram e quais eram as suas propostas para dirigir o país”, analisa e justifica a cientista política Helcimara Telles.

Na  verdade, em 1989, mereciamos melhor sorte.  No segundo turno dessa eleição, ou escolhíamos Lula que, segundo voz corrente, implantaria um governo de esquerda, irresponsável, socializante, com a degola dos ricos e da classe média, ou elegíamos o Mauricinho Fernando Collor de Melo, transformado pelo “marketing” político e pelo talento dos profissionais da propaganda, num semi-deus, um alagoano “porreta”, culto, administrativamente experiente, um luxo só, a salvação da Pátria. 

E nós, juntamente com a maioria dos brasileiros, embarcamos nessa canoa furada.

Mais uma vez, a vida, considerada a professora mais severa que existe, pois primeiro dá o exemplo para depois ensinar a lição, virou-nos a sua face amarga, dura, porém verdadeira.  Elegemos Collor, que se revelou um estelionatário eleitoreiro, um Ali Babá modernoso, chefe de uma quadrilha com destaque para seu sócio Paulo César Farias, o deletério PC Farias, quando o roubo, a corrupção e os desmandos de toda natureza assolaram e dominaram o Brasil, nos envergonhando a todos nós que nele acreditamos. Algum tempo depois, numa queima de arquivo, PC Farias foi assassinado, no melhor estilo do banditismo mafioso.

Assombrados, estavamos mortos de arrependimento!

Indiferente ao nosso pasmo, Collor, com a desculpa de acabar com a inflação, confiscou a poupança dos brasileiros, mancomunado com a “ministra” Zélia Cardoso de Melo, esta uma aventureira debochada, uma ninfomaníaca que trabalhava bem mais na horizontal do que na vertical.  Asilos, orfanatos, gente idosa, todos que para complementar sua renda se valiam do rendimento da Poupança, então conheceram a mais negra miséria e muita gente passou fome!

O roubo, a irresponsabilidade, levaram ao “impeachment” de Collor, num alívio para todos nós.

Nessa época, de péssima memória, para amenizar a nossa amargura, o carioca, sempre de astral alto e que jamais perde o seu bom humor, em cima da tragédia inventou logo uma história divertida.

Vítima da presidencial insensatez , andava a formiguinha de um lado para outro, desorientada, querendo morrer, inconformada com o confisco dos seus ativos, representados pela reserva de alimento estocado com sacrifício durante o ano, para consumo no inverno.  Foi quando encontrou a cigarra feliz da vida, nos trinques, cantando, cheirando a perfume francês, que lhe disse, na gozação:

- Ô Formiguinha Mixuruquinha Petista:  Sou amiga do homem e estou viajando para Paris, com tudo pago, onde morarei por tempo indeterminado.  Você quer alguma coisa pra Paris, Formiguinha?

- Quero sim, cigarra.  Se você encontrar por lá um tal de La Fontaine, diz a ele pra ir pra  P. que o pariu!

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