Jerúsia Arruda
Repórter
jerusia@onorte.net
Para quem mora nos grandes centros o cinema já faz parte do cotidiano. Mas para quem cresceu nas pequenas cidades do interior, ainda é uma novidade que desperta curiosidade e provoca emoções. Para quem nasceu nas décadas de 40/50, a sétima arte ainda é a maior atração das lembranças pueris.
Antônio Cirilo de Carvalho, 65 anos, um pernambucano da cidade de Sertânia que vive há alguns em Montes Claros, diz que o cinema faz parte de suas melhores lembranças.
- Tive uma infância pobre em uma pequena cidade do interior de Pernambuco, onde não tinha nenhuma opção de lazer. De vez em quando, uma vez por ano talvez, chegava à cidade uma carro de som anunciando que à noite teria cinema, para todo mundo ir e levar a cadeira. Então montavam uma espécie de tenda gigante e uma máquina que ficava girando e fazendo muito barulho projetava a imagem na lona. Todo mundo chegava e acomodava a cadeira em algum lugar da tenda. O pagamento para entrar podia ser dinheiro, galinha, uma manta de carne, uma dúzia de ovos ou qualquer coisa que servisse de escambo. Depois que se apagavam as luzes e a imagem surgia na lona, parecia que eu era transportado para outro mundo. Quando o filme acabava, saía pisando em nuvens, leve, relembra Antônio.
A baiana Maria de Lourdes Maia, 59 anos, professora aposentada que também vive em Montes Claros há alguns anos, diz que se lembra bem de uma sessão do cinema itinerante em sua cidade natal, Vitória da Conquista.
- A tenda era muito escura. A única luz vinha da tela gigante que ia do chão ao teto. O filme era sobre uma carreta assassina que passava por cima de tudo a sua frente, sem motorista. Me lembro bem que no momento final do filme a carreta ficou de frente para o público e acelerou. Quando as luzes se acenderam todo mundo estava deitado no chão com as mãos sobre a cabeça. Na época tinha 14 anos e até hoje não esqueci aquela sensação de pavor que tomou conta de mim naquele momento, conta Lúcia.
A médica Aída Carla Soares, 49 anos, diz que passou sua infância em Taiobeiras (MG). Ela conta que quando o cinema chegava à cidade ficava montado próximo a sua casa, mas como era muito criança sua mãe não permitia que fosse assistir aos filmes.
- Ficava sentada quietinha em meu quarto escutando as falas dos atores, as música. Entendia a história só de ouvir. Muitas vezes o filme era erótico e as pessoas gritavam quando aparecia alguém nu. Isso só ficava sabendo no dia seguinte porque as pessoas comentavam. Foi uma fase inesquecível de minha vida que me fez apaixonar por cinema, diz Aída Carla, saudosa.
Ainda no século XIX, quando era Arraial das Formigas, Montes Claros já experimentava a magia do cinema através do Cosmorama, uma engenhoca precursora do projetor de slides que, pelas habilidosas mãos de Antônio Soares Taveira, sem nenhuma tecnologia e ao preço de 500 réis, exibia cenas em movimento, antecipando o que hoje ainda é um dos melhores programas de lazer e entretenimento na cidade. Para curtir a telinha na época, também era indispensável levar a cadeira. Ao longo dos anos a cidade foi contemplada com vários cinemas que fizeram história, hoje reduzidos à salas compactas e ergométricas do shopping center.
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