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Quarta-Feira,25 de Dezembro

Inundação do Córrego Bicano manda moradores para a rua e causa pânico

Jornal O Norte
Publicado em 11/04/2006 às 10:29.Atualizado em 15/11/2021 às 08:32.

Samuel Nunes


Repórter


onorte@onorte.net






No rosto de Antônio Pereira Dias Filho, a aflição se junta ao choro...



Medo, revolta, angústia, indignação, desespero e muitas lágrimas. São estes os sentimentos vivenciados por moradores que residem na parte baixa da Vila Campos, bairro localizado na zona Sul de Montes Claros. Sentimentos esses motivados pelas torrenciais chuvas que caíram na noite do último sábado e na madrugada de segunda-feira. Era para ser um final de semana como outro qualquer, alegria por mais uma noite de sábado que chegava e pelo futebol no domingo na televisão, ou até mesmo para curtir um feriado com os amigos. No entanto, a realidade foi outra: muita chuva, água entrando em casas próximas ao Córrego Bicano e levando roupas, colchões, sapatos, televisores, aparelhos de rádio e, conseqüentemente, a esperança dos moradores.






...dos que tentam salvar colchão e outros utensílios na enxurrada


(fotos: Wilson Medeiros)



Mosquitos, ratos e outros insetos peçonhentos são freqüentes nesta época e, em virtude disso, crianças com febre e com sinais claros de desnutrição são afastadas de uma vida digna. A reportagem de O Norte presenciou, nesse bairro, Lúcia Gonçalves, que mora na Avenida Nossa Senhora de Fátima há cinco anos, contar que, na madrugada de segunda-feira, mais precisamente às 3 horas, sua casa foi inundada. Na sua opinião, o motivo do alagamento do trecho da avenida e da água que entrou pela sua casa se deve às obras de canalização que estão sendo realizadas no Bicano.



PODE SER PIOR



Como solução para o problema que ela viveu com sua família, vendo a água do córrego avançar pelos cômodos da casa, Lúcia Gonçalves aponta agilidade no término das obras.  Ela entende que, se isso não acontecer, a situação pode agravar-se ainda mais. A reportagem flagrou crianças brincando em cima de uma árvore que está jogada ao chão e que provavelmente foi cortada para facilitar o trabalho de canalização do córrego. O perigo é constante e moradores cobram a retirada dessa árvore por parte do órgão responsável, antes que aconteça um acidente com alguma criança que, além de brincar nessa arvore e se machucar, corre o perigo de ser atropelada, uma vez que a Avenida Nossa Senhora de Fátima é um local de grande fluxo de veículos e que liga vários bairros daquela parte da cidade.



PARTE BAIXA X PROBLEMAS



Maria das Dores Santana afirma que, depois da fatídica noite de sábado da e madrugada de ontem, ela deseja morar em outro lugar com sua família e espera do poder público municipal que arrume um lugar digno em que possam viver o resto da vida. Ela conta, com tristeza, os momentos que viveu com sua família, vendo os colchões da cama e outros pertences indo por água abaixo.



Com apreensão, Maria das Dores diz que não tinha almoçado e que também não ia comer nada na noite de ontem, segunda-feira, com sua família, uma vez que, com as chuvas que caíram no final de semana, a feira do mês se perdeu em meio às águas:



- Perdi tudo que comprei para comermos no mês com a água que entrou dentro de minha casa. Não sei ainda o que vou fazer. Graças a Deus, alguns vizinhos estão doando algum tipo de alimento para mim.



Outra moradora que se mostra indignada com a situação é a catadora de papel Damiana Maria de Jesus. Ela revela que ganha R$ 100, por mês com esse trabalho e que, nos últimos dias, tem passado necessidade com seu esposo, mais dois filhos e três netos. Dona Damiana descreve:



- Aqui onde moramos não tem as mínimas condições de um ser humano viver com sua família. Depois que o pessoal começou a mexer no Córrego Bicano, as coisas pioraram, pois a água do rio, com as chuvas, entra em nossas casas.



