O impacto dos lançamentos de esgotos sanitários do município de Montes Claros no ribeirão dos Vieiras

Jornal O Norte
Publicado em 17/03/2010 às 10:14.Atualizado em 15/11/2021 às 06:23.

Rômulo Cajueiro de Melo


Biólogo e consultor técnico do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM) desde março de 2002.



Os corpos de água do Estado de Minas Gerais vêm sendo monitorados pelo Projeto “Águas de Minas” desde 1997, inicialmente pela Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) e a partir de 2001 pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM). Os objetivos são investigar, conhecer, avaliar e divulgar as condições da qualidade das águas do Estado e subsidiar a gestão dos recursos hídricos.Nesse contexto, atualmente o IGAM possui em sua rede básica de monitoramento 1estação de amostragem no ribeirão dos Vieiras no município de Montes Claros. A Tabela 1 apresenta a descrição desta estação com as respectivas coordenadas geográficas.



null



OBJETIVOS



Este trabalho tem como objetivo associar os resultados de coliformes termotolerantes, fósforo total, oxigênio dissolvido (OD), demanda bioquímica de oxigênio (DBO), nitrogênio amoniacal total e do Índice de Qualidade de Água (IQA)  o impacto sobre a qualidade das águas do ribeirão dos Vieiras, em função dos lançamentos de esgotos sanitários do município de Montes Claros.



METODOLOGIA



Os dados que serão discutidos neste estudo foram obtidos no âmbito do Projeto Águas de Minas, no período de 1997 a 2008, para a estação VG003. Os serviços de coleta e análises laboratoriais das amostras de água são contratados junto à Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais (CETEC). Para a caracterização sistemática da qualidade da água, são realizadas quatro campanhas anuais de coletas de amostras de água, duas completas, nos períodos de seca e de chuva, e duas campanhas intermediárias, caracterizando os demais períodos climáticos. São analisados cerca de 53 parâmetros no primeiro e no terceiro trimestres, enquanto que no



segundo e no quarto trimestres, são analisados 33 parâmetros na estação do ribeirão dos Vieiras a jusante da cidade de Montes Claros (VG003).



O IGAM utiliza, além dos parâmetros físico-químicos e biológicos, o IQA – Índice de Qualidade das Águas, empregado para avaliar a interferência da contaminação das águas em decorrência da matéria orgânica e fecal, sólidos e nutrientes como um bom indicador. O IQA foi desenvolvido pela National Sanitation Foundation, dos Estados Unidos, e sumariza em um único número a interpretação de nove parâmetros considerados mais representativos para a caracterização da qualidade das águas, quais sejam: oxigênio dissolvido, coliformes termotolerantes, pH, demanda bioquímica de oxigênio, nitrato, fosfato total, temperatura da água, turbidez e sólidos totais. A cada parâmetro foi atribuído um peso, de acordo com a sua importância relativa no cálculo do IQA, e traçadas curvas médias de variação da qualidade das águas em função da concentração do mesmo. Os valores variam entre 0 e 100 (Tabela 2).



null



O ribeirão dos Vieiras está inserido na sub-bacia do rio Verde Grande/ Bacia do rio São Francisco (Unidade de Planejamento de Gestão de Recursos Hídricos - UPGRH SF10).



As águas da bacia do rio São Francisco foram enquadradas segundo a Portaria do IBAMA nº 715/89-P, de 20 de setembro de 1989. Entretanto, o ribeirão dos Vieiras não possui enquadramento de suas águas e nesse caso a DN COPAM/CERH nº01/08 estabelece através de seu art. 37 que: “Enquanto não aprovados os respectivos enquadramentos, as águas doces serão consideradas Classe 2, exceto se as condições de qualidade atuais forem melhores, o que determinará a aplicação da classe mais rigorosa correspondente”. Sendo assim, o ponto VG003 é classificado como Classe 2.



Para o presente trabalho foram analisados os resultados obtidos no ponto de amostragem selecionado, considerando as médias anuais de IQA (Tabela 3) e as porcentagens de violações para os parâmetros relacionados aos lançamentos de esgotos sanitários que estiveram em desconformidade com os limites legais da legislação, quais sejam: fósforo total, oxigênio dissolvido (OD), demanda bioquímica de oxigênio (DBO), coliformes termotolerantes e nitrogênio amoniacal (Tabela 4).



null



RESULTADOS



A Tabela 3 demonstra que o IQA Ruim ao longo dos anos vem caracterizando a má qualidade do ribeirão dos Vieiras que recebe os lançamentos dos esgotos de Montes Claros, uma vez que a vazão desse ribeirão não permite a depuração da matéria orgânica proveniente dos esgotos sanitários deste município.



Os parâmetros que mais influenciaram no cálculo do IQA em 2008 na estação VG003 foram: coliformes termotolerantes, oxigênio dissolvido (OD), demanda bioquímica de oxigênio (DBO), fósforo total, turbidez e sólidos totais.



