Trabalhar, fazer amigos e até namorar nunca foi tão fácil e, ao mesmo tempo tão difícil
Gabrielle Borges
Acadêmica do curso de Jornalismo da Funorte
Com o surgimento da internet, os relacionamentos passam a ser cada vez mais virtuais e menos pessoais. As décadas de 60, 70 e 80 marcam um período da História com a Guerra Fria, onde duas grandes super-potências (Estados Unidos e União Soviética), juntamente com os seus aliados, travaram uma guerra de espionagem, blefe e intimidações. Esta foi à era da grande corrida armamentista, de modo que nenhuns dos dois grandes blocos se intimidavam perante o outro. Sendo assim, a Internet foi idealizada na década de 60 e seu uso seria exclusivamente voltada para trocas e compartilhamento de informações, pesquisas e para fins militares. Aliado a este interesse militar, as grandes universidades americanas também começaram a se interessar pelo assunto, visto que, uma vez implementada, a internet seria extremamente útil para pesquisas e para troca de informações com pesquisadores de outros locais. Nesta época, ninguém tinha noção de onde chegaria a internet, e do poder transformador dela na vida de toda a humanidade.
Porém, no início da década de 70, trabalhar com computador era coisa de especialista, pois era preciso “conversar com a maquina na linguagem dela”, o que era muito complicado para a maioria das pessoas. Por conta disso, somente algumas instituições se aventuravam neste ramo, e a Internet ainda era pouco conhecida. No entanto, com a elaboração de softwares e interfaces cada vez mais fáceis de se manipular, as pessoas foram se encorajando a participar da rede. O grande atrativo da internet era a possibilidade de se trocar e compartilhar idéias, estudos e informações com outras pessoas que, muitas vezes nem se conhecia pessoalmente.
Atualmente, passados pouco mais do que 40 anos desde a implementação da primeira rede de Internet, o mundo está bem diferente, e a internet já faz parte da vida de muita gente. Tanto é que só no Brasil já são mais de 14 milhões de pessoas com acesso à rede. Pelo menos um em cada 10 brasileiro com mais de 16 anos de idade tem acesso diariamente a Internet. E isto já não é um privilégio somente das elites com telefone e computador em casa; existem pelo menos 6,4 milhões de internautas que desfrutam da web no trabalho, escola, universidade ou cybercafés. O que começou como um ideal de guerra, hoje em dia está bem longe desse fim. As pessoas cada vez mais utilizam a rede para trabalhar, fazer amigos e até mesmo namorar.
A internet acabou se tornando uma forma de lazer, um ponto de encontro de pessoas de diversas partes do mundo. Tanto é que cada vez mais grandes empresas investem em sites de relacionamento. Hoje em dia, o site com maior número de usuários é o Orkut. Além do Orkut, temos também, Gazzag, Beltrano, Par Perfeito, Namoro ou Amizade, também são uma ótima opção para quem quer fazer ou reencontrar amigos de longa data e até mesmo para arrumar um namorado(a). Estes sites, na verdade são comunidades virtuais, onde o usuário cadastrado tem um perfil público e pode visualizar perfis de outros usuários. É possível procurar por pessoas de diversos lugares, classe social, gosto musical, tipo físico, etc, e para isso basta fazer uma busca no próprio site a procura da pessoa que você quer.
Através de um simples “click” você pode encontrar sua alma gêmea. Mas antes de correr para alguma dessas comunidades virtuaís, escolha uma bela foto, pois os perfis mais procurados e mais acessados são justamente estes.
Além dessas comunidades virtuais, há também várias outras maneiras de se conhecer pessoas. Uma febre que está tomando conta dos usuários mais assíduos da rede é o Fotoblog, que nada mais é que um “diário virtual”, onde seu dono coloca fotos e comentários sobre a mesma na rede e todas as pessoas têm acesso ao “diário”. Os visitantes podem entrar, ler e comentar sobre o que a pessoa escreveu e, conseqüentemente, o dono do fotoblog vai retribuir a visita. Sendo assim, está se iniciando mais um ciclo de amizade.
Outra forma de interação são os famosos programas de mensagem instantâneas. Os mais usados atualmente são o MSN, da Microsoft, o Yahoo Mensenger da Yahoo, o Skype e o ICQ. Estes programas possibilitam ao usuário trocar mensagens e arquivos em tempo real com outra pessoa com quem esteja “teclando”. Especialistas ainda tentam entender o porque que cada vez mais pessoas de diversas faixas etárias perdem tanto tempo na frente de um computador “teclando” com pessoas que na maioria das vezes nem conhece pessoalmente. Mas os usuários se defendem e a maioria já tem a resposta na ponta da língua.
Como é o caso da universitária Aline Pereira Fonseca, 21 anos. Para ela, a internet acabou virando um vício ou algo do gênero. “É onde eu encontro meus amigos e venço as barreiras da distância, além de conhecer pessoas novas.” - “Também é uma forma de divertimento”, completa a estudante Thiara Hamuri, 19 anos. Para o analista de sistemas, Rosalvo Júnior, 22 anos, a preferência pela rede se dá pela economia: “Para mim ficaria muito mais caro ficar fazendo ligação telefônica normal para meus amigos, então prefiro usar a net para entrar em contato com todos eles.” Há quem também utilize a rede para namorar, como é o caso do auxiliar de confecção Henrique Marcelino Dias, 20 anos. “Uso a internet para falar com a mulher que amo. É por ela que passo horas em frente ao computador. Estamos um pouco longe e ainda não podemos nos ver pessoalmente.”. O interessante desse relacionamento é que os dois namoram há sete meses virtualmente sem nunca terem tido nem um contato físico.
Há também quem use a Web para outros fins que não são voltados para o lazer, como é o caso do Gestor Público Anderson Macedo, 26 anos, “Utilizo a internet para trabalhar, fazer pesquisa para minha Monografia de Especialização e da Dissertação de Mestrado.” Muitos usuários chegam a preferir se relacionar com pessoas pela internet do que pessoalmente, alguns por timidez, outros por comodidade. — “Por aqui, acabamos conhecendo a pessoa de verdade, do jeito que ela é. Ela pode mentir sim, mas às vezes são mentiras como ela é fisicamente, aqui todos são aceitos e não existe preconceito.
Você acaba conhecendo e vendo que as pessoas pensam como você, e que se preocupam com seu bem estar.” — afirma a técnica de enfermagem Nicole Novaes, 18 anos. Rosalvo Júnior diz ser muito timido, e, quando esta no teclado, não tem essa timidez. “Nunca tive nenhum namoro virtual, mas tenho vários amigos que conheci pela net”.- diz Júnior. 90% dos internautas acreditam que é possível se ter um amigo virtual, mas quando o assunto é namoro, acham meio inviável essa situação como afirma Aline Pereira:
“Na verdade não acredito em namoro virtual. Creio que tanto namoro quanto amizade necessitam de um contato verdadeiro, e não apenas virtual.
Por isso, procuro não manter minhas amizades apenas na internet, faço questão de conhecê-las pessoalmente, se eu julgar seguro”. Já Nicole Novaes acha totalmente possível se apaixonar por alguém que você não conhece pessoalmente. Há sete meses ela namora somente através da rede com Henrique Dias. Eles nunca se encontraram pessoalmente, mas afirmam serem apaixonados um pelo outro. “Quando me perguntam como posso amar alguém que nunca vi, respondo o seguinte: Você acredita e ama Deus? (na grande maioria das vezes a pessoa responde que sim). Ai indago: Como você pode crer e amar alguém que nunca viu? Internet pode sim fazer um casal se conhecer e se apaixonar e fazer eles manterem um relacionamento.
Um contato físico sempre faz falta, e como faz, mas você sabe que um dia vai acontecer o tal encontro e tudo dará certo. Ou um relacionamento para ser verdadeiro precisa somente de contato físico? Um casal não fica 24 h se beijando e fazendo amor, eles precisam se conhecer, e a net é isso, aqui você conversa, conhece a pessoa e com o tempo tudo se acerta...” afirma Nicole. Mas nem tudo é um “mar de rosas” na rede. Do mesmo jeito que existe pessoas verdadeiras, existem pessoas falsas e oportunistas que fazem da Internet um meio de aplicar golpes. O mercado negro do tráfico de órgãos é um exemplo disso. A quadrilha contrata pessoas bonitas e agradáveis para conquistar pessoas na web. Assim que o internauta resolve se encontrar com o possível “pretendente”, uma emboscada é armada e a pessoa é levada para um local deserto e lá é retirado, na maioria das vezes, os rins da pessoa. A assistente de assessoria, Ana Paula Durães, 23 anos, a quatro meses viveu uma aventura: conheceu um rapaz pela internet e depois de um
mês de convenças resolveu ir até São Paulo conhecê-lo. “Sei que foi uma loucura viajar para conhecer um rapaz que até então só tinha contato através da net. Mas só fui porque toda minha família sabia e ele iria me encontrar na casa dos meus tios lá. Caso contrario não teria coragem de arriscar.” Já a estudante Lívia Castro, costuma passar pelo menos quatro horas por dia navegando na web e assim conheceu seu namorado virtual.
No final de dezembro eles vão se conhecer. “Ele vai vir até minha cidade. Acho mais seguro. Aqui é meu “terreno”, tem meus amigos, minha família, tenho meu suporte caso algo dê errado. É muito arriscado eu ir à cidade dele. Lá (São Paulo) não conheço ninguém e embora confie nele, não quero arriscar. Na net ele é uma pessoa maravilhosa, mas quem me garante que pessoalmente não irá mudar?”— afirma a estudante. “Antes de marcar um encontro, tente conhecer melhor a pessoa que está do outro lado. Dê seu telefone só quando achar que a pessoa é confiável, de preferência de o número do celular e em hipótese alguma passe seu endereço para alguém desconhecido. Procure marcar o encontro em lugares muito movimentados como shoppings e restaurantes. Avise um amigo onde você estará e peça para te ligarem sempre para terem certeza que está tudo bem. Sempre vá no seu carro ou tenha dinheiro para o táxi, é arriscado voltar de carona com alguém que você acabou de conhecer.” - aconselha o polícial Hélio de Castro.
De outro lado os internautas defendem: “Risco em todos os lugares tem. Mas o risco aqui é remoto, risco tem quando você sai para balada ou barzinho. Aqui na internet ninguém pode atirar em você ou tentar te violentar”. - Mas concordam em outro ponto: “Risco é somente quando vamos conhecer a pessoa, por isso é aconselhável que se marque um encontro num lugar neutro, ou seja, bem movimentado”. - afirma um usuário. “É preciso acreditar no que a pessoa tá dizendo. Ninguém tem bola de cristal para adivinhar se a pessoa tá falando a verdade com você. Na maioria das vezes eu confio no que me falam, porque como dizem, a mentira tem perna curta, e é difícil a pessoa continuar mentindo após horas e horas de conversa”. - acrescenta a estudante Thiara Hamuri.
Para a psicóloga Juliane Pereira, este novo meio de interação é saudável ate um certo ponto. “Amizades sempre são bem vindas. E muitas pessoas têm dificuldades de fazer amigos e até arrumar um namorado(a) por serem tímidos e a internet acaba com esse medo. É muito mais fácil ser aceito num mundo virtual do que no real, até pelos conceitos de beleza que a sociedade prega, muitos acham mais fácil se relacionar com pessoas que não possam discriminá-lo. O que não pode é a pessoa viver somente no mundo virtual e deixar de fazer coisas básicas como ver um filme no cinema.
Contato físico é muito importante. As pessoas não podem viver num mundo imaginário. Se você está deixando de viver coisas reais para se entregar a relacionamentos virtuais, já está na hora de parar e pensar que a vida é muito mais que uma tela de computador.” O biólogo Victor Abrantes é totalmente contra esse tipo de relacionamento: “Uso a rede somente para trabalhar e olhar e-mails. Esse negócio de amizade, namoro virtual é uma palhaçada. Coisa de gente sem o que fazer. Não tem como você sentir carinho por alguém que você nunca viu na vida. Eu preciso de contato, de pegar, sentir o cheiro. Fotos e palavras bonitas não me sustentam. Preciso de gente de verdade, não virtual. Daqui a pouco, essas pessoas não vão poder nem assistir mais filmes sem se apaixonar pelos atores. Isso tudo é muita alucinação.” - afirma Victor.
Opiniões contraditórias sempre vão existir. Fazer, ter amigos, namorados(as) virtuais é bom até um certo ponto. Você não pode é deixar sua vida social de lado para cair de cabeça em um mundo virtual. Todo ser humano precisa sim de contato físico, de viver coisas reais com pessoas reais. Dá para conciliar vida real com vida virtual sem se prejudicar em nenhuma das duas, afinal, ninguém consegue ficar 24 horas por dia na frente de um computador. Se dá ou não para gostar de alguém que nunca se viu cabe a cada um decidir, pois depois da era da internet, futebol, religião e relacionamentos virtuais são assuntos que não se discutem.