DRAMA X LÁGRIMAS



A reportagem de O Norte foi fundo nos problemas vividos por famílias na Vila Campo. Faltam condições básicas de infra-estrutura. É perceptível para quem chega nesse bairro o estado de deterioração de algumas ruas que, com as chuvas. Foi complicado até mesmo para a reportagem chegar aos lugares indicados pelos moradores, devido à precariedade das ruas, com poças de água, lama e buracos que impedem a passagem de carros, motos ou quaisquer outros veículos automotores.



Outro problema constatado é que as casas que tiveram seus cômodos invadidos pelas águas estão construídas próximo à margem do Bicano. Também foi fácil detectar os problemas de ruas onde, em sua maioria, não existe calçamento nem cascalhamento. Moradores dizem que, se a prefeitura fizesse pelo menos o calçamento, o lamaçal diminuiria.



Mesmo diante de toda essa situação, é possível constatar a amizade e união entre as pessoas que tiveram suas casas invadidas pela água do final de semana. Um exemplo de ajuda e trabalho em prol dos vizinhos é o do pedreiro Antônio Pereira Dias Filho. A exemplo de seus vizinhos, que perderam praticamente tudo, ele perdeu, com a chuva da madrugada de ontem, camas, sofá, sapatos tanto dos seus filhos como dele e da esposa:



- Foi tudo muito rápido e não deu tempo de salvar quase nada da minha casa.



No entanto, ele ainda encontra forças e muita vontade de ajudar seus amigos. Afirma que, na hora da chuva, como  já tinha perdido quase tudo em casa, ele resolveu ajudar seus amigos que ainda tinham algumas coisas para ser salvas.



Antônio Pereira, com emoção, conta que salvou, além de pertences dos seus vizinhos, crianças que estavam em situação de risco como, por exemplo, serem levadas pelas águas do córrego. Com emoção e com os olhos vermelhos e a ponto de chorar, Antônio Pereira Dias Filho revela também que sua esposa viajou a passeio na última sexta-feira, em companhia de seus dois filhos, para a casa de familiares no Rio de Janeiro. Para ele, a situação poderia se tornar mais grave se sua família estivesse em casa:



- Graças a Deus, só eu estava no momento; se estivessem todos, eu não sei o que poderia ter acontecido; o desespero poderia ser maior.



Antônio perdeu com as chuvas algumas ferramentas de trabalho como tábuas e escórias que, normalmente, ele usa no seu trabalho de pedreiro. Toda a feira de alimentos que ele fez para passar o mês, foi-se com as águas. Ele afirma que, se as chuvas continuarem, não vai continuar morando na Vila Campos, mas, ao mesmo tempo, não sabe para onde ir se isso vier acontecer.



A moradora Neuzita Gonçalves da Silva tem contado com a ajuda e colaboração dos seus vizinhos, com um colchão emprestado de um amigo. Ela diz que esperava ter uma noite tranqüila com seus filhos, já que os colchões onde ela e seus filhos dormiam molharam e não tem condições mais para uso.



O OUTRO LADO



A reportagem contatou a secretaria municipal de Planejamento e o titular dessa pasta, Guilherme Guimarães, informou que, no caso especifico do córrego, o mesmo está inserido no plano diretor de drenagem urbana, que consiste em diagnosticar os pontos emergenciais da cidade, no que se refere ao escoamento e empoçamento das águas das chuvas.



Ele afirma ainda que as obras do córrego têm uma perspectiva de término de 24 meses e que os moradores que residem nas marginais do Bicano serão indenizadas de maneira justa, para que elas possam construir suas casas em outras partes da cidade. O secretário diz ainda que a comunidade tem que ficar atenta onde comprar lotes. Ele revela que, muitas vezes, lotes são vendidos sem drenagem pluvial e quem se sentir prejudicado deve procurar o Procon e notificar o dono do loteamento.

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