O município mais populoso da sub-bacia do rio Verde Grande, Montes Claros, é o que mais contribui com a matéria orgânica no ribeirão dos Vieiras. Esse corpo de água apresentou altos percentuais de resultados acima dos limites da DN COPAM/CERH nº01/08 para os parâmetros coliformes termotolerantes, oxigênio dissolvido (OD), demanda bioquímica de oxigênio (DBO), fósforo total e nitrogênio amoniacal total.



Na Tabela 4 observa-se que as contagens de coliformes termotolerantes apresentam em média porcentagens altas de resultados acima do limite previsto na legislação. As bactérias do grupo coliforme são alguns dos principais indicadores de contaminações fecais, originadas do trato intestinal humano e de outros animais. A determinação da contagem dos coliformes assume importância como parâmetro indicativo da possibilidade de existência de microorganismos patogênicos, responsáveis pela



transmissão de doenças de veiculação hídrica, tais como febre tifóide, febre paratifóide, disenteria bacilar e cólera.



O parâmetro fósforo total apresenta uma porcentagem extremamente alta de resultados acima do limite legal: 98%. Esse é originado naturalmente da dissolução de compostos do solo e da decomposição da matéria orgânica. O aporte antropogênico na região é oriundo principalmente dos despejos domésticos, excrementos de animais e fertilizantes. A presença de fósforo nos corpos de água propicia o desenvolvimento de algas ou de plantas aquáticas indesejáveis, principalmente em reservatórios ou corpos de água parada, podendo conduzir ao processo de eutrofização.



As ocorrências de DBO e OD (85% e 100% respectivamente) acima do limite legal também apresentaram grande destaque no período de monitoramento na estação de amostragem em estudo. Valores de DBO são utilizados para avaliar o conteúdo de matéria orgânica biologicamente degradável e podem estar relacionados com a diminuição do teor de oxigênio dissolvido na água. Os resultados desses parâmetros confirmam os impactos causados nesse corpo de água por despejos de origem orgânica, o que neste caso está diretamente associado aos lançamentos dos esgotos sanitários de Montes Claros. Foi observado ainda que 80% dos resultados do parâmetro nitrogênio amoniacal total excederam o limite legal. Trata-se de uma substância tóxica não persistente e não cumulativa. Em baixas concentrações, como é comumente encontrada, não causa nenhum dano fisiológico aos seres humanos e animais. Por outro lado, grandes quantidades de amônia podem causar sufocamento de peixes, situação observada na estação de amostragem (VG003), onde os peixes procuram oxigênio na superfície do ribeirão. Como fontes de contribuição de nitrogênio amoniacal, destacamse os lançamentos de esgotos sanitários, efluentes de fábricas alimentícias e frigoríficos.



CONCLUSÃO



Considerando a série de resultados no período de monitoramento e os parâmetros que representam um indicativo de contaminação dos corpos de água por lançamentos de esgotos sanitários, os que apresentaram maior número de resultados acima dos limites estabelecidos pela DN COPAM/CERH nº01/08 na estação de amostragem do presente estudo foram coliformes termotolerantes, fósforo total, nitrogênio amoniacal total, DBO e OD na grande maioria das amostragens realizadas.



Pode-se dizer com propriedade, tomando-se como base o contexto da sub-bacia do rio Verde Grande como um todo, que estas condições de qualidade observadas no ribeirão dos Vieira são decorrentes dos lançamentos sanitários do município de Montes Claros.



Conclui-se, pois, que a contaminação por esgoto sanitário constitui um dos principais fatores de pressão sobre a qualidade das águas desse ribeirão. Portanto, para conter a emissão de efluentes sanitários, sugere-se a definição de açõesque priorizem melhorias no sistema de esgotamento sanitário do município de Montes Claros.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



FEAM: Fundação Estadual do Meio Ambiente “Manual de Saneamento e Proteção Ambiental para os Municípios. Coletânea de Legislação Ambiental”, Vol. V, pp. 663.


2002



IGAM: Instituto Mineiro de Gestão das Águas (2008). “Relatório de Monitoramento da Qualidade das Águas Superficiais da Bacia do Rio São Francisco” 2008.



PAREY, V.P. “Manuais para Gerenciamento de Recursos Hídricos. Relevância de Parâmetros de Qualidade das Águas Aplicados a Águas Correntes”. 103p., Parte I,


227/1993, 1999.



“PLANO Diretor de Recursos Hídricos das Bacias de Afluentes do Rio São Francisco em Minas Gerais”. Estudos e Inventário dos Recursos Hídricos. Diagnóstico. Qualidade da Água. Governo Federal. Governo do Estado de MG. 2002.

Compartilhar
Logotipo O NorteLogotipo O Norte
E-MAIL:jornalismo@onorte.net
ENDEREÇO:Rua Justino CâmaraCentro - Montes Claros - MGCEP: 39400-010
O Norte© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por