O filme Gritos e Sussurros encerra a mostra dos filmes do diretor sueco Ingmar Bergman, exibida durante todo o mês de julho no projeto Cinema Comentado. Bergman é considerado o cineasta do existencialismo, pois no centro dos seus filmes sempre está o homem, seus conflitos e contradições.
Gritos e Sussurros (1973) talvez seja o filme que melhor sintetiza as preocupações estéticas e temáticas do cineasta. Obra de um autor maduro, o roteiro se apropria do universo das peças de Tchecov destrinchando o complexo universo das relações humanas, principalmente aquelas sustentadas por frágeis laços familiares. O olhar desafiador é herança também de Ibsen – autor favorito e referência em todos os roteiros bergmanianos.
ENREDO
No final do século XIX, numa casa de campo, vive uma mulher com câncer (Agnes), uma criada fiel (Anna) e mais duas irmãs da doente (Marie e Karin), cada qual com uma história paralela. Conforme a doença de Agnes piora, as irmãs não conseguem mais esconder seus problemas e começam a sentir saudades da antiga família, da qual faziam parte quando crianças, quando não possuíam responsabilidades.
Durante o filme acontecem flashbacks que mostram os segredos das personagens: Karin se castra por causa de ódio ao marido, Marie sente desejo por um antigo parceiro e, enquanto Agnes quer somente unir as irmãs para receber um pouco de amor, a única que parece entendê-la é Anna – empregada que a acompanha há doze anos.
REQUINTE ESTÉTICO
Gritos e Sussurros é, sobretudo, um filme que se utiliza do requinte estético para expressar sentimentos. A fotografia de Sven Nykvist em vermelho, branco e negro, além de criar uma atmosfera onírica quase atemporal, ilumina instantes inesquecíveis de amor, ódio e ternura. Maquiagem e figurino surpreendem. A maquiagem é discreta e bem feita; o figurino está fiel ao tempo e com design de cores que ajudam na composição do cenário. Quanto à atuação das atrizes, tudo está impecável. Agnes causa sustos com sua atuação doentia. Anna convence com sua bondade e sinceridade, Karin é dura e inabalável, e Marie se auto-define como infantil e superficial. Tudo interage de forma a se encaixar na história de forma incomum, melodramática, mas muito surpreendente.
O próprio Ingmar Bergman define a produção como um filme que se aproxima mais de um estado de alma do que propriamente de uma história a ser narrada dentro dos princípios básicos do cinema. Deixar transparecer o que se oculta sobre as formalidades das relações humanas é o objetivo dessa obra reveladora: É no limiar da vida que o diretor percebe o momento das grandes revelações – aquelas abafadas pela moral, pelos costumes e pela religião.
Discutindo, além dos sentimentos femininos, a fidelidade, a família, o amor e o cuidado com os doentes, Gritos e Sussurros é um drama altamente recomendado.
O Cinema Comentado acontece na sala Geraldo Freire, ao lado da câmara municipal, a partir das 18:30 horas, e a entrada é gratuita.