Oscar de melhor filme estrangeiro, em 1960, A Fonte da Donzela (Jungfrukallan, 1959, Suécia) conta com belíssima fotografia Sven Nykvist para narrar, num jogo de sombras e luz, uma fábula sobre fé, culpa, pecado e redenção. O roteiro parte da balada medieval A Filha de Töre para desvelar a Suécia do século XIV com todas as incongruências religiosas do período – e retomar o imaginário medieval apresentado no sucesso O Sétimo Selo..
O filme conta a história da donzela Karin, que leva os círios pascoais à igreja distante de sua aldeia. Ela é a filha única de Töre, o todo poderoso de Vangé. No caminho, Karin encontra três pastores e, inocentemente, interrompe sua jornada para descansar e comer acompanhada por eles. Eles a violentam e matam, roubam suas finas roupas e fogem. Mas quando a fria noite de inverno chega, eles vão pedir abrigo, por acaso, na casa de Töre.
ESTILO BERGMAN
O ambiente medieval é pano de fundo para a trama que trata de assuntos atemporais: violência, vingança e a necessidade de redenção. Mas a época não é só mera decoração, Bergman trabalha como ninguém a caracterização medieval. Os cenários e o figurino são pouco luxuosos e bem rústicos dando um ar realista ao filme, bem diferente da maioria das produções hollywoodianas do gênero em que tudo parece novo, limpo e perfumado. As interpretações dos atores e as maneiras dos personagens são impressionantes – por exemplo, o modo como eles comem e seus dentes podres, cruelmente desprovidos de qualquer regra de higiene da sociedade moderna.
A adaptação de época é valorizada pelas imagens em preto e branco de Nykvist, parceiro do diretor durante anos. Nitidamente escura, ou alegremente clara, as horas do dia são perfeitamente sentidas através da iluminação, tanto nas cenas ao ar livre quanto nas de cenário. A luz que entra pela janela ou pela porta muitas vezes é suficiente para iluminar toda a cena de maneira quase mística. Quando mostrado em close, cada personagem aparece com uma iluminação que diz muito sobre seu caráter.
PRESENÇA DE DEUS
A produção trata, ainda, de um tema muito presente na vida e na obra de Bergman: a religiosidade e a presença de Deus.
- Ainda hoje respeito a problemática religiosa de O Sétimo Selo, dado que do filme emana uma sincera e exaltada religiosidade. Mas em A Fonte da Donzela a motivação é muito variada, minha concepção de Deus havia começado a enfraquecer há muito. O que me interessou, na verdade, foi a história atroz da moça, dos homens que a violaram, da vingança - conta o cineasta.
No filme, Deus está presente como um ser poderoso e injusto e que pode atender aos pedidos mais impronunciáveis – aqueles que são feitos num momento de raiva e, depois, geram arrependimentos e culpa.
A Mostra Ingmar Bergman: O Mestre do Cinema acontece todos os sábado do mês de julho, às 18h30, na sala Geraldo Freire, ao lado da Câmara Municipal. Após a sessão tem bate-papo com o jornalista Elpídio Rocha. A entrada é de graça